As Partes

AutorFrancesco Carnelutti
Ocupação do AutorAdvogado e jurista italiano
Páginas79-92

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O juiz é soberano. Está sobre, no alto, na cátedra. Abaixo, diante dele, está aquele que deve ser julgado.

Aquele ou aqueles? Perfila-se, a esse respeito, uma característica que parece distinguir o processo penal do processo civil. Neste, aqueles sobre os quais se deve julgar são sempre dois. O juiz não pode dar razão a um sem que a negue ao outro, e vice-versa. Já no processo penal, o juízo interessa somente ao acusado. Quando, além do acusado, há a chamada parte civil, não se trata de um processo penal puro, e sim de um processo misto, no qual se mesclam o penal e o civil. Contudo, um pouco mais de atenção permitirá compreender que a referida característica não

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diferencia somente o processo penal do processo civil, mas também o processo voluntário do processo contencioso. Pelo mesmo motivo, o processo penal pertence à primeira dessas categorias: por exemplo, mesmo quando o progenitor pede autorização para vender um bem do filho menor ou o marido, um bem dotal, não se trata de dar razão a um e negá-la ao outro. Para esclarecer essa distinção, eu diria que o processo contencioso é essencialmente bilateral, enquanto o processo voluntário é ou, pelo menos, pode ser unilateral. Por isso, o processo contencioso é, em comparação ao voluntário, um processo de partes.

A estrutura do processo contencioso permite entender por que os que devem ser julgados se chamam partes, que é um nome estranho e um pouco misterioso. O que a noção de parte tem em comum com o processo e, em geral, com o direito? A parte é um resultado de uma divisão: o prius da parte é um todo que se divide. A concepção de parte está, portanto, vinculada à de discórdia, que,

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por sua vez, é o pressuposto psicológico do processo. Não haveria nem litígios nem delitos se os homens não se dividissem.

Com essas reflexões, o nome “parte” se mostra expressivo e feliz. Os litigantes são partes porque estão divididos, porque, se vivessem em paz, formariam uma unidade. Todavia também o delito, cujo conceito está intimamente relacionado ao de litígio, resulta de uma divisão. Assim, também o acusado, frente ao juiz, é uma parte. Daí decorre que a diferença entre processo penal e processo civil ou, mais genericamente, entre processo voluntário e processo contencioso resida unicamente no fato de que neste último as partes entram em cena, ao passo que no processo penal ou no processo voluntário uma delas fica nos bastidores.

No processo, então, as partes são sempre duas. Quando se trata de delito, distinguem-se por uma razão substancial: alguém é o que atua, e o outro é o que sofre a ação; alguém é o ofensor, e o outro é o ofendido. De

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modo diverso, em caso de litígio, a distinção se funda na iniciativa: uma das partes pretende, e a outra resiste à pretensão. O critério da distinção é comum: agressor e agredido. Conforme dito acima, no processo penal, o agredido não comparece como parte, isto é, como justificado. Contudo, porquanto quem cometeu um delito deve não só sofrer a pena como também restituir, a quem sofreu, as coisas tomadas e, em todo caso, ressarcir-lhe os danos, consente-se que o juiz penal julgue também acerca disso, ou seja, que, ao declarar a certeza...

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