Os autos que crescem e o patrimônio cultural que padece: a cidade patrimônio e a judicialização / The processes are increasing and the cultural heritage is suffering: the city heritage and the the institutions of the federal justice system

AutorPaulo Fernando Soares Pereira, José Odval Alcântara Júnior, Mônica Teresa Costa Sousa
CargoDocente da Graduação e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (UFMA). Pós-doutorado na Universidade de São Paulo (USP). Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas das Formas Sociais. E-mail: josealcantarajr@uol.com.br - Docente do Programa de Pós-Graduação em Direito e Instituições do Sistema de Justiça (UFMA). Doutora em Direito...
Páginas1277-1309
Revista de Direito da Cidade vol. 08, nº 4. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2016.23346
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Revista de Direito da Cidade, vol. 08, nº 4. ISSN 2317-7721 pp. 1277- 1309 1277
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O trabalho aborda a efetividade da judicialização envolvendo a tutela do patrimônio cultural
imobiliário, na Zona de Tombamento Federal, na cidade de São Luís, detentora do título de
“Patrimônio Cultural da Humanidade”, concedido pela UNESCO, em 1997, em função da
singularidade e harmonia de seu acervo arquitetônico, como já havia reconhecido o Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, em 1974. A problemática, portanto, consiste em
indagar a razão pela qual as Instituições do Sistema de Justiça Federal não conseguem dar
efetividade ao comando constitucional de tut ela do patrimônio cultural.
-: Patrimônio Cultural. Proteção. Sistema de Jus tiça. Sociedade civil. Diálogo.
The essay approaches the effectiveness of judicialisation involving the safeguard of protected real
estate cultural heritage area, in São Luís, honored as Cultural Heritage of Humanity by UNESCO in
1997, due to its unique and harmonic architectural acquis, also recognized by IPHAN (abbreviation
in Portuguese for National Institute for Historical and Artistic Heritage), in 1974. The issue consists
in questioning the reason why the Federal Justice System cannot bring effectiveness to the
constitutional commands for cultural heritag e protection.
: Cultural heritage. Protection. Justice Syste m. Civil society. Dialogue.
1 Docente da Graduação e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (UFMA). Pós-doutorado na
Universidade de São Paulo (USP). Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas das Formas Sociais. E-mail:
josealcantarajr@uol.com.br
2 Docente do Programa de Pós-Graduação em Direito e Instituições do Sistema de Justiça (UFMA). Doutora
em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. Avaliadora do MEC/INEP. Coordenadora do
Núcleo de Estudos em Direito e Desenvolvimento e do Núcleo de Assessoria Jurídica Popular (NAJUP) "Negro
Cosme". E-mail: mtcostasousa@uol.com.br
3 Doutorando em Direito, Constituição e Democracia pela Universidade de Brasília UnB. Membro da
Advocacia-Geral da União (Procurador Federal com exercício no Estado do Mara nhão). E-mail:
paulo.soares@agu.gov.br
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DOI: 10.12957/rdc.2016.23346
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A partir da análise de dados contidos em processos judiciais o trabalho pretende discutir a
efetividade da judicialização envolvendo a tutela do patrimônio cultural imobiliário, na Zona de
Tombamento Federal, na cidade de São Luís, detentora do título de “Patrimônio Cultural da
Humanidade”, concedido pela UNESCO, em 1997, em função da singularidade e harmonia de seu
acervo arquitetônico, como já havia reconhecido o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional - IPHAN, em 1974.
A problemática, portanto, consiste em indagar a razão pela qual as Instituições do Sistema
de Justiça Federal não conseguem dar efetividade ao comando constitucional de tutela do
patrimônio cultural. Para tanto, o trabalho elenca 03 (três) fatores que contribuem para essa falta
de efetividade: a) a questão da pobreza; b) a falta de estímulos à diversidade urbana e; c) a
inexistência de um diálogo com a sociedade civil.
Assim, o trabalho inicia apresentando o contexto da modernização das cidades em países
de capitalismo periférico, como é o caso de São Luís, em que a modernização pode ser entendida
como um esforço de atualização e uma forma de medir a suposta evolução das sociedades centrais
(ARANTES, 2001). Essa busca pela modernização da cidade foi acompanhada de diversos
equívocos, que, atualmente, comprometem a execução das políticas de proteção ao patrimônio
cultural da cidade.
O primeiro equívoco é desconsiderar o fator pobreza. O que leva um Centro Histórico a ser
deixado ao abandono, como se a cidade antiga já não atendesse aos novos anseios de uma cidade
seduzida pelo concreto, pelo vidro e outros pa drões de consumo emergentes?
Prosseguindo com as discussões, apresenta-se um segundo equívoco/obstáculo causado
pela falta de estímulos à diversidade urbana que a cidade vem enfrentando. Sobre essa temática, o
trabalho vai tentar buscar respostas em Jane Jacobs (2000).
Para finalizar, como terceiro equívoco, discorre-se a respeito da inexistência de um diálogo
com a sociedade civil, que é mero receptáculo daquilo que é inventado pela tecnocracia como
sendo o patrimônio a ser preservado, sendo este um dos pontos mais problemáticos das políticas
patrimoniais aplicadas ao Centro Histórico de São Luís.
A metodologia foi dividida em dois eixos: o da pesquisa bibliográfica e o da pesquisa
empírica. A pesquisa bibliográfica, com caráter interdisciplinar se baseou em referências teóricas
da Sociologia e do Direito. Já a pesquisa empírica, documental, por amostragem, foi restrita,
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focando apenas as ações contra particulares que tiveram/têm como objetivo resguardar o
patrimônio cultural imobiliário na Zona de Tombamento Federal ZTF do Centro Histórico de São
Luís (ações em curso na Seção Judiciária do Maranhão).
Em um país dependente e de capitalismo periférico, como é o Brasil, o que é considerado
moderno pode se tornar uma obsessão nacional, já que a modernização pode ser entendida como
um esforço de atualização e uma forma de medir a suposta evolução das sociedades centrais
(ARANTES, 2001).
Assim, a busca pela modernidade, não só no plano industrial, econômico, cultural etc., deu-
se, também, no plano urbanístico, ocorrendo com certo atraso em algumas cidades. Não se pode
desconsiderar que boa parte das ideias que permeiam a questão patrimonial advém do Congresso
Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM - Congress of International Modern Architects), que se
reuniu em 1933, para elaborar um documento que definiria amplamente o objeto da prática
arquitetônica moderna, a Carta de Atenas, que propôs que se conservassem unicamente os
monumentos que oferecessem algum valor testemunhal do passado (HARVEY, 1989; LOURÉS
SEOANE, 2001). Não custa transcrever a Carta naquilo que trata a respeito do que até então se
denominava como “patrimônio histórico” que, hoje, recebe a terminologia mais abrangente
“patrimônio cultural”:
Patrimônio Histórico das Cidades
Os valores arquitetônicos devem ser salvaguardados (edifícios isolados ou
conjuntos urbanos).
A vida de uma cidade é um acontecimento contínuo, que se manifesta ao
longo dos séculos por obras materiais, traçados ou construções que lhe
conferem sua personalidade própria e dos quais emana pouco a pouco a sua
alma. São testemunhos preciosos do passado que serão respeitados, a
princípio por seu valor histórico ou sentimental, depois, porque alguns
trazem uma virtude plástica na qual se incorporou o mais alto grau de
intensidade do gênio humano. Eles fazem parte do patrimônio humano, e
aqueles que o detêm ou são encarregados de sua proteção, têm a
responsabilidade e a obrigação de fazer tudo o que é lícito para transmitir
intacta para os séculos futuros essa nobre herança.
Serão salvaguardados se constituem a expressão de uma cultura anterior e
se correspondem a um interesse geral...
A morte, que não poupa nenhum ser vivo, atinge também as obras dos
homens. É necessário saber reconhecer e discriminar nos testemunhos do
passado aquelas que ainda estão bem vivas. Nem tudo que é passado tem,

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