Bitcoins e outras moedas digitais

AutorMarcelo Guerra Martins/Clift Russo Esperandio/Rogério Dirks Lessa
CargoDoutor em direito do estado pela USP/Professor de direito da faculdade anhanguera/Mestrando em direito
Páginas60-75
60 REVISTA BONIJURIS I ANO 34 I EDIÇÃO 678 I OUT/NOV 2022
DOUTRINA JURÍDICA
Marcelo Guerra MartinsDOUTOR EM DIREITO DO ESTADO PELA USP
Clift Russo EsperandioPROFESSOR DE DIREITO DA FACULDADE ANHANGUERA
Rogério Dirks LessaMESTRANDO EM DIREITO
BITCOINS E OUTRAS
MOEDAS DIGITAIS
A REGULAÇÃO DAS CRIPTOMOEDAS É MUITO COMPLEXA E LEVA
À CONCLUSÃO DE QUE NÃO EXISTE MEIO DE IDENTIFICAR TANTO
A POSSE QUANTO AS OPERAÇÕES DESSE TIPO DE ATIVO
Ahumanidade vivencia a era da socie-
dade da informação, período histórico
marcado por duas grandes circunstân-
cias: a primeira, revelada no aumento
maciço, em termos globais, da circula-
ção de ideias, informações e conhecimento em
velocidades nunca antes imaginadas e a custos
decrescentes. A segunda circunstância é o fato
de bens imateriais, como as marcas e as paten-
tes, terem superado em termos econômicos o
valor do conjunto dos bens materiais produzi-
dos com base nesse tipo de conhecimento.
O presente artigo é fruto de projeto desenvol-
vido no mestrado em direito do Centro Univer-
sitário das Faculdades Metropolitanas Unidas.
Contém como pano de fundo o contexto da so-
ciedade da informação e aborda um fenômeno
relativamente novo, ou seja, as moedas virtuais
desvinculadas do controle governamental, com
destaque para o bitcoin, quiçá a mais relevante
de todas elas em termos econômicos.
1. CONCEITO DE MOEDA: DO SAL,
CONCHAS E FUMO AO HOMEBANKING
Moeda, essencialmente, é um meio de troca, um
instrumento facilitador das transações, não ne-
cessariamente regulado por um governo. Seu
fundamento é a confi ança em sua aceitação
coletiva “como forma geral de existência do va-
lor das mercadorias particulares, dos contratos
de riqueza” (B , 2009, p 212). É fato que a
moeda já adotou variadas formas durante a his-
tória humana. Ao abordar esse assunto, Smith
(1996, p. 82) ensina que:
Na Abissínia, afirma-se que o instrumento comum
para comércio e trocas era o sal; em algumas regi-
ões da costa da Índia, o instrumento era um deter-
minado tipo de conchas; na Terra Nova era o ba-
calhau seco; na Virgínia, o fumo; em algumas das
nossas colônias do oeste da Índia, o açúcar; em al-
guns outros países, peles ou couros preparados; ain-
da hoje – segundo fui informado – existe na Escócia
uma aldeia em que não é raro um trabalhador levar
pregos em vez de dinheiro, quando vai ao padeiro
ou à cervejaria.
A consolidação das monarquias nacionais na
Europa, a partir do fi nal do século 18, fez com
que o Estado chamasse para si o monopólio da
moeda, passando a emiti-la com exclusividade,
regular sua quantidade em circulação na eco-
nomia e, em muitas hipóteses, forçar seu cur-
so dentro do respectivo território ao não reco-
nhecer como válidas transações celebradas em
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REVISTA BONIJURIS I ANO 34 I EDIÇÃO 678 I OUT/NOV 2022
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moeda diversa da nacional. Trata-se do exercí-
cio da política monetária da qual nenhum país
abre mão, visto ser um importante elemento
de regulação da economia. Exemplifi cando, o
art. 1º do Decreto-lei 857, de 11 de setembro de
1969, estipulou que “são nulos de pleno direito
os contratos, títulos e quaisquer documentos,
bem como as obrigações que exequíveis no Bra-
sil, estipulem pagamento em ouro, em moeda
estrangeira, ou, por alguma forma, restrinjam
ou recusem, nos seus efeitos, o curso legal do
cruzeiro”.
Mesmo os Estados Unidos da América, de ín-
dole fortemente liberal e com sérias restrições
à intervenção estatal na economia, não fi caram
imunes a esse tipo de regulamentação. Tanto é
que, em 6 de março de 1933, o presidente Roose-
velt, “invocando como base norma do Trading
with the Enemy Act, de 6 de outubro de 1917, de-
cretou um feriado bancário, proibiu a exportação
de ouro e prata, bem como transações com moe-
da estrangeira” (F F , 2008, p. 149).
Isso não signifi cou, entretanto, que as pes-
soas tenham deixado de utilizar certos objetos
como moeda, em detrimento da moeda ofi cial
(ou governamental). Nesse sentido, é notório,
por exemplo, que cigarros possuam a função de
moeda dentro das cadeias. Um exemplo curioso
é a moeda utilizada em Yap, uma pequena ilha
localizada no Pacífi co Sul. Não obstante tratar-
-se de um território norte-americano, há mais
de dois mil anos os yapenses utilizam discos
de pedra para o pagamento para grandes aqui-
sições (v.g. terras, canoas, licenças de casamen-
to), sendo que o dólar entra em cena apenas
em transações de menor monta, como os gas-
tos do supermercado ou do posto de gasolina
(M , 2007, p. 631). Todavia, ainda que o em-
prego de moedas não governamentais sempre
tenha existido cá e acolá, esse fenômeno nunca
ameaçou o protagonismo das moedas ofi ciais.
Prosseguindo, em que pese as instituições
nanceiras terem iniciado seu processo de in-
formatização na década de 1960, em razão dos
altos custos envolvidos nesse tipo de tecnolo-
gia, as pessoas comuns, inclusive a maioria das
empresas, permaneceram transacionando no
dia a dia mediante utilização de “dinheiro vivo”
(meio circulante) ou com a emissão de cheques.
A popularização do chamado “dinheiro de plás-
tico”, isto é, o emprego de cartões magnéticos
para pagamentos e transferências fi nanceiras,
ainda estava longe e só veio a fortalecer-se a
partir do fi nal dos anos 1990.
Com efeito, os anos 1990 marcaram a conso-
lidação da chamada sociedade da informação,
A popularização do chamado “dinheiro de plástico”, isto é, o emprego
de cartões magnéticos para pagamentos e transferências nanceiras,
só veio a fortalecer-se a partir do nal dos anos 1990
Almanaque
do Consumidor
L. F. Queiroz
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