A capacidade dos animais de ser parte em demandas judiciais - uma análise a partir da perspectiva jurisprudencial de direito comparado e de recentes decisões judiciais brasileiras

AutorMarcel Guimarães Rotoli de Macedo
CargoJuiz de Direito Substituto de 2º Grau no Tribunal de Justiça do Paraná
Páginas103-124
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Revista Judiciária do Paraná – Ano XVII – n. 23 – Maio 2022
A capacidade dos animais de ser parte em
demandas judiciais – uma análise a partir da
perspectiva jurisprudencial de direito comparado e
de recentes decisões judiciais brasileiras
Marcel Guimarães Rotoli de Macedo1
Juiz de Direito Substituto de 2º Grau no Tribunal de Justiça do Paraná
Resumo: Hodiernamente, muito tem se falado, debatido e
dissertado a respeito da capacidade de os animais gurarem
como partes em litígios judiciais, mormente em tempos como
estes em que os animais e, nesse articular, os de estimação,
vêm ocupando lugar de destaque nas famílias, nos lares, nos
abrigos, nos ambientes hospitalares e até mesmo em locais de
trabalho, gurando como seres sencientes dignos, portanto,
de uma atenção voltada para a garantia de seus direitos,
dentre os quais o de acesso ao Judiciário na qualidade de
partes. Diante disso, o presente artigo tem a nalidade de
fomentar o debate em torno do assunto, demonstrando
inclusive casos paradigmáticos de cortes judiciais de diversos
países que estão caminhando para o reconhecimento do
direito de os animais gurarem como partes em demandas
judiciais, inclusive em alguns casos da justiça brasileira
que, ainda um tanto acanhada, vai no mesmo sentido de
reconhecer a importância e a necessidade de se garantir aos
animais o acesso pleno ao Judiciário na qualidade de partes.
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Revista Judiciária do Paraná – Ano XVII – n. 23 – Maio 2022
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Marcel Guimarães Rotoli de Macedo
1. Introdução
A    , compreendida como pressuposto pro-
cessual de existência, por si só não tem sido objeto de grandes debates
entre processualistas e operadores do direito, notadamente em razão de
que as teorias, os fundamentos normativos, a jurisprudência e a pró-
pria doutrina, de um modo geral, têm explicado de modo satisfatório
as dúvidas e indagações eventualmente surgidas em torno do assunto.
Nas palavras do festejado professor da Universidade Federal do
Paraná e juiz federal Vicente de Paula Ataíde Junior, citando o dou-
trinador Fredie Didier Jr., “talvez essa desimportância da categoria seja
resultado da sua parca manifestação empírica, como um ‘falsoproblema’,
existente apenas para resolver os casos de demandas formuladas por ou
em face de pessoa já falecida2.
Contudo, é bom que se diga, essa aparente desimportância perde
sua força em virtude do atual fenômeno denominado “judicialização
terciária do Direito Animal”, ou seja, da existência de animais litigando
em juízo, em nome próprio, seus direitos subjetivos amplamente reco-
nhecidos pelo ordenamento jurídico3.
E essa discussão existente em torno deste assunto é exatamente em
face da possibilidade, ou não, de os animais constarem como partes nas
demandas judiciais. Com outras palavras, pergunta-se: pode um ani-
malvítima de violência ou de maus tratospostular, em nome próprio
(devidamente representado), uma indenização contra o suposto agressor?
Adiante-se que o presente artigo, sem a pretensão de esgotar o as-
sunto, uma vez que complexo e ainda não pacicado, tem por objetivo
responder a pergunta acima enaltecida, e não apenas isso, como tam-
bém fomentar o debate e a discussão doutrinária, legal e jurispruden-
cial em torno da temática.
O Poder Judiciário brasileiro, por sua vez, tem se mostrado um tan-
to resistente em admitir que os animais possam gurar como partes
nas ações judiciais, sob o fundamento de que a legislação processualista
brasileira não contempla(ria) a capacidade dos animais.
No entanto, não se pode deixar de consignar alguns importantes
precedentes do direito comparado como da Argentina, Colômbia e ou-
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