Capítulo 2 - Dever pré-contratual de informação nos contratos de adesão concluídos por meios eletrônicos

Páginas103-146
Capítulo 2
DEVER PRÉ-CONTRATUAL DE
INFORMAÇÃO NOS CONTRATOS
DE ADESÃO CONCLUÍDOS
POR MEIOS ELETRÔNICOS
2.1 NOTAS PRELIMINARES
Hodiernamente as informações publicitárias alcançam os consumidores de
diversas formas, seja pelos sites, provedores de conexão, aplicativos, mídias sociais,
automaticamente ou não, com ofertas tentadoras e em breve espaço de tempo, ge-
rando seguidamente a desconf‌iança1 do consumidor.
Assim sendo, alguns autores2 defendem que são 5 grandes etapas que o for-
necedor deve trilhar para conseguir atingir o consumidor no comércio eletrônico.
A primeira delas é o denominado estágio de conscientização (“customers recog-
nize”), em que o consumidor reconhece a marca e a qualidade do produto através
de publicidades tradicionais, modernas ou até mesmo pela divulgação dos outros
clientes do produto ou serviço.
A segunda etapa é a denominada fase de exploração (“exploration stage”), em
que o potencial cliente se informa mais sobre a empresa e o produto, buscando mais
informações no site, tirando dúvidas pelo call center ou eventualmente indo em lojas
físicas (caso existam) para inteirar-se melhor. Nessa fase, o consumidor busca sites
de reclamação, analisando a reputação da empresa perante os outros adquirentes e
eventuais problemas e soluções para com os consumidores.
A terceira etapa é quando o consumidor, já familiar com o potencial produto ou
serviço, avança e conclui a transação, uma vez que já está habituado com as diretrizes
1. PINHEIRO, Patrícia Peck Garrido. Os perigos da nova rua digital. Direito Digital 3.0 Aplicado. São Paulo:
Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 86 e ss.
2. SCHNEIDER, Gary. Electronic Commerce. Boston: Cengage Learning, 2017, p. 174 e ss. Por sua vez, há
quem entenda que o binômio conf‌iança e satisfação são os requisitos essenciais para negócios bem-suce-
didos no comércio eletrônico de consumo. Cf.: KIM, Dan; FERRIN, Donald; H. RAGHAV, Rao. Trust and
Satisfaction, Two Stepping Stones for Successful E-commerce Relationships. Information Systems Research,
v. 20, n. 2, 2009, p. 237 e ss.
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DIREITO À INFORMAÇÃO: REPERCUSSÕES NO DIREITO DO CONSUMIDOR • João Pedro Leite Barros
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básicas da empresa: forma de pagamento, direito de arrependimento, políticas claras
de entrega e troca do produto.
Por sua vez, a quarta etapa representa o nível de satisfação do cliente e seu
efeito reverberador. Sendo um índice de satisfação elevada, os clientes aumentam
a conf‌iança no comerciante e preferem ou tendem a comprar produtos ou adquirir
serviços somente dele. É a relação de conf‌iança freguês-cliente na modalidade virtual.
A quinta e última etapa, caso o cliente se depare com experiência negativa com
o fornecedor, há uma ruptura imediata por quebra da conf‌iança. Pode ser causada
por diversas razões: seja por um atraso na entrega do produto, pela apresentação
destoante da oferta disponibilizada pelo fornecedor ou pela demora na resposta de
eventuais queixas do consumidor.
Feitas essas breves considerações, é necessário aprofundar nos conceitos ele-
mentares de como a informação atinge o consumidor, mas sobretudo como ela se
apresenta ao consumidor em sede de contratação eletrônica.
2.2 DEFINIÇÕES
2.2.1 Oferta
No Brasil, a oferta regulamentada pelo CDC é realizada pelo fornecedor, de-
tentor do monopólio informativo da relação jurídica, dirigindo-se ao consumidor,
vulnerável por essência.
O Código de Defesa do Consumidor brasileiro é claro ao valorizar o momento
de tratativas preliminares antes mesmo de haver o pacto contratual, dispondo que
“toda informação ou publicidade, suf‌icientemente precisa, veiculada por qualquer
forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou
apresentados, obriga o fornecedor que a f‌izer veicular ou dela se utilizar e integra o
contrato que vier a ser celebrado.” Da mesma forma que no Brasil, a Lei de Defesa
de Consumo portuguesa preceitua na mesma senda, dispondo em seu artigo 7º, n.
5, que “as informações concretas e objetivas contidas nas mensagens publicitárias
de determinado bem, serviço ou direito consideram-se integradas no conteúdo dos
contratos que se venham a celebrar após a sua emissão, tendo-se por não escritas as
cláusulas contratuais em contrário”.
De igual contorno, os legisladores português e brasileiro dispuseram que as
informações concretas contidas nas mensagens publicitárias de determinado bem,
serviço ou direito consideram-se integradas no conteúdo dos contratos que se ve-
nham a celebrar após a sua emissão3.
3. Conf‌ira artigo 7º, n. 5, da Lei 24/96, de 31 de julho, Lei de Defesa do Consumidor.
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CAPíTulO 2 • DEVER DE INFORmAÇÃO NOS CONTRATOS DE ADESÃO POR mEIOS ElETRÔNICOS
Nesse aspecto, todas as informações suf‌icientemente precisas que visam cap-
turar a atenção do consumidor na internet, especialmente aquelas que surgem em
hiperlinks e cookies antes mesmo de acessar o campo do site propriamente dito,
vincula4 o fornecedor a cumpri-las.
Há quem entenda5 que oferta é gênero, e a publicidade é espécie. A primeira,
seria toda manifestação do fornecedor com o objetivo de propor a colocação do pro-
duto ou serviço no mercado; a segunda, por sua vez, seria a mensagem estratégica e
minunciosamente elaborada por técnicos responsáveis pelo marketing da empresa,
cujas f‌inalidades são: a) tornar o produto ou serviço conhecido pelo consumidor;
b) persuadir o consumidor para adquiri-lo
A vinculação do fornecedor é plena e irrestrita em todas as etapas do contrato.
A oferta ou proposta é a declaração inicial de vontade direcionada à realização
de um contrato, sendo, portanto, o seu elemento inicial.6 Ou seja, qualquer infor-
mação ou publicidade transmitida, com os elementos mínimos de precisão (objeto,
preço e características elementares do que será pactuado) é tida como vinculante,
remanescendo apenas a aceitação do consumidor. Trata-se, na verdade, da integração
publicitária contratual7, uma vez que há incorporação imperativa das mensagens
publicitárias ao próprio contrato.
Afora isso, cumpre ressaltar que as ofertas dos produtos e serviços muitas vezes
são consubstanciadas através de e-mails, hiperlinks, não havendo mais os limites
tradicionais preestabelecidos pelo direito civil tradicional. Referidas circunstâncias
não descaracterizam o caráter vinculativo, muito pelo contrário, reforçam a necessá-
ria proteção ao consumidor nas situações de ausência de contato com o fornecedor.
Outrossim, a linguagem textual é constantemente trocada por sons, f‌iguras e
ilustrações que podem conduzir a uma declaração viciada de vontade, ou até mesmo
a uma compra sem ref‌lexão do consumidor. Aliás, a oferta é um negócio jurídico
unilateral8 e deve ser suf‌icientemente precisa e clara ao consumidor, preservando a
sua livre vontade e escolha.
4. Conf‌ira também o artigo 429 do Código Civil.
5. Sobre o tema, conf‌ira: FILOMENO, José Geraldo Brito, Direitos do Consumidor, São Paulo: Atlas, 2018, p.
215 e ss.
6. MARQUES, Claudia Lima; BENJAMIN, Antonio Herman V.; MIRAGEM, Bruno. Comentários ao Código de
Defesa do Consumidor. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019, p. 920 e ss.
7. A doutrina portuguesa também compreende que muitas vezes é difícil destrinchar o conteúdo informa-
tivo (objetivo) e informacional (persuasivo) das mensagens transmitidas, impondo consequentemente a
responsabilização dos empresários pelas informações divulgadas. Cf.: ANTUNES, José Engrácia. Direito
do Consumo. Coimbra: Almedina, 2019, p. 115 e ss.
8. No direito argentino, a oferta também é considerada proposição unilateral, consoante artigo 7º, da lei ar-
gentina 24.240. Sobre o tema, conf‌ira: WAJNTRAUB, Javier. Protección jurídica del consumidor: ley 24.240
comentada y anotada. Buenos Aires: Depalma, 2004, p. 69 e ss.
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