O casamento

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O CASAMENTO
O casamento sempre teve, especialmente no Brasil, intrínseca ligação com
a religião. Compreendido pelo cristianismo como um sacramento,1 o casamento
signicava instrumento de gloricação, puricação e controle da sexualidade
humana, já que, de alguma forma, dominava o desejo legitimando somente as
relações sexuais mantidas sob o seu manto.2
De fato, estar casado dignicava religiosamente aquele que assumia essa
condição, já que o próprio Direito Canônico era responsável pelas denições e
consequências do casamento. No Brasil, que teve separação da Igreja e do Estado
somente na Constituição de 1891, o casamento foi regulamentado pela religião
ao longo de séculos, constituindo a única família possível e juridicamente reco-
nhecida até então: a matrimonializada e patriarcal.
Importante, então, que se pondere que a rigidez das condutas religiosas foi
fator signicativo na compreensão da conjugalidade (aqui interpretada também
com seus elementos subjetivos). Assim, não só a vida conjugal, como praticamente
toda a existência das famílias, foram moldadas sobre os limites quase intranspo-
níveis e sacramentados da religiosidade.
Somente com a constituição de 1988 e seu importante avanço para o reco-
nhecimento da pluralidade social e do Estado laico, é que o ordenamento deixa
de lado a proteção da família instituição para tutelar os entes que a integram, de
modo que a dignidade passa a ser a pedra de toque do ordenamento.3
1. “Os Sacramento da Santa Madre Igreja, como a Fé Catholica’ nos ensina, são sete, convém a saber:
Baptismo, Conrmaçào, Eucharistia, Penitencia, Extremaunção, Ordem, e Matromonio. Todos, sem
dúvida causão graça nos que os recebem dignamente, e não poem impedimento a ella; a qual graça
por excellencia se chama cousa sagrada, e dom sagrado, pois nos santica com Deos.” (Constituições
primeiras do Arcebispado da Bahia feitas, e ordenadas pelo Illustrissimo, e Reverendissimo Senhor D.
Sebastião Monteiro da Vide: propostas, e aceitas em o Synodo Diocesano, que o dito Senhor celebrou
em 12 de junho do anno de 1707. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/222291.
Acesso em: 19 mar. 2022.
2. BEVILÁQUA, Clóvis. Direito de família. Rio de Janeiro: Rio, 1976. p. 34.
3. “Com o advento da Constituição de 1988 e a mudança de um paradigma centrado na proteção do
patrimônio, essencialmente, para outro em que se privilegia a tutela da pessoa humana, sua existência,
dignidade e o pleno desenvolvimento de sua personalidade, operou-se vultosa reforma em nosso
ordenamento jurídico, através da inserção de uma base axiológica humanista e destacadamente soli-
dária, pela qual as ações humanas devem pautar-se por um ideal de honradez, eticidade e probidade,

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