Compliance: entre teoria e prática. regulação e autorregulação no mercado de capitais

AutorCaroline da Rosa Pinheiro e Adrienny Rúbia de Oliveira Soares
Páginas229-250
COMPLIANCE: ENTRE TEORIA E PRÁTICA.
REGULAÇÃO E AUTORREGULAÇÃO NO
MERCADO DE CAPITAIS
Caroline da Rosa Pinheiro
Doutora pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. Professora de Direito
Empresarial da Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF. Coordenadora do Grupo
de Pesquisa ‘Empresa, Desenvolvimento e Responsabilidade’ – EDResp.
Adrienny Rúbia de Oliveira Soares
Graduanda em Direito pela da Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF. Pesquisadora
no Grupo de Pesquisa ‘Empresa, Desenvolvimento e Responsabilidade’ – EDResp.
Sumário: 1. Introdução – 2. Controle de mercado; 2.1 Regulação e CVM; 2.2 Autorregulação; 2.3
Interseções entre a regulação e a autorregulação: os papéis da CVM e da B3 – 3. Novo mercado e
compliance – 4. Programas de integridade: instrumentos vinculantes? – 5. Considerações conclu-
sivas – 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Segundo Coleman, “poucos setores da economia capitalista possuem uma tão
extensa capacidade autorregulatória como os mercados de capitais”1. A contempo-
raneidade tem sido marcada por uma crescente complexidade e incerteza advindas
do desenvolvimento tecnológico que possibilitou, consequentemente, o desenvolvi-
mento dos mercados transnacionais, com destaque para o mercado de capitais, onde
risco e retorno estabelecem relação diretamente proporcional2.
Diante da impossibilidade de se conferir certeza a esse cenário, o papel do Direito
se destaca para proteção à confiança nas relações e operações estabelecidas no mercado
de capitais – requisito indispensável à sua existência e seu adequado funcionamento.
Isso significa dizer que a confiança sobre o mercado, bem como a segurança sobre
suas operações ocorre em virtude do funcionamento de seus mecanismos de coor-
denação, bem como no desempenho segundo normas e meios de fiscalização dos
1. COLEMAN, W. D. Keeping the Shotgun Behind the Door: Governing the Securities Industry in Canada, the
United Kingdom, and the United States apud MOREIRA, Vital. Auto-Regulação Profissional e Administração
Pública. Coimbra: Livraria Almedina, 1997, p. 86.
2. TEIXEIRA FERRAZ, 2012.
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entes competentes.3 No ponto, destaca-se a relevância que a confiança possui para
atrair investidores para países em desenvolvimento em economias globalizadas.4
Nesse contexto, a coordenação de mercado refere-se ao poder de fiscalização do
Estado em relação às atividades econômicas, pois, por expressa imposição do artigo
173 do texto constitucional, a exploração direta pelo Estado só é admitida quando
necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo.
Sendo, portanto, assegurada a livre iniciativa privada, o Estado reserva para si a
função de exercer o controle do mercado.
Nesse sentido, este estudo tem o objetivo de oferecer um panorama não exaustivo
sobre as formas de controle do mercado – regulação, autorregulação e compliance, em
específico – e sobre a relação entre seus respectivos entes competentes no mercado
de capitais brasileiro, de modo a subsidiar a compreensão da análise dos parâmetros
objetivos determinados pelo – direito ambiental, direito do consumerista, direito
concorrencial, direito sancionador, direito trabalhista, dentre outros – abordados na
segunda parte desta obra para avaliação dos programas de integridade das companhias
listadas no segmento do Novo Mercado.
Debruça-se sobre a hipótese de que a exigência de programas de integridade
como requisito ao ingresso no segmento do Novo Mercado5 demonstra o caráter
vinculativo dos documentos e o emprego deles como meios de fiscalização e con-
trole exercido pela B3, ente autorregulador, sobre o mercado de capitais e o referido
3. De fato, para Teubner e Gáscon, a relevância do Direito está intrinsecamente relacionada aos processos sociais
e econômicos, como se extrai do trecho: [...] For me law has only a supportive role to play and the important
things are social and economic learning processes within the corporation that may be supported by legal rules.
TEUBNER, Gunther; GASCÓN, Ricardo Valenzuela. Constitutional sociology and corporations. [s.l.],
1997. No mesmo sentido, aponta Aragão: Assim, para este pensador, não é o Direito mas o mercado que cria os
seus próprios meios de comunicação, que são protegidos e aplicados pelo Estado. O Direito, na sua opinião, não
lhes dá o conteúdo, mas apenas as formas. ARAGÃO, Alexandre Santos. O conceito jurídico de regulação da
economia. In: JURUÁ (Org.). Revista de Direito Administrativo & Constitucional. 6. ed. Curitiba: [s. n.],
p. 59-74, 2001.
4. Para compreensão mais aprofundada sobre o efeito das mudanças legislativas na proteção de credores e
acionistas na atração de investimento em economias em transição: PISTOR, K. et al. Law and Finance in
Transition Economies. Economics of Transition. [s.l.], v. 8, p. 324-368.
5. Art. 31 A companhia deve elaborar e divulgar código de conduta aprovado pelo conselho de administração e
aplicável a todos os empregados e administradores que contemple, no mínimo: I – os princípios e os valores da
companhia; II – as regras objetivas relacionadas à necessidade de compliance e conhecimento sobre a legislação
e a regulamentação em vigor, em especial, às normas de proteção à informação sigilosa da companhia, combate à
corrupção, além das políticas da companhia; III – os deveres em relação à sociedade civil, como responsabilidade
socioambiental, respeito aos direitos humanos, e às relações de trabalho; IV – o canal que possibilite o recebimento
de denúncias internas e externas, relativas ao descumprimento do código, de políticas, legislação e regulamentação
aplicáveis à companhia; V– a identificação do órgão ou da área responsável pela apuração de denúncias, bem
como a garantia de que a elas será conferido anonimato; VI – os mecanismos de proteção que impeçam retaliação
à pessoa que relate ocorrência potencialmente violadora do disposto no código, em políticas, legislação e regula-
mentação aplicáveis à companhia; VII – as sanções aplicáveis; VIII – a previsão de treinamentos periódicos aos
empregados sobre a necessidade de cumprimento do disposto no código; IX – e as instâncias internas responsáveis
pela aplicação do código. B3 S.A. – BRASIL, BOLSA, BALCÃO. Regulamento do Novo Mercado. Disponível
em: <http://www.b3.com.br/data/files/3A/60/99/CC/038CF610761CABF6AC094EA8/Regulamento%20
do%20Novo%20Mercado%20-%2003.10.2017%20(Sancoes%20pecuniarias%202020).pdf>.Acesso em:
14 jan. 2021.
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