Enforcement e compliance: desafios dos programas de integridade na aplicação de sanções. um panorama do novo mercado

AutorCarolina Guimarães Ayupe e Hugo Vidigal Ferreira Neto
Páginas369-390
ENFORCEMENT E COMPLIANCE:
DESAFIOS DOS PROGRAMAS DE INTEGRIDADE
NA APLICAÇÃO DE SANÇÕES.
UM PANORAMA DO NOVO MERCADO
Carolina Guimarães Ayupe
Mestranda em Direito e Inovação na Universidade Federal de Juiz de Fora. Graduada
em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Graduada em Relações Interna-
cionais, modalidade EAD, pela Uninter.
Hugo Vidigal Ferreira Neto
Mestrando em Direito e Inovação na Universidade Federal de Juiz de Fora. Graduado
em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora.
Sumário: 1. Introdução: breve contextualização quanto ao surgimento do compliance – 2. Com-
pliance e sanção: a necessidade de enforcement dos programas de integridade; 2.1 A natureza
jurídica do compliance; 2.2 A importância da sanção como mecanismo de enforcement dos pro-
gramas de integridade – Impactos na associação diferencial – 3. O controle pela B3 do mercado de
capitais – recomendação ou obrigação?; 3.1 O que esperar no Novo Mercado – 4. O enforcement
dos programas das companhias listadas no Novo Mercado (realidade); 4.1 Metodologia e análise
empregadas; 4.2 Critério investigativo-sancionatório e análise de dados do Novo Mercado – 5.
Considerações nais – 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO: BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO QUANTO AO
SURGIMENTO DO COMPLIANCE
Nos Estados Unidos da América, no início do século XX, surgiu a ideia de com-
pliance, ou programa de integridade. A partir desse instrumento, o Estado buscou
fiscalizar e regular o mercado, atribuindo aos empresários o encargo de dirigirem
suas atividades, desde que observassem normas legais e éticas preestabelecidas pelo
regulador1.
Os programas de integridade, assim, surgiram como um instrumento de política
autorregulatória, servindo como Códigos de Ética que norteiam as atividades e con-
dutas empresariais, buscando “assegurar o respeito à legalidade dentro da empresa
e, muito especialmente, prevenir e descobrir condutas ilícitas que possam praticar
seus administradores e empregados”2.
1. TOMAZ, 2018.
2. NIETO MARTÍN, 2018, p. 62.
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Tais mecanismos representam o conjunto de controles internos de uma corpo-
ração, voltados ao dever de cumprimento normativo e enforcement dessas normas
(ou seja, a capacidade de fazer cumpri-las, por meio de procedimentos investigativos
de apuração de desvios e aplicação de penalidades), visando ao gerenciamento de
riscos e à prevenção de ilícitos, que possam prejudicar a imagem de uma instituição3.
Essa ideia se amolda ao desenvolvimento ocorrido, sobremaneira a partir das
décadas de 80 e 90, quando se percebeu que a postura tradicional do Estado como
executor de todas as políticas econômico-jurídicas era insuficiente, ou que o Estado
não podia mais combater a criminalidade econômica com uso de força bruta, cortes
e prisões4.
O Estado, diante de uma política global, assume um papel de ente regulador geral
e promove o estímulo a produções regulatórias específicas, advindas das próprias
corporações e agentes econômicos. A isso se denomina o “capitalismo regulatório”,
termo que melhor expressa o papel do Ente Político que, ao invés de somente editar
leis, edita diretrizes gerais que permitem adaptação às próprias normas de regência
apresentadas pelas Sociedades Empresariais.
Nessa mesma linha é que o Constituinte Brasileiro, expressa, por meio do ar-
tigo 174, caput, da Constituição Federal: “Como agente normativo e regulador da
atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização,
incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo
para o setor privado”.
Percebe-se, então, que na linha do capitalismo regulatório, o planejamento
econômico estatal é indicativo para o setor privado. Nada obstante, o artigo 173 da
Constituição Federal prevê que a atuação direta do Estado na economia deve ser
subsidiária, mas deve ele regular a atuação dos agentes econômicos e reprimir abusos
cometidos por esses últimos5.
Assim, o compliance permite uma regulação interna eficiente e que, se por um
lado dá margem a uma discricionariedade societária, por outro, adequa-se à pretensão
de intervenções pontuais na autonomia das corporações6. O termo compliance, emi-
nentemente aberto, cumpre bem seu papel, pois permitem englobar diversas formas
de produção normativa interna corporis que privilegiem o cumprimento normativo.
3. RIBEIRO e DINIZ, 2015.
4. VERÍSSIMO, 2017.
5. Como exemplo, percebe-se os §§ 4º e 5º do referido artigo 173 da Constituição Federal que, respectiva-
mente, estabelecem: “A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à
eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros”; e “A lei, sem prejuízo da responsabilidade
individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às puni-
ções compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a
economia popular”.
6. Intervenções pontuais que visam à manutenção de um ambiente de livre mercado competitivo e íntegro,
na mesma medida em que se busca evitar abusos do próprio poder regulatório, por intermédio da metarre-
gulação (reflexão sobre a própria regulação e sua legitimidade).
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