Conflito de interesses, novo mercado e eficiência autorregulatória: o compromisso firmado pelas companhias listadas na b3

AutorBárbara Simões Narciso
Páginas251-273
CONFLITO DE INTERESSES, NOVO MERCADO E
EFICIÊNCIA AUTORREGULATÓRIA:
O COMPROMISSO FIRMADO PELAS
COMPANHIAS LISTADAS NA B3
Bárbara Simões Narciso
Graduanda do 10º período da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Membro
do Grupo de Pesquisa “Empresa, Desenvolvimento e Responsabilidade” e Bolsista de
Iniciação Cientíca (PIBIC – UFJF) no projeto “A qualidade dos programas de integridade
de compliance das empresas listadas no Novo Mercado brasileiro”.
Sumário: 1. Introdução – 2. O conito de interesses e a sua existência nas sociedades empresárias:
conceito, extensão, consequências; 2.1 Função social e interesse social da empresa: compliance
como instrumento para mitigação de conito de interesse; 2.2 Conito de interesses: visões mi-
nimalista e maximalista – 3. Papel da b3 no mercado de capitais: enforcement e função pública;
3.1 Regulamentação do conito de interesses e ecácia do sistema de autorregulação da B3 – 4.
Escopo metodológico da pesquisa; 4.1 A análise em si: o compromisso rmado pelas companhias
do Novo Mercado em relação à mitigação do conito de interesses – 5. Conclusão – 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Cerne da disciplina societária, o Conflito de Interesses pode ser definido pela
existência de um duplo interesse na decisão a ser tomada. Ou seja, ocorre sempre
que o acionista, administrador, empregado e colaborador encontra-se em posição
dupla frente à sociedade, possuindo, ao mesmo tempo, o dever legal de se posicionar
a favor dos interesses da sociedade e o seu interesse privado. Dessa forma, torna-se
inevitável o atendimento de um em detrimento de outro1.
Assim, o conflito é estabelecido à medida que o integrante da empresa não tem
apenas o seu interesse enquanto funcionário, gestor, acionista, mas também enquanto
particular, podendo ter influência perante uma decisão a ser tomada na sociedade
ou nas relações contratuais. E mais, toda a preocupação em relação ao problema do
conflito se relaciona com sua extensão, porque toda sociedade composta por pesso-
as físicas, com seus respectivos interesses individuais é suscetível de experimentar
situações de conflito.
A importância de estudar o tema deriva, portanto, da possibilidade de este
duplo interesse refletir na coesão social e estabilidade do mercado, pré-requisitos
essenciais para uma economia de sucesso. Além disso, o tema é tratado em diversas
1. AZEVEDO, FRANÇA, 2003, p. 658-660.
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leis2, embora ainda seja possível afirmar que apresenta controvérsia persistente no
âmbito do direito societário – principalmente se aliado à persecução do interesse
social da empresa3.
Por isso, objetivo do presente trabalho é examinar a qualidade dos programas de
integridade4 das companhias listadas no segmento de Novo Mercado (NM) especial-
mente no que se refere ao parâmetro em tela, tendo por norte que as companhias listadas
neste setor são consideradas as que possuem o mais alto grau de governança corporativa
do mercado de capitais5. O estudo também compreende breve análise do papel da B3
(Brasil, Bolsa, Balcão) e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), considerando
sua importância para o adequado funcionamento do mercado de capitais brasileiro.
Justificando a importância do tema e dispondo sobre institutos que impactam
nos interesses societários, a função social, princípio orientador da atuação empresarial
é, em sua base, a preocupação de que os direitos subjetivos possam – e devam – ser
instrumentos de construção de uma sociedade mais justa, se apresentando como ex-
pressão última do compromisso da atividade empresarial com a dignidade da pessoa
humana, “inclusive para o fim de ressaltar os deveres que resultam para a empresa”6.
Por outro lado, o interesse social – “não redutível aos interesses dos sócios atuais”7
engloba tanto a atividade, cujo fim é a maximização dos lucros, quanto os interesses
em torno da sociedade, com o fim de realizar o objeto social e cumprir sua função
social. Assim, embora não sejam sinônimos, estão em constante interpenetração. O
primeiro amplia e modifica o segundo já que, aliado ao direito subjetivo, estarão os
deveres positivos e as obrigações de fazer decorrentes da interdependência social8.
A relação desse interesse social, previamente estabelecido e ampliado pela função
social, e os mecanismos de compliance, está no fato de que estes últimos atuam no
interior da sociedade para materializar o melhor interesse da companhia, constituindo
ferramentas de efetiva modificação no modo de agir da sociedade9. Isso ocorre na
2. Leis 6.404/76 – Lei das Sociedades por Ações –, que revogou por completo o Decreto-Lei 2.627/40; na Lei
10.303/01, que revogou parte da Leis das S.A; no decreto 8.420/15, que regulamentou a Lei 13.846/13 - Lei
Anticorrupção; na lei 12.813/13, que regulamentou o conflito de interesse na Administração Pública; e na
Lei Antitruste - 12.529/11, do CADE, que estruturou o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência.
3. A noção de interesse social adotada no presente trabalho se coaduna à de Modesto Carvalhosa (2014, p.
510) em sua obra Comentários à lei de sociedades anônimas, o qual define o interesse social da empresa como
“transcendência dos interesses individuais de cada acionista por um interesse comum a todos, definido no
objetivo empresarial da companhia e nos fins sociais.”
4. Programas de integridade são entendidos como “conjunto de procedimentos adotados por uma determinada
sociedade, objetivando otimizar o cumprimento de normas legais, regulamentos e políticas estabelecidas
pela organização, com o intuito de mitigar riscos e responsabilidades” (PINHEIRO, 2017, p .19).
5. Informação disponível em: <http://www.b3.com.br/pt_br/produtos-e-servicos/solucoes-para-emissores/
segmentos-de-listagem/novo-mercado/> Acesso em: 10 ago. 2020.
6. FRAZÃO, 2009, p. 23.
7. SALOMÃO FILHO, 2002, p. 37.
8. FRAZÃO, 2009, p. 11.
9. Os programas se afastariam dos chamados programas de conformidade, percepção que pode ser verificada
em trabalhos já realizados, como o de CUEVA, Ricardo Villas Bôas; FRAZÃO, Ana. Compliance: perspectivas
e desafios dos programas de conformidade. Belo Horizonte: Fórum, 2018.
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