Condições da ação de segurança
Autor | Manoel Antonio Teixeira Filho |
Ocupação do Autor | Advogado - Juiz aposentado do TRT da 9.ª Região |
Páginas | 7-40 |
Cadernos de Processo do Trabalho n. 37
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CAPÍTULO VI
Condições da ação de segurança
1. Comentário
CelsoAgrícolaBarbiconsideracondiçõesdaaçãodesegurançaaa liqui-
dez e a certeza do direito; b) a legitimidade ad causam; e c) o interesse de agir.(1)
Com o respeito que nos merece esse insigne jurista, devemos dizer que
discordamosempartedaclassicaçãoporeleapresentadaAscondiçõesindis-
pensáveis ao regular exercício da ação de segurança — como as de qualquer ou-
tra ação — compreendem, sob o ponto de vista da legislação vigente em nosso
meioaalegitimidadead causam; b) o interesse processual (CPC, arts. 17 e 485,
VI). Ainda que se possa argumentar, doutrinariamente, que a possibilidade jurídica
do pedido já não integra o elenco dessas condições, em virtude de Liebman haver
reformulado o seu pensamento, no particular, isso não autoriza a incluir-se aí a
liquidez e a certeza do pedido.
A existência de direito líquido e certo constitui pressuposto e não condição
para o exercício da ação assecuratória. Segue-se que as condições exigidas para
o exercitamento da ação em estudo são as previstas no art. 485, VI, do CPC.
Nunca é despiciendo recordar que coube ao notável Enrico Tullio Liebman
elaborar a prestigiosa doutrina das condições da ação; a estada desse jurista pe-
ninsular em nosso país, nos anos de 1940 a 1946, inspirou, a propósito, o surgi-
mento do que Niceto Alcalá-Zamora viria a denominar, mais tarde, de “Escola
Processual de São Paulo” — ou “do Brasil”, como indagaram, com razão, Cintra,
Grinover e Dinamarco.(2)
Discípulo de Chiovenda, Liebman conhecia, profundamente, as doutrinas
italiana e alemã sobre processo, pois, além de grande estudioso do assunto, era
Professor titular de direito processual civil na Universida de de Parma. A extraor-
dinária cultura jurídica e a personalidade afável do jovem mestre italiano logo
motivaram a que pensadores brasileiros dele se acercassem, ávidos de entrar
Obracitp
Teoria geral do processo. 8. ed. SãoPauloRevistadosTribunaisp
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Manoel Antonio Teixeira Filho
em contacto com as novasideias orescentes na Europa Surgiram então as
reuniões periódicas na casa de Liebman, em São Paulo. Como relata Cândido R.
Dinamarco, “Sob sua orientação segura, os discípulos ganharam asas e alcança-
ramvôosalcandoradosnocéudaculturaprocessualística(3)
Alfredo Buzaid, um dos discípulos de Liebman, prestou justa homenagem
ao mestre ao incorporar ao texto do anteprojeto do atual estatuto processual civil
a doutrina das condições da ação. Devemos, todavia, denunciar algumas con-
tradições intransponíveis, no corpo do CPC vigente, entre a teoria liebmaniana
“e o uso da linguagem tradicional, que só se adapta bem à tese chiovendiana
da ação”.(4) Com o intuito, aliás, de eliminar esse antagonismo, Egas Moniz de
Aragão redigiu bem fundamentada emenda ao projeto do Código, para har-
monizá-lo nesse ponto; tal emenda, apresentada ao Senado pelo Relator Geral,
SenadorAcioliNetosobnacabousendorejeitadasemqualquerjustica-
tiva.(5)Examinemos, a seguir, as condições da ação de segurança.
2. Legitimidade para a causa
A legitimidade para a causa (ad causam) não se confunde com a legitimi-
dade para o processo (ad processum); a primeira concerne ao direito de ação; a
segunda, à relação processual. Um menor de 18 anos, p. ex., embora tenha legi-
timidadeparadeterminadacausanãoatemparagurarnarelaçãojurídicaque
se estabelece no processo.
A legitimidade ad causam tanto pode ser ativa (autor) quanto passiva (réu)
e a sua falta conduz ao decreto judicial de carência da ação (CPC, art. 485, VI).
A legitimatio passiva signicaquesomente pode integrar arelaçãoprocessual
a pessoa que seja titular da obrigação relativa ao direito invocado pela parte
adversa. Essa “pertinência subjetiva da ação”, a que alude a doutrina, traduz-
-se na individualização daquele a quem pertence o interesse de agir e daquele
diante do qual é formulada a pretensão. Daí vem que, por princípio, somente os
titulares dos interesses em antagonismo se encontram legalmente legitimados
para atuar em juízo. Liebman já chamava a atenção para o fato de que a legiti-
midade corresponde a um “problema de dupla face”, pois envolve a pertinência
ao autor, no interesse de invocar a tutela jurisdicional, e a pertinência ao réu,
no tocante a opor-se, juridicamente, à realização da pretensão in iudicio deducta.
Fundamentos do processo civil moderno. SãoPauloRevistadosTribunaisp
BARBICelsoAgrícolaComentários ao Código de Processo CivilvolIRiodeJaneiroForense
1981, p. 32.
Diário do Congresso Nacional, ed. de 24.11.1972, p. 4.760.
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As considerações que acabamos de expender são apropriadas à legiti-
midade ad causam ordinária naextraordináriaou anômala quecongura a
substituição processual, a lei atribui legitimidade para agir em juízo a quem
não é titular do direito material que dá conteúdo à pretensão (CPC, art. 18);
impetra-se, em nome próprio, a tutela jurisdicional para a defesa de direitos ou
interesses alheios.
2.1. Legitimidade ativa
Em princípio, possui legitimidade para ajuizar ação de segurança (ou
para impetrar o mandado correspondente, como se preferir) o titular do di-
reito líquido e certo, lesado ou ameaçado de lesão por ato ilegal ou abusivo de
poder praticado por autoridade pública. Sob esse aspecto, podemos dizer que
a legitimidade em sede de ação de segurança não difere da que é exigida para
o exercício das ações em geral.
A legitimidade para impetrar mandado de segurança é de “qualquer pes-
soa física ou jurídica” que venha a sofrer lesão de direito líquido e certo ou se
encontre na iminência de sofrê-la. Ao aludir a “qualquer pessoa”, o caput do
art. 1.º da Lei n. 12.016/2009 não deixou margem para a subsistência da dúvida
surgida na vigência da revogada Lei n. 1.533/1951, que fazia menção a “alguém”
– pronomeindenido.
EstabeleceentretantooartdaLei nque Otitularde di-
reito líquido e certo decorrente de direito, em condições idênticas, de terceiro
poderá impetrar mandado de segurança a favor do direito originário, se o seu
titularnãoo zernoprazode trintadiasquandonoticadojudicialmen-
te”. A Lei n. 1.553/1951, em seu art. 3.º, aludia a “prazo razoável”, deixando, com
issomargemamuitascontrovérsias quantoàdeniçãodessarazoabilidade O
textoatualmaisobjetivoxaoprazodetrintadiasExemplicandotrêscandi-
datos são aprovados em concurso para o provimento de cargos de Juiz do Tra-
balho Substituto, havendo, porém, uma única vaga a ser preenchida, segundo a
rigorosaordemdeclassicaçãoApesardissooPresidentedoTribunalnomeia
o terceiro candidato aprovado, sem que o primeiro e o segundo houvessem re-
nunciadoaodireito deprecedênciaOprimeirocandidato contudonãosein-
surge quanto à nomeação irregular, fazendo com que o segundo, diante disso, se
veja obrigado a impetrar mandado de segurança (a favor do direito originário)
contra o ato de nomeação do terceiro, sob pena de ser prejudicado em seu di-
reitoParaissodeveráosegundocandidatopromovera noticaçãojudicialdo
primeiroamdequeesteexerçaodireitodeimpetraro writ.
Oartº, caput, da Lei n. 12.016/2009 revela, pois, um caso de legitimação
anômalaouextraordináriaa queadoutrinapredominante rotuladesubstitui-
ção processual.
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