Conflitos de interesses no âmbito das associações

AutorPablo Malheiros da Cunha Frota
Ocupação do AutorDoutor em Direito na Universidade Federal do Paraná; Professor do Centro Universitário de Brasília ? UNICEUB. Advogado em Brasília-DF
Páginas413-451
Conflitos de interesses no âmbito
das associações
Pablo Malheiros da Cunha Frota*
1. Aspectos metodológicos da temática
Receber o honroso convite da Professora Doutora Ana Frazão,
destacada docente de Direito empresarial,1 é motivo de aprazi-
mento e, de enorme incumbência para este subscritor, pois este
trabalho será publicado em rara obra sobre Associações, tema pou-
co tratado no Direito brasileiro, a demonstrar um necessário diálo-
go do Direito Civil com o Direito Empresarial.
Nessa linha, o presente artigo se ocupará de tratar do conflito
de interesses e de temas afins na ambiência das sociedades simples
(Código Civil – CC ou CC/02, art. 1.010, § 3º ), anônimas (Lei
6.404/76 – Lei das Sociedades Anônimas (LSA), art. 115),2 e das
* Doutor em Direito na Universidade Federal do Paraná; Professor do Centro Uni-
versitário de Brasília — UNICEUB. Advogado em Brasília-DF.
1 Por exemplo: FRAZÃO, Ana. Função social da empresa. Repercussões sobre a
responsabilidade civil de controladores e administradores de S/As. Rio de Janeiro:
Renovar, 2011.
2 O conflito de interesses está regulado nos arts. 252 e 551 do Projeto de Código
Comercial que se encontra no Senado: “Art. 252. O administrador da sociedade deve
ter, no exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e pro-
bo costuma empregar na administração de seus próprios negócios. § 1º. O administra-
dor deve procurar neutralizar potenciais conflitos de interesses entre os sócios, em es-
pecial entre os do controlador e os da sociedade, respeitar os direitos dos sócios não
controladores e conferir transparência aos negócios sociais, preservado o sigilo, quan-
do necessário. § 2º . O administrador não pode realizar por meio da sociedade atos de
seu interesse pessoal, salvo quando autorizado pelo sócio controlador. § 3º. Na hipóte-
se do parágrafo anterior, o administrador e o sócio controlador respondem solidaria-
mente, perante a sociedade ou o sócio não controlador, se houver danos”. “Art. 551.
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associações no Direito Civil,3 não tendo sido encontrado julgado
sobre o assunto na perspectiva associativa. Essa temática vai ser tra-
tada com base, principalmente, com base nas obras de Erasmo Val-
ladão, por serem sobre o assunto quando se trabalha as sociedades
anônimas no Brasil.4
Diante da ausência de julgado em relação às associações, busca-
ram-se, de forma aleatória, documentos de associações que delibe-
raram sobre o tema, cujo conteúdo será abordado no item 3 deste
artigo. Nesse passo, o problema a ser resolvido é saber acerca da
possibilidade (ou não) de aplicar as construções teórico-práticas do
direito societário à discussão do conflito de interesse para o viés as-
sociativo.
Para cumprir este mister, o artigo foi dividido, além deste tópi-
co metodológico e das referências, em duas partes: a primeira, de-
dicada às nuances relacionadas ao conflito de interesses, benefício
particular e ao voto abusivo na ambiência das sociedades anônimas
e os conflitos de interesse no caso das sociedades simples; a segun-
da se relaciona à importância do contexto associativo no Direito
Civil brasileiro, as distinções, para o escopo deste artigo, entre as-
sociação e sociedade, como também a indicação dos limites e das
possibilidades de interpretação extensiva de sentido e de soluções
construídas no direito societário para os aspectos associativos, co-
tejando com os documentos das referidas Associações.
O administrador é civilmente responsável, com seu próprio patrimônio, pelos efeitos
dos atos e omissões decorrentes de má gestão, gestão temerária, conflito de interesses
e descumprimento, culposo ou doloso, de suas obrigações legais e contratuais”.
3 Sobre conflito de interesses no serviço público veja: A experiência do Brasil na ad-
ministração de conflito de interesses no serviço público. Disponível em:
“https://bvc.cgu.gov.br/bitstream/123456789/3131/1/a_experiencia_do_brasil.pd”.
Acesso em 24 de julho de 2015.
4 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Conflito de interesses nas assem-
bléias de S.A. (e outros escritos sobre conflito de interesses). 2. ed. São Paulo: Ma-
lheiros Editores, 2014; FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Invalidade das
Deliberações de Assembléia das S/A. São Paulo: Malheiros, 1999. Um exemplo con-
creto do tema se extrai do documento do BNDES intitulado: Conflito de interesses e
benefício particular em matérias sujeitas a deliberações em assembléias de sociedades
anônimas e em órgãos colegiados de fundos de investimentos. Disponível em:
http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/Publicacoes/
Consulta_Expressa/Tipo/Revista_do_BNDES/201106_09.html. Acesso em: 24 de
julho de 2015.
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Nessa senda, para alcançar esses desideratos, utilizar-se-á um
método e uma metodologia que visam robustecer o caminho e o ca-
minhar para a edificação da análise apresentada, sem jamais se fur-
tar em afirmar sobre a provisoriedade de qualquer discussão jurídi-
ca, pois sempre será possível um outro olhar sobre os temas aqui
aludidos. O método escolhido para este artigo mescla a dedução e
a indução, tendo como prius afirmações teóricas de caráter geral,
aplicáveis em cada caso concreto de maneira dedutiva, no momen-
to em que os documentos associativos forem verificados. Tais ele-
mentos, indutivamente, podem reproduzir a necessidade de ressig-
nificação (ou não) dos institutos jurídicos pesquisados em cada si-
tuação concreta.
Explicitado o método, esclarece-se a metodologia de procedi-
mento e a de abordagem. A primeira utilizará o procedimento mo-
nográfico, com a análise de trabalhos relacionados ao assunto. A se-
gunda se baseará em uma linha crítico-metodológica, lastreada em
uma teoria crítica da realidade que compreende o Direito como
problema e como uma “rede complexa de linguagens e de significa-
dos”.5 Passa-se a seguir para a densificação dos assuntos pertinen-
tes a este artigo.
2. Conflitos de interesses, benefício particular e votos abusivos
no âmbito das sociedades simples e anônimas
Um sentido6 atribuído ao significante interesse é o de uma re-
lação jurídica legal entre o sujeito que possui uma necessidade e o
bem apto a satisfazê-la.7 Essa ideia de interesse, no Direito Empre-
sarial, como relação entre sujeito e bem, normalmente, circunscre-
ve-se ao aspecto econômico, a partir do sentido construído pela li-
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5 GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa; DIAS, Maria Tereza Fonseca. (Re)pensan-
do a pesquisa jurídica. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2013, p. 20-21.
6 Significado indica “as potenciais compreensões que se pode obter quando uma
palavra é considerada abstratamente, ou o conjunto de sentidos plausíveis de uma pa-
lavra; já “sentido” é o uso concreto de um significado. Ou seja, entende-se por “senti-
do” o significado adicionado do contexto do uso da palavra”. SGARBI, Adrian. Intro-
dução à teoria do direito. São Paulo: Marcial Pons, 2013, p. 31.
7 FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes. Conflito de interesses nas as-
sembléias de S.A. (e outros escritos sobre conflito de interesses). 2. ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2014, p. 22.

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