Cyberbullying, deepfake e deepnude: a vulnerabilidade das crianças e adolescentes na internet e a responsabilidade civil decorrente dos ilícitos cibernéticos

AutorAdriano Marteleto Godinho e Marcela Maia de Andrade Drumond
Páginas193-210
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CYBERBULLYING, DEEPFAKE E DEEPNUDE:
A VULNERABILIDADE DAS CRIANÇAS
E ADOLESCENTES NA INTERNET
E A RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE
DOS ILÍCITOS CIBERNÉTICOS
Adriano Marteleto Godinho
Professor dos cursos de graduação e pós-graduação stricto sensu da Universidade
Federal da Paraíba. Pós-Doutorando em Direito Civil pela Universidade de Coimbra.
Doutor em Ciências Jurídicas pela Universidade de Lisboa. Mestre em Direito Civil
pela Universidade Federal de Minas Gerais.
Marcela Maia de Andrade Drumond
Pós-graduanda em Direito Processual Civil pelo Complexo de Ensino Renato Saraiva.
Graduada em Direito pela Universidade Federal da Paraíba.
Sumário: 1. Notas introdutórias: a tutela de direitos fundamentais de crianças e adolescentes – 2.
A prática do cyberbullying; 2.1 O cyberbullying na perspectiva do ofensor; 2.2 O cyberbullying
na perspectiva da vítima – 3. Deepfake e deepnude: transgressões aos direitos da personalidade
de menores – 4. Responsabilidade civil decorrente dos ilícitos cibernéticos – 5. Considerações
nais – 6. Referências.
1. NOTAS INTRODUTÓRIAS: A TUTELA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS DE
CRIANÇAS E ADOLESCENTES
Na sociedade da tecnologia e da informação, poucas discussões se revelam tão
turbulentas quanto a que se propõe a debater o modo como crianças e adolescentes
interagem na internet – particularmente, nas diversas redes sociais de amplo acesso
e disseminação de informações. Por mais vigilantes que sejam os pais, e ainda que
tais redes tencionem limitar o acesso de menores de idade ao seu conteúdo, é difícil
exercer amplo controle sobre as atividades dos f‌ilhos no âmbito virtual.
Entre os diversos dilemas que concernem à utilização destas redes por crianças e
adolescentes, emergem alguns fenômenos de difícil controle: a prática de atos como
cyberbullying, deepfake e deepnude, dirigidos contra outros usuários da internet,
muitos deles menores de idade e, portanto, particularmente vulneráveis.
De acordo com o teor da Constituição Federal, são fundamentais e inerentes a
toda pessoa os direitos à vida, à liberdade, à igualdade e à segurança, entre outros,
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explícitos ou implícitos ao longo do seu texto. Crianças e adolescentes são indivíduos
dotados de todos os direitos fundamentais assegurados constitucionalmente à pessoa
humana, como reforça o art. 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente (doravante
ECA). Por serem os menores pessoas em desenvolvimento, é primordial que possam
gozar e exercer tais direitos, a f‌im de que tenham sua dignidade respeitada e possam
edif‌icar-se enquanto membros também do meio social. Todo infante deve ter espaço
de opinar e se expressar – noção que também se consagra no texto do art. 16, inciso
II do ECA –, de construir sua própria personalidade e buscar sua realização, sendo
oportunizado pelos pais o franco diálogo, sempre com vistas à promoção do melhor
interesse do menor.
Ademais, sobrelevam duas regras imprescindíveis no bojo do aludido Estatuto
protetor: consoante seu art. 15, “a criança e o adolescente têm direito à liberdade,
ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento
e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e
nas leis”; já o art. 17 preconiza que “o direito ao respeito consiste na inviolabilidade
da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a
preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças,
dos espaços e objetos pessoais”. Destes dispositivos, em particular, emerge a per-
cepção da necessidade de plena tutela e promoção da dignidade e da personalidade
de crianças e adolescentes.
Quando o assunto é autoridade parental, alguns desses direitos fundamentais
se destacam, eis que podem gerar insegurança e conf‌lito na relação entre pais e f‌i-
lhos. É o caso dos direitos à liberdade, à intimidade, ou privacidade, ao respeito e à
dignidade, no que tange à criação e educação. Como o menor, enquanto pessoa em
desenvolvimento, é amparado de forma especial pelo ordenamento jurídico, seu
direito fundamental à liberdade é expressamente assegurado, tendo por objetivo
proporcionar-lhe o direito de criar, aprender, signif‌icar e ressignif‌icar, se expressar
e construir suas próprias crenças e personalidade. Assim, vai se desenvolvendo
enquanto sujeito e adquirindo maior grau de discernimento, responsabilidade e
capacidade de autonomia.1
Quanto ao direito à intimidade e, como decorrência, à privacidade, assegura-se,
como preceitua o ECA, que o menor deva ter sua imagem, identidade e autonomia
preservadas, de forma que seu espaço pessoal – que remete ao seu íntimo e à cons-
trução de quem se é – não pode ser violado. Assim também prevê a própria Carta
Magna, de forma mais ampla, a toda e qualquer pessoa, referindo-se, inclusive, a
questões de correspondência e comunicação.2
1. TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Família, guarda e autoridade parental. 2 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:
Renovar, 2009. p. 213-214.
2. TEIXEIRA, Ana Carolina Brochado. Família, guarda e autoridade parental. 2 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:
Renovar, 2009. p. 204.
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