Da jurisdição

AutorAntonio Araldo Ferraz dal Pozzo
Páginas35-56
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CAPÍTULO II
DA JURISDIÇÃO
Sumário: 1. Sistemas de criação do direito. 2. Estrutura básica das
normas jurídicas. 3. Do cumprimento das normas jurídicas. 4. Da
proibição da autodefesa. 5. Conceito de jurisdição. 5.1 A jurisdição
é a atividade dos órgãos do Estado. 5.2 Que tem por objeto
formular a regra jurídica concreta. 5.3 Que tem por objeto realizar
praticamente a regra jurídica concreta. 5.4 Que, segundo o direito
vigente, disciplina uma determinada situação jurídica. 6. Noção
de tutela jurisdicional. 7. Jurisdição e as demais funções do Estado.
8. Jurisdição voluntária. 9. Jurisdição e Juízo Arbitral. 10. Do
incentivo à conciliação.
1. SISTEMAS DE CRIAÇÃO DO DIREITO
Piero Calamandrei reduz os processos de criação do direito a dois:
aquele que chama de “formulação para o caso singular” e o que deno-
mina de “formulação por classe” ou “formulação legal”.1
Historicamente, prossegue o processualista italiano, o juiz nasceu
antes do legislador e, assim, o Estado intervinha apenas para resolver
uma situação conflituosa já ocorrida, perturbadora da paz social, formu-
lando o direito para esse caso particular.
1 Opere Giuridiche. vol. 4. Morano Editore, 1970, p. 84/85.
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Porém, desde há muito e muito tempo, as civilizações ocidentais
abandonaram esse método de formulação do direito e adotaram a formu-
lação legal: o Estado busca prever, antecipadamente, as situações que
podem ocorrer na vida social e cuida de discipliná-las, descrevendo em
normas jurídicas os elementos essenciais de condutas permitidas, dese-
jadas ou proibidas e estabelecendo as consequências para sua violação.
Modernamente, a formulação legal se prende ao chamado princí-
pio da legalidade, que é uma das decorrências de um princípio ainda mais
geral, chamado princípio da segurança jurídica, sendo, ambos, importantes
sustentáculos do Estado de Direito.
Jacques Chevallier, citando Stern acentua que “o Estado de Di-
reito significa que o poder estatal não pode ser exercido senão sob o
fundamento de uma Constituição e das leis constitucionais, de um
ponto de vista formal e material, e com o objetivo de garantir a digni-
dade do homem, a liberdade, a justiça e a segurança jurídica”.2
O mesmo autor, mais adiante, sublinha que a segurança jurídica
“implica, em primeiro lugar, que o direito existente possa ser reconhe-
cido e cumprido”, e depois enfatiza os aspectos de acessibilidade e de
inteligibilidade do direito e a igualdade de todos perante a lei: as pessoas
devem dispor de meios para conhecer o direito e de entendê-lo o quan-
to possível. Ainda, em decorrência da segurança jurídica, a lei deve ser
irretroativa – aplicar-se a casos futuros e não ao passado.
O princípio da legalidade foi expressamente agasalhado pela Cons-
tituição Federal:
Art. 5º (omissis)
II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma
coisa senão em virtude de lei.3
Portanto, no Estado Democrático de Direito Brasileiro vigora a
formulação legal das normas jurídicas como expressão do princípio da
2 L’État de Droit. 4ª ed. Paris: Montchrestien, p. 69.
3 Também há referência ao princípio da legalidade no art. 37 caput da CF.

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