Da prisão arbitrária à ruptura do projeto existencial: diálogos entre Rollo May e Jean-Paul Sartre

AutorHidemberg Alves da Frota
CargoEspecialista em Relações Internacionais: Geopolítica e Defesa (UFRGS)
Páginas166-187
DOUTRINA
DA PRISÃO ARBITRÁRIA
À RUPTURA DO
PROJETO EXISTENCIAL:
DIÁLOGOS ENTRE
ROLLO MAY E
JEAN-PAUL SARTRE1
Por HIDEMBERG ALVES DA FROTA2
Especialista em Relações Internacionais: Geopolítica e Defesa (UFRGS)
Na obra intitulada
O Homem à Procura de Si Mesmo
(
Man´s
Search for Himself
), publicada originalmente em 1953, a quarta
do psicólogo clínico estadunidense Rollo Reece May (1909-
1994), o qual, com tonalidades próprias, matizou, em seus
escritos, saberes colhidos da psicologia humanista, da psicanálise
e das psicologias e filosofias da existência e da fenomenologia,
consta, no começo do seu capítulo V, denominado “Liberdade
e Força Interior” (
Freedom and Inner Strength
), a parábola
que chamou “O Homem que foi Colocado numa Gaiola” (
The
Man Who Was Put in a Cage
) (MAY, 2011, p. 133-136)
HIDEMBERG ALVES DA FROTA 167
DA PRISÃO ARBITRÁRIA À RUPTURA DO PROJETO EXISTENCIAL
Nesta pesquisa, propõe-se novo
olhar sobre o microconto de
Rollo May, à luz da proposta
em construção na contempo-
raneidade, sobretudo nas últimas duas dé-
cadas, pela comunidade de psicólogos e
lósofos brasileiros estudiosos do lósofo,
escritor, crítico literário e dramaturgo Jean-
-Paul Charles Aymard Sartre (1905-1980),
de psicologia fenomenológica e existen-
cialista inspirada em suas obras literárias
e losócas. Trata-se de pesquisa do tipo
bibliográca, baseada na consulta a artigos
cientícos e capítulos de livro de obras co-
legiadas vinculados à psicologia e à lo-
soa de matrizes sartrianas, bem como em
textos losócos e ccionais de Sartre.
De início, examina-se a liberdade ontológi-
ca em Sartre, debruçando-se sobre o conto
de sua autoria intitulado “O Muro”.
Após, passa-se à interpretação da parábola
de Rollo May, com base nos aportes colhi-
dos da literatura brasileira especializada na
psicologia e na losoa de bases sartria-
nas, com destaque ao estudo da concepção
sartriana de má-fé e das contribuições da
psicologia fenomenológica e existencialis-
ta de cariz sartriano e de formulação bra-
sileira às questões do sofrimento psíquico,
da ausência de campos de possíveis e da
ruptura do projeto existencial.
Em seguida, evidencia-se a atualidade do tex-
to ccional de May, em cotejo com a realida-
de contemporânea pertinente à pena perpétua
e ao connamento solitário, em particular no
sistema prisional da América do Norte.
1. A liberdade ontológica
em Sartre
Na perspectiva da psicologia fenomenoló-
gica e existencialista de bases sartrianas,
a liberdade se manifesta na facticidade,
isto é, ela ocorre em situação, limitado o
seu exercício, pela estrutura da escolha, ou
seja, pelo contexto fático em que o sujeito
se insere quando, lançando-se ao mundo e
sendo por ele atravessado, realiza, de mo-
do inevitável, a escolha de ser, mesmo nas
circunstâncias em que decide não escolher
(SCHNEIDER, 2011, p. 94).
Conforme se depreende da principal obra
losóca de Jean-Paul Sartre, O Ser e o
Nada (L’être et le néant), originalmente
publicada em 1943, a liberdade, na acep-
ção popular e empírica, exprime a “liberda-
de de obter” aquilo que se almeja. É dizer,
reete, ao sabor de determinada conjuntura
moral, política e histórica, a faculdade de
alcançar os ns eleitos, ao passo que, na
formulação técnica e losóca de liberda-
de delineada por Sartre, ela concerne à “li-
berdade de escolha”, ou seja, diz respeito
à autonomia humana de efetuar escolhas,
quer tenham êxito, quer fracassem (SAR-
TRE, 1978, p. 483-484; SARTRE, 1993, p.
508-509; SARTRE, 2015, p. 595-596).
A concepção de liberdade adotada por Sar-
tre possui caráter ontológico (inerente à

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT