A Defesa do Consumidor Em Juízo - Arts. 81- 104 do CDC

AutorFabio Schwartz
Ocupação do AutorDefensor Público no Rio de Janeiro; Mestre em Direito Econômico e Desenvolvimento; Doutorando em Direito pela Universidade Federal Fluminense
Páginas337-409
TÓPICO VII
A Defesa do Consumidor Em Juízo –
Arts. 81– 104 do CDC
1. INTRODUÇÃO
Até aqui se tratou dos direitos materiais do consumidor. Entre-
tanto, de nada adiantaria este arcabouço de direitos se o Código
não alinhasse garantias processais correspondentes, voltadas para a
redução das disparidades naturais existentes entre os sujeitos en-
volvidos. Assim, o legislador dedicou um título exclusivo do CDC,
com a pretensão de dar efetividade à defesa do consumidor na sea-
ra processual, buscando facilitar a defesa de seus direitos.
Cumpre assim o CDC sua característica mais marcante, que é
ser um diploma legal multidisciplinar – já que encerra previsões
materiais, administrativas, de Direito Penal e, também, Processual
Civil – de forma a garantir a mais ampla proteção ao consumidor.
No que tange às disposições processuais, a despeito das previ-
sões específicas contidas no CDC, não se pode descurar que estas
convivem em perfeita harmonia com as linhas gerais estabelecidas
pelo CPC, operando-se o chamado diálogo sistemático de coerên-
cia, tratado no TÓPICO I, item 6.1 desta obra. Deste modo, apli-
cam-se as normas do CPC sempre que o microssistema de prote-
ção e defesa do consumidor não tratar da matéria de forma direta
e específica293.
O Código não só deitou preocupação em tutelar o consumidor
individualmente, mas, de forma incisiva, preocupou-se com a tute-
la coletiva, trazendo neste particular uma série de inovações muito
aplaudidas pela comunidade jurídica.
337
293 Ver art. 90 do CDC: “Aplicam-se às ações previstas neste título as normas do Có-
digo de Processo Civil e da Lei 7.347, de 24 de julho de 1985, inclusive no que respeita
ao inquérito civil, naquilo que não contrariar suas disposições”.
Natural que em uma sociedade de consumo de massa o Código
deitasse especial preocupação com as ações coletivas, já que, na
maioria das vezes, o mercado atua de forma estandardizada, através
dos chamados contratos de adesão, orientando práticas repetitivas
que extrapolam a dimensão de um interesse puramente individual,
atingindo, via de regra, toda uma coletividade. Daí por que o legis-
lador acabou por estatuir previsões tímidas no que pertine à tutela
individual do consumidor, conforme veremos adiante.
2. TUTELA JURISDICIONAL DO CONSUMIDOR
Um dos mais importantes dispositivos acerca da tutela jurisdi-
cional do consumidor é o art. 83, que diz respeito tanto às ações
coletivas, quanto às individuais, estabelece que “para a defesa dos
direitos e interesses protegidos por este código são admissíveis todas
as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva tu-
tela”.
O legislador garantiu a possibilidade de utilização de todas as
espécies de ações, ou seja, não importa se a demanda é coletiva ou
individual, a defesa do consumidor poderá se materializar median-
te ação de conhecimento de cunho declaratório, constitutivo, con-
denatório, executiva lato sensu294ou mandamental; bem como me-
diante ação cautelar e ação executiva. O que importa mesmo é que
o direito seja amparado de forma vigorosa, garantindo-se a plena
eficácia da tutela jurídica processual.
Aqui é preciso se fazer o necessário link com o art. 6º do CDC,
mais especificamente os incisos VI, VII e VIII. O primeiro garante
o direito básico à prevenção e reparação de danos patrimoniais e
morais, individuais, coletivos e difusos, ou seja, introduziu o prin-
cípio do restitutio in integrum. O segundo dispõe sobre o acesso aos
órgãos judiciários e administrativos, com vistas à prevenção ou re-
paração de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou
difusos. O terceiro introduz regra de facilitação da defesa dos di-
338
294 Executiva lato sensu diz respeito a procedimentos que concentram na fase cogni-
tiva uma eficácia satisfativa e autoexecutória, independentemente da instauração de
uma nova fase processual ou novo processo, como ocorre, por exemplo, com a senten-
ça de despejo.
reitos do consumidor. Note-se que a materialização destes direitos
básicos seria muito difícil sem o instrumental dado pelo art. 83, já
que, ao menos até a entrada em vigor do CDC, a legislação era mui-
to acanhada no que tangenciava a proteção de direitos não-patri-
moniais, tais como a vida, à saúde e à integridade física e psí-
quica.295
O art. 83 é complementado pelo art. 84, o qual confere maior
amplitude ao sistema para uma melhor e mais efetiva tutela jurídi-
ca processual dos interesses e direitos do consumidor, conforme
veremos no item adiante.
2.1. Tutela Individual
2.1.1. Tutela específica das obrigações de fazer e não fazer
À época da promulgação do CDC a disposição contida no art.
84 se apresentava como grande novidade, tendo sido inspirado,
conforme noticia Kazuo Watanabe, no anteprojeto de modificação
do Código de Processo Civil elaborado pela Comissão nomeada em
1985 pelo Ministério da Justiça, o qual sugeria a criação de uma
Ação Especial de Tutela Específica da Obrigação de Fazer ou não
fazer.296
Mais tarde, se rendendo a maior efetividade deste dispositivo
para a garantia do resultado prático assegurado pelo direito, o Le-
gislador, através da Lei 8.952/1994, introduziu alteração no art.
461 do então Código de Processo Civil em vigor (Código de 1973),
imprimindo redação praticamente idêntica à constante da norma
consumerista. Não obstante, ao longo do tempo foram sendo incor-
poradas algumas novidades no CPC que não foram acrescidas ao
Código de Defesa do Consumidor, permanecendo o art. 84 com
sua redação original até os dias de hoje.
O novo CPC, por sua vez, repete o art. 461, caput do Código de
1973 (já com todas as inovações ao longo de sua subsistência), esta-
belecendo que o juiz poderá conceder a tutela específica da obri-
gação ou, se procedente o pedido, determinará providências que as-
segurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
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295 WATANABE, Kazuo. Op. cit., p. 518.
296 Ibidem, p. 524.

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