Desafios para a correta fundamentação das decisões judiciais: algumas considerações sobre as críticas ao art. 489, §1º do CPC

AutorThiago Carlos de Souza Brito
Ocupação do AutorMestre e Doutorando em Direito Processual Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Páginas65-81
DESAFIOS PARA A CORRETA
FUNDAMENTAÇÃO DAS
DECISÕES JUDICIAIS:
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE
AS CRÍTICAS AO ART. 489, §1º DO CPC
Thiago Carlos de Souza Brito1
Sumário: 1 – Introdução. 2 - O Conteúdo da Fundamentação das Decisões Confor-
me o CPC. 3 - Óbices à Aplicação do Artigo 489, §1º, do CPC. 3.1 - Violação à indepen-
dência funcional dos magistrados. 3.2 - Ofensa ao Princípio do Livre Convencimento:
O Problema da Reprodução de Súmulas e Jurisprudência Dominante. 3.3 - Burocrati-
zação do Ato de Julgar. 4 – Conclusão. 5 – Referências bibliográf‌icas.
1. Introdução
O novo Código de Processo Civil (CPC/15), com vistas a melhorar a pres-
tação jurisdicional, trouxe diversas modicações em relação ao procedimento.
Partindo da premissa de que promoção dos princípios da celeridade e efetivi-
dade, o legislador alterou o procedimento ordinário para incluir a audiência
de conciliação preliminar; concentrou atos processuais em uma só manifesta-
ção (contestação, reconvenção, exceções); extinguiu procedimentos especiais
e recursos; criou incidentes nos tribunais; unicou prazos recursais, dentre
outros. Mas não só isso.
Algumas alterações inseridas no CPC/15 tiveram o intuito de depurar os
problemas existentes na atuação do Poder Judiciário. Dentre eles, destaca-se
o décit de fundamentação das decisões judiciais. A prática forense indica-
va que os magistrados, em algumas oportunidades, deixavam de motivar as
suas decisões adequadamente. J R C  T, ainda na década
de 80, alertava existirem “inúmeras e inadmissíveis distorções encontradiças na
1 Mestre e Doutorando em Direito Pro cessual Civil pela Universidade Federal de Minas Ge-
rais (UFMG). Professor da Faculdade de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul – FA-
DERGS. Membro Refundador e Diretor Executivo do IDPro – Instituto de Direito Proces-
sual. Advogado.
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praxe forense de todo o País, dentre as quais, as que admitem como suciente a
motivação aparente ou implícita, ou aquelas que simplesmente adotam as razões
expendidas por um dos integrantes do processo.2 Em razão disso, era necessá-
rio repensar a fundamentação das decisões, de modo que o ato judicial esteja
adequado ao Estado Democrático de Direito, uma vez que sem a devida moti-
vação não há contraditório efetivo e processo justo.3
Não que a fundamentação, por si só, seja garantia de uma decisão justa.
Como nos lembra P C, uma “sustentação extensa e cuidado-
sa pode revelar, no juiz, o desejo de esconder para si e para outros, com arabescos
logísticos, a perplexidade em que se encontra.4 Ainda assim, é ela elemento
essencial para legitimar a atividade jurisdicional perante as partes que estão
em litígio e a sociedade, ao controlar a discricionariedade do magistrado no
momento de decisão. Até mesmo porque o Poder Judiciário não possui mes-
ma validação popular pelas eleições periódicas, como ocorre com os demais
Poderes constituídos.5
Por isso, e seguindo a experiência estrangeira,6 o dever de fundamentação
das decisões foi inserido no texto constitucional, expressamente previsto no art.
93, inc. IX, da CF/88. A despeito da aplicabilidade imediata da regra constitu-
cional, não havia na legislação infraconstitucional regulamentação especíca, de
modo que as mesmas práticas indesejadas mencionadas por C  T per-
duravam. Com efeito, o legislador inovou no novo CPC ao estabelecer disciplina
pormenorizada sobre a matéria, conforme se verica no seu art. 489, §1º.
2 TUCCI, José Rogério Cruz e. A Motivação da Sentença no Processo Civil. São Paulo:
Saraiva, 1987, p. 153.
3 MITIDIERO, Daniel. Fundamentação e Precedente: Dois Discursos a partir d a Decisão
Judicial. In.: Revista de Processo, Vol. 206, p. 61-78, Abri l. São Paulo: RT, 2012, p. 62.
4 CALAMANDREI, Piero. Eles, os Juízes, Vistos por nós, os Advogados. 3ª Tiragem. São
Paulo: Pilares, 2013, p. 129
5 MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria G eral do Processo. São Paulo: RT, 2006, p. 407.
6 Interessante destacar que diversos países, no século XX, após a queda de regimes ditato-
riais, inseriram em suas constituições a regra da fundamentação obrigatória. Arma R-
 R  L (in: O Dever de Motivação das Decisões Judiciais: Estado de
Direito, Segurança Jurídica e Teoria dos Pre cedentes. 2ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2016,
p. 117-118) que: “São ótimos exemplos: Constituição mexicana de 1917 (art. 16), promul-
gada após a longa guerra civil que sucedeu a Revolução de 1910; Constituição italiana de
1948 (art. 111), promulgada após a queda do fascismo; Constituição grega de 1975 (arts. 6, 1
e 10,1), promulgada após a queda do ‘Regime dos Coronéis’; Constituição espanhola de 1978
(art. 120, 3), promulgada após a queda do franquismo; Constituição peruana de 1979 (art.
233, 4), promulgada após a queda de ditadura militar; Constituição portuguesa de 1976, re-
formada em 1982 (art. 205, 1), promulgada após a Revolução dos Cravos e a queda do Estado
Novo; e a Constituição brasileira de 1988, promulgada após a queda da ditadura militar.
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