Dever de operacionalização do sistema do vale-transporte no município

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PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA DO TRABALHO

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 73 REGIÃO

VARA DO TRABALHO DE SOBRAL/CE

Processo n. 206300-87.2009.5.07-0024

Vistos...

Ministério Público do Trabalho, através da Procuradoria Regional do Trabalho da 7- Região, ajuizou Ação Civil Pública em face do Município de Sobral e de José Leônidas de Menezes Cristino, alegando, em síntese, que, em decorrência da investigação no Inquérito Civil n. 116/2008, ficou constatado que nenhum empregador sediado no município demandado fornece vale-transporte a seus empregados, pelo fato do município em foco não ter implementado o sistema de vale-transporte; ficou constatado, outrossim, que, no âmbito do município, há transporte coletivo público urbano (topics e ônibus); a despeito da realização de três audiências perante o Parquet Trabalhista, não há previsão sobre a data de implementação do sistema do vale-transporte no município demandado, quando seria sua obrigação no sentido de implementar o sistema; em decorrência, tornou-se imperiosa a promoção da presente ação visando a obtenção da tutela jurisdicional vocacionada a permitir que os trabalhadores que laboram no Município de Sobral fruam do fornecimento do benefício em comento; assevera que o vale-transporte, na condição de autêntico direito social trabalhista, foi instituído para fazer face as despesas dos trabalhadores com o deslocamento da residência ao trabalho e vice-versa; afirma que a empresa operadora do sistema coletivo público tem a obrigação de emitir e comercializar o vale-transporte, pelo preço da tarifa vigente, bem como de colocar o vale-transporte à disposição dos empregadores em geral e assumir os custos das obrigações anteriores, sem repas-

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sá-los para a tarifa dos serviços, ficando o poder concedente (Município) com o encargo de expedir normas complementares para operacionalização do sistema, acompanhar seu funcionamento e fiscalizá-lo, inclusive fixando as sanções para o caso de a empresa operadora do sistema de transporte público não emitir vales suficientes para atender à demanda; aduz que o poder público poderá, alternativamente, assumir as obrigações de emitir e comercializar o vale-trans-porte; acontece que o município demandado não cumpriu, até o presente instante, com nenhum dos deveres alternativos que lhe são cometidos por nosso ordenamento jurídico no que tange ao sistema do vale-transporte, restando evidenciada a necessidade de sua condenação em tutelas jurisdicionais visando a adoção de medidas que resultem na implementação do referido sistema; argumenta, inclusive transcrevendo posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais, haver entendimento sedimentado no sentido de que as políticas públicas estampadas na Constituição Federal e viabilizadoras da concretização dos direitos sociais, como no caso de que se cuida, têm de ser obrigatoriamente implementadas pelo poder público; sustenta que o prefeito, por ser o ordenador de despesa do município, é responsável solidário direto pela situação irregular sob discussão; aduz, por fim, ser a Justiça obreira competente para dirimir a demanda e deter o MPT legitimidade para o ajuizamento da presente ação, visto que esta envolve a postulação de tutela coletiva dos interesses/direitos de toda uma gama indeterminada de trabalhadores que poderão, no futuro, fruir o direito social do fornecimento do vale-transporte. Diante do exposto, postula a condenação do Município de Sobral, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, reversível em favor do FAT, na obrigação de expedir normas complementares para operacionalização do sistema do vale-transporte em seu território, acompanhar seu funcionamento e efe-tuar o respectivo controle ou, alternativamente, emitir e comercializar o vale-transporte diretamente ou por entidades de sua Administração indireta, devendo o prefeito José Leônidas de Menezes Cristino responder solidariamente pelo pagamento das astreintes que vierem a ser aplicadas em desfavor da edili-dade. Requer, ainda, que a intimação do Ministério Público do Trabalho seja efe-tivada pessoalmente (fls. 2/26). O Ministério Público do Trabalho juntou documentos (fls. 27/42).

Frustrada a primeira tentativa de conciliação, o Município de Sobral apresentou defesa, alegando, em preliminares, a incompetência da Justiça Obreira para resolver o litígio e requerendo a redução do valor atribuído à causa para R$ 2.000,00. No mérito, sustenta que o objeto da demanda possui natureza de cunho jurídico-administrativo, visto que a pretensão deduzida na inicial não trata, especificamente, do vale-transporte, mas da obrigação de fazer a ser imposta a edilidade municipal no sentido de instituir, por meio de lei municipal, no seu âmbito administrativo, o sistema municipal de transporte coletivo urbano, para em seguida regulamentar a expedição do vale-transporte. Afirma que a pretensão ministerial não deve prosperar: primus, por ser apenas relativo o direito ao vale--transporte, já que o benefício não alcança o conjunto de todos os trabalhadores, mesmo em se tratando de município que possua sistema de transporte coletivo urbano legalmente instituído e regulamentado, estando em funcionamento a

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expedição e comercialização do vale-transporte, o que faz esmaecer o interesse difuso alegado na inicial e, por conseguinte, desautorizar o ajuizamento da ação civil pública, por faltar legitimidade ao MPT para o patrocínio da ação; secundus, por afrontar o princípio da separação dos poderes, visto que a demanda tem por objeto impor ao ente federativo medida de cunho político-administrativo, sem a observância da oportunidade e conveniência, além da questão financeira e previsão orçamentária, quando é de sabença que o Poder Judiciário não deve intervir em esfera de outro Poder para substituí-lo em Juízos de conveniência e oportunidade, querendo controlar as opções legislativas de organização e prestação, a não ser, excepcionalmente, quando haja uma violação evidente e arbitrária, pelo legislador, não sendo o caso dos autos; tertius, por não estar inclusa, no âmbito das funções institucionais do Poder Judiciário, a atribuição de formular e de implementar políticas públicas, posto que, nesse domínio, o encargo cabe, principalmente, aos Poderes Legislativos e Executivo; pugna pela improcedência dos pedidos (fls. 49/74).

O município demandado juntou procuração, carta de preposto e documentos (fls. 75/126).

O demandado José Leônidas de Menezes Cristino também apresentou defesa, alegando, em preliminar, que o valor da causa deve ser alterado para R$ 1.000,00. No mérito, sustenta, dentre outros argumentos, que os pedidos deduzidos na demanda dizem respeito à obrigação de fazer imposta ao Município de Sobral no que pertine a implantação do sistema de transporte coletivo urbano e, por conseguinte, a regulamentação do vale-transporte, não sendo razoável e proporcional a atribuição de responsabilidade solidária ao contestante na qualidade de representante legal do ente público em tela, tendo em vista que tal meio extrapola a necessária adequação com os fins buscados pelo demandante; pugna pela improcedência dos pedidos (fls. 127/131).

O demandado José Leônidas de Menezes Cristino juntou procurações (fls. 132/133).

Sobre a exceção de incompetência, manifestou-se o Ministério Público à fl. 48.

As partes disseram que não têm quaisquer outras provas a produzir, ficando encerrada a instrução.

Razões finais remissivas.

Rejeitada a proposta renovatória de conciliação.

Decisão acolhendo a exceção de incompetência às fls. 135/138.

Inconformado com a decisão que acolheu a exceção de incompetência, o Ministério Público interpôs recurso ordinário para a Instância Revisora (fls. 143/ 157), tendo esta dado provimento ao recurso para, reconhecendo a competência da Justiça do Trabalho para o exame da controvérsia, determinar o retorno dos autos à Instância de Origem para complementação da prestação jurisdicio-nal (fls. 185/186).

É no que importa o relatório.

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Fundamentação
1. Da exceção de incompetência

A preliminar atinente à exceção de incompetência restou superada em face da decisão prolatada pelo Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 7- Região que declarou ser a Justiça do Trabalho competente para resolver o presente litígio, conforme acórdão que demora às fls. 185/186 dos autos.

2. Da impugnação ao valor da causa

O município demandado requer que seja reduzido para R$ 2.000,00 o valor atribuído à causa, sob o argumento de que o valor atribuído à causa na inicial de R$ 10.000,00 tem o intuito apenas de impor ao demandado possíveis ônus sucum-benciais na ilusão de pressionar a este quanto ao mérito do objeto da demanda, colocando-o numa situação de desvantagem.

A pretensão impugnativa da edilidade municipal demandada não tem qualquer consistência jurídica: primus, pelo simples fato do demandado ser ente de direito público e como tal não responde por pagamento de custas processuais, bem como pelo fato da ação ter sido ajuizada por procurador do trabalho de modo que, mesmo que o demandado não saia vitorioso na demanda, não haverá condenação da edilidade municipal demandada no pagamento de honorários advocatícios, donde se conclui que não haverá condenação em sucumbência; secundus, porque o próprio demandado indica um valor que entende correto, que também é superior ao dobro do mínimo legal da época em que a ação foi proposta, o que garante à parte que sair vencida na demanda interpor recurso ordinário para a instância revisora; tertius, pelo simples fato da alegada supe-restimação não produzir nenhum prejuízo às partes, uma vez que o valor das custas processuais e do depósito de eventual recurso serem fixados pelo valor atribuído à condenação, de modo que não há interesse jurídico na alteração de tal valor, mantendo-se...

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