O direito à compensação independente do trânsito em julgado: o funcionamento judiciário como o critério de segurança

AutorGuilherme Peloso Araujo
Páginas699-731
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O DIREITO À COMPENSAÇÃO INDEPENDENTE
DO TRÂNSITO EM JULGADO: O
FUNCIONAMENTO JUDICIÁRIO COMO O
CRITÉRIO DE SEGURANÇA
Guilherme Peloso Araujo1
1. O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E O SEU
CONTEXTO
A alteração do Código de Processo Civil, promovida pela
Lei 13.105 de 16 de março de 2015 (CPC/2015), trouxe à tona
inúmeras discussões sobre os rumos do processo civil brasilei-
ro, algumas delas relacionadas ao tratamento dispensado pela
Lei aos princípios constitucionais processuais. E não poderia
ser diferente. A leitura dos primeiros parágrafos da exposição
de motivos do anteprojeto deixa isso muito claro:
Um sistema processual civil que não proporcione à so-
ciedade o reconhecimento e a realização dos direitos, amea-
çados ou violados, que têm cada um dos jurisdicionados, não
1. Doutor em direito pela USP. Mestre em direito do Estado pela PUC-SP. Advogado
em São Paulo.
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PROCESSO DE CONHECIMENTO
se harmoniza com as garantias constitucionais de um Estado
Democrático de Direito.
Sendo ineficiente o sistema processual, todo o ordena-
mento jurídico passa a carecer de real efetividade. De fato, as
normas de direito material se transformam em pura ilusão,
sem a garantia de sua correlata realização, no mundo empíri-
co, por meio do processo.
A elaboração do anteprojeto esteve marcada pelo mais
elevado espírito de concretização do direito constitucional,
estabelecendo o processo como meio para a efetivação da tu-
tela jurisdicional pelo Estado, para a proteção do cidadão. Re-
conhece-se, com muita sabedoria, que o sistema processual
ineficiente macula o direito com o vício da ineficácia.2
O texto da exposição de motivos transita expressamente
pelos mais interessantes princípios e garantias constitucio-
nais, informando, ainda, que a elaboração do anteprojeto es-
teve sempre preocupada com a solução dos problemas enfren-
tados no dia a dia das demandas judiciais.
Fala-se em processo justo, célere, rente às necessidades
sociais, menos complexo, atento a preceitos constitucionais,
com duração razoável, preocupado com a formação da norma
jurídica por meio da jurisprudência e com as suas alterações,
atento à participação social na formação dos precedentes vin-
culativos, fala-se, ainda, em simplificação do sistema recursal
e em efetividade da prestação jurisdicional.
Ainda, a exposição de motivos esclareceu a intenção de
que o novo Código de Processo Civil fosse instituído com a
finalidade de ajustar parte dos problemas vividos pelo Poder
Judiciário brasileiro, que, notoriamente, sofre com acusações
de morosidade e de falta de efetividade na tutela de direitos.
2. Cassio Scarpinella Bueno (Curso sistematizado de direito processual civil. 3. ed.
São Paulo: Saraiva, v. 1, 2009, p. 153) aponta a efetividade como umas das principais
questões que envolvem o direito processual atual. Aponta, especialmente, que os
instrumentos processuais devem servir ao rápido gozo da tutela jurisdicional.
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NOVOS RUMOS DO PROCESSO TRIBUTÁRIO:
Judicial, Administrativo e Métodos Alternativos de Cobrança do Crédito Tributário
Objeto de destaque na exposição de motivos, o Novo Có-
digo de Processo Civil inova no ordenamento brasileiro ao
estabelecer, com detalhes, a forma pela qual a jurisprudên-
cia se formará e como o próprio Poder Judiciário com ela se
relacionará. Com questões dissolvidas por inúmeros artigos,
o CPC/2015 positiva a natureza de fonte do direito da jurispru-
dência, o que nos parece ser a sua principal novidade inserida
no sistema de direito positivo.
É justamente uma reflexão sobre a jurisprudência en-
quanto fonte do direito que pretendemos analisar neste estu-
do, à luz de normas constitucionais sobre o funcionamento
judiciário.
2. DIREITO CONSTITUCIONAL E A SUA APLICAÇÃO
A boa intenção do legislador ordinário em concretizar
princípios constitucionais no texto do CPC/2015 é, somente, o
primeiro dos passos para a adequada aplicação constitucional.
Isso porque não basta à lei ordinária reproduzir normas
constitucionais para que a sua concretização venha a ocorrer.
A positivação legal é, sem dúvida, uma importante etapa para
a aplicação dos princípios e regras constitucionais, mas insu-
ficiente na missão de plena eficácia do texto constitucional,
já que a aplicação, em concreto, do direito dependerá da sua
interpretação.
Nesse contexto, a doutrina aponta o caminho pelo qual
o intérprete de normas constitucionais deverá caminhar, su-
gerindo, inicialmente, uma interpretação harmônica de todo
o texto constitucional. As palavras de Celso Ribeiro Bastos e
Carlos Ayres Britto deixam isso claro:
Dizendo melhor ainda, o ordenamento constitucional não é resul-
tante de um conglomerado caótico ou desconectado de normas. An-
tes, é a própria expressão de um conjunto harmônico, sistemático e
unitário, no sentido de que, sem prejuízo da função particular das

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