O direito da metrópole no Brasil: a metropolização e a construção do regime jurídico das metrópoles brasileiras

AutorPatricia Ferreira Baptista, Pedro Augusto Setta Dias
CargoProfessora Associada de Direito Administrativo da Faculdade de Direito da UERJ/Bacharelando em direito na Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ
Páginas1888-1924
Revista de Direito da Cidade vol. 13, nº 4. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2021.63208
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Revista de Direito da Cidade, vol. 13, nº 4. ISSN 2317-7721. pp.1888-1925 1888
O DIREITO DA METRÓPOLE NO BRASIL
A METROPOLIZAÇÃO E A CONSTRUÇÃO DO REGIME JURÍDICO DAS METRÓPOLES BRASILEIRAS
METROPOLIS LAW IN BRAZIL
METROPOLIZATION AND THE CONSTRUCTION OF THE LEGAL REGIME OF BRAZILIAN
METROPOLISES
Patricia Ferreira Baptista1
Pedro Augusto Setta Dias2
RESUMO
O presente estudo tem como objetivo apresentar e discorrer sobre o direito da metrópole no
Brasil. Descreve, em linhas gerais, o processo de metropolização, geográfica e institucional,
vivenciado nas últimas décadas. Na sequência, apresenta os contornos de um direito à metrópole
como corolário do direito à cidade, ampliado em sua escala territorial, mas com a mesma
perspectiva de ocupação e apropriação dos espaços coletivos para a promoção de liberdade e
igualdade. Discorre, em seguida, sobre a evolução do tratamento jurídico-normativo das
metrópoles no país, a partir da Constituição de 1967, passando pela Constituição de 1988, pela
judicialização do tema com a orientação fixada pelo STF na ADI 1842, até chegar ao Estatuto da
Metrópole, e às discussões que se estabeleceram a partir daí. Conclui afirmando que o direito da
metrópole no Brasil ainda está em construção, permanecendo desafios ainda a serem
enfrentados e resolvidos, especialmente relativos ao exercício da cidadania e à governança
metropolitanas.
Palavras-chave: Metrópole; metropolização; região metropolitana; estatuto da metrópole; direito
à cidade; direito à metrópole; direito da metrópole.
1 Professora Associada de Direito Administrativo da Faculdade de Direito da UERJ. Doutora em Direito do
Estado pela Universidade de São Paulo - USP. Mestre em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio
de Janeiro - UERJ. Procuradora do Estado do Rio de Janeiro. Afiliação: Universidade do Estado do R io de
Janeiro - UERJ Lattes:http://lattes.cnpq.b r/3178086761615074 ORCID: https://orcid.org/0000-0002- 1377-
9573 E-mail: patriciafbaptista@gmail.com
2 Bacharelando em direito na Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ. E-
mail: psettad@gmail.com
Revista de Direito da Cidade vol. 13, nº 4. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2021.63208
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ABSTRACT
The aim of this paper is to discuss the existence and purposes of a law for the metropolises in
Brazil. After having presented some of the challenges of contemporary metropolis, a right to the
metropolis is pointed o ut as a derivative of Lefebvre’s right to the city, amplified in its territorial
scale, but retaining the same perspectives. Therefore, the idea of a law for the metropolises must
have strong connections with the concept of the right to the metropolis. The text, then, describes
how Brazilian law regarding the metropolises evolved since the 1967 Federal Constitution, passing
through the 1988 Federal Constitution and the Supreme Court decision in nº 1842 Constitutional
Action, until the enactment of the Statute of the Metropolis in 2015, and the discussions that
have been raised so forth. It concludes that an effective Brazilian law for the metropolises is still
under construction, challenges remaining yet to be faced and solved, especially those regarding a
real metropolitan citizenship and governance.
Keywords: Metropolis; metropolization; metropolitan region; metropolis statute; right to the city;
right to the metropolis; metropolis law.
1. AS CIDADES ESTENDIDAS E SEUS DESAFIOS
Estando em curso a terceira década do século XXI, a maioria da população urbana já vive
aglomerações de cidades, muitas em expansão (especialmente em países de economia
emergente). Dados sobre a situação global das metrópoles, consolidados pelo Programa das
Nações Unidas para Assentamentos Urbanos (UN-Habitat), revelam que, em 2020, havia 2,59
bilhões de pessoas vivendo em metrópoles, cerca de um terço da população mundial. As
estimativas indicam, ainda, que, em 2035, 39% da população mundial estará nessa situação (3,49
bilhões), um aumento de quase um bilhão em quinze anos3.
3 “En 2020 hay 1934 metrópolis con más de 300.000 habitantes que representan aproximad amente el 60%
de la población urbana mundial. Al menos 2,59 mil millones de personas viven en metrópolis en 2020, lo
que equivale a un tercio de la población global. 34 metrópolis han superado los 10 millones de habitantes;
mientras que 51 tien en una población de 5 a 10 millones; 494 de 1 a 5 millones; y 1355 de 300.000 a 1
millón(…) S e proyecta que el número de personas viviendo en metrópolis en 2035 aumentará a 3,47 mil
millones, lo que representará el 39% de la población global y el 62,5% de la población urbana del mundo.
Casi mil millones de personas se conv ertirán en habitantes metropolitanos en los próximos qu ince años”.
UN-Habitat. E stado Global d e las Metr ópolis 2020 Folleto de Datos Poblaciones. Disponível em
<https://unhabitat.org/sites/default/files/2020/08/gsm_-_folleto_de_datos_poblacion ales_2020_0.pdf.>
Acesso em 06 de out 2021.
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DOI: 10.12957/rdc.2021.63208
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Ao mesmo tempo em que se expandiram, as metrópoles se tor naram mais complexas. Do
ponto de vista territorial, os espaços urbanos em crescimento se aglutinaram. Sob o ponto de
vista econômico, desenvolveram-se redes interdependentes de fornecimento de bens, serviços,
produção e distribuição de alimentos. A dimensão humana, por sua vez, viu-se envolta em novos
fluxos, interações e tensões, gerados por uma inédita dinâmica de vida que, muitas vezes,
despersonaliza e acentua desigualdades.
O espaço metropolitano pressupõe um complexo de relações que aproxima diferentes
núcleos urbanos. Pessoas, atividades econômicas e serviços públicos espraiam-se pelo território;
as suas demandas são indiferentes a limites territoriais abstratos que sejam postos para a sua
satisfação. Mais ainda: muitas dessas demandas apresentam-se de tal forma que o
seu atendimento, em escala estritamente local, geraria consequências indesejáveis, quando não
seria de todo inviabilizado.
Assim, a metrópole se desenvolve como uma unidade urbana, em que “cidades” passam a
compartilhar infraestruturas e atividades; mas, ao mesmo tempo, como um modelo de divisão (de
produção e de trabalho) 4 e de segregação, com distintas possibilidades de apropriação dos
espaços e de acesso a bens e serviços.
As dinâmicas e fluxos metropolitanos envolvem formas p róprias de interação entre
espaço, Estado e mercado, demandando ferramentas específicas de gestão pública. E o s diversos
contextos sócio-político-econômicos nacionais vêm buscando desenhar modelos próprios para
lidar com o fenômeno5.
No entanto, o equacionamento dos desafios metropolitanos sociais e econômicos
depende, na maioria das vezes, da superação dos limites te rritoriais e institucionais tradicionais.
São necessárias políticas integradas de desenvolvimento urbano, e ações articuladas, próprias de
instrumentos de gestão compartilhada, muitas vezes de difícil consecução. A falta de experiências
prévias dessa natureza agrava as inadequações espaciais, e aumenta o impacto socioambiental
das metrópoles.
4 SANTOS, Milton. A urbanização brasileira. São Paulo: Hucitec, 1993, p. 67.
5 Veja-se, a propósito, VIE PUBLIQUE. Republique Française. Qu´est-ce qu´une métropole? Fiche tématique.
02 mars 2021. Disp onível em: https://www.vie-publique.fr/fiches/201 29-quest-ce-quune-metropole.
Acesso em 02 out 2021; OHM, Brian W., Is There a Law of Regional Planning? (May 24, 2017). Belmont Law
Review, Vol. 4, p . 35 (2017), Belmont University College of Law Research Paper No. 2017 -16. Disponível em
https://ssrn.com/abstract=2973361 Acesso em 21 ago. 2021; GOMÁ, Ricard. Del derecho a la ciudad al
derecho a la metrópoli. Barcelona: M etròpolis, Núm. 111, abril 2019. Disponível em:
https://www.barcelona.cat/metropolis/es/contenidos/del-derecho-l a-ciudad-al-derecho-la-metropoli.
Acesso em 28 set. 2021

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