Do Solipsismo Supremo à Deliberação Racional

AutorGabriel Rübinger-Betti - Juliano Zaiden Benvindo
CargoPesquisador de Iniciação Científica (ProIC) - Professor de Direito Constitucional da Universidade de Brasília (UnB)
Páginas149-178
Direito, Estado e Sociedade n.50 p. 149 a 178 jan/jun 2017
Do Solipsismo Supremo à
Deliberação Racional*
From Supreme Solipsism to Rational Deliberation
Gabriel Rübinger-Betti**
Universidade de Brasília, Brasília-DF, Brasil
Juliano Zaiden Benvindo***
Universidade de Brasília, Brasília-DF, Brasil
1. Introdução
A literatura constitucional brasileira é de tendência fortemente normativa.
A preocupação concentra-se, em grande medida, em desvendar teorias e
metodologias de como se deve alcançar a decisão correta. O questiona-
mento de como devem decidir os juízes ou qual é a melhor técnica (ou
teoria ou metodologia) para alcançar a resposta correta prevalece. Apenas
recentemente ganharam relevo estudos destinados a não tanto perguntar
como devem julgar as cortes, mas, sobretudo, como, de fato, julgam as cor-
tes1. São pesquisas que têm a propensão a entrar em um universo não tão
simpático aos juristas, envolvendo, não raramente, abordagens empíricas,
* A pesquisa desenvolvida no âmbito do Centro de Pesquisa em Direito Constitucional Comparado da
Universidade de Brasília.
** Pesquisador de Iniciação Científ‌ica (ProIC) e Graduando em Direito da Universidade de Brasília (UnB)
e Pesquisador do Centro de Pesquisa em Direito Constitucional Comparado da Universidade de Brasília
E-mail: rubinger.g@gmail.com.
*** Professor de Direito Constitucional da Universidade de Brasília (UnB). Doutor em Direito Público pela
Universidade Humboldt de Berlim (Alemanha) e pela Universidade de Brasília, tendo realizado estágio
pós-doutoral na Universidade de Bremen (Alemanha). Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq
(Processo nº 308733/2015-0). E-mail: juliano@unb.br.
1 Vide COSTA & BENVINDO, 2013; DA SILVA, 2013; FALCÃO ET AL., 2014; MENDES, 2013; RODRI-
GUEZ, 2013.
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Direito, Estado e Sociedade n. 50 jan/jun 2017
estatísticas e de desenho institucional. Provavelmente decorrente de uma
estrutural escassez de estudos metodológicos e de um curioso afastamento
de pesquisas que se desenvolvem mais no âmbito da ciência política, a lite-
ratura constitucional brasileira tende a ser unidimensional. Em outras pa-
lavras, ela enxerga o fenômeno jurídico apenas pela dimensão do que deve-
mos ser e, não, de como os arranjos institucionais ou limitações cognitivas
e comportamentais dos próprios juízes afetam direta ou indiretamente a
decisão. Há, portanto, uma lacuna que, aos poucos, tem sido preenchida,
mas que ainda demanda um incremento substancial de pesquisas.
Este artigo busca, desse modo, auxiliar no preenchimento dessa lacuna.
Ele tem, como objetivo, brevemente analisar o desempenho deliberativo do
Supremo Tribunal Federal (STF), aprofundando um tema que apenas re-
centemente passou a ganhar maior relevo na doutrina brasileira. Seu foco,
todavia, se volta para desenhos institucionais, práticas arraigadas e compor-
tamento dos agentes em uma dimensão sistêmica de dois níveis2, assumin-
do que o STF, como instituição, não pode se confundir com uma simples
somatória de opiniões de seus membros e, muito menos, como uma insti-
tuição que, ao se identif‌icar com seus ministros - ou um de seus ministros
- determina e assume o controle, em grande parte, da ordem constitucional.
Essa disfuncionalidade, que aponta para o fortalecimento de indivíduos
controlando o constitucionalismo por intermédio de comportamentos e
práticas que enfraquecem a deliberação coletiva é, desse modo, o principal
foco deste artigo. Ao obstruir a deliberação coletiva – e agir estrategicamen-
te para esse f‌im – o STF, na medida em que ganha em poder em torno das
individualidades que o compõe, perde em legitimidade.
Para tanto, serão discutidas, primeiramente, a legitimidade da corte
constitucional e os limites de sua racionalidade (Parte 2), conectando esse
tema com a razão de ser da deliberação racional. Em seguida, será feita
uma apresentação do estado da arte da literatura nacional sobre a temática,
indicando possíveis conexões e conclusões entre as distintas abordagens
(Parte 3). Especialmente com foco no controle concentrado de constitucio-
nalidade, o artigo desenvolve uma breve análise dos procedimentos ado-
tados pelo STF em seu processo decisório, explicitando estruturais disfun-
cionalidades em sua capacidade deliberativa (Parte 4). Após desenvolver
uma descrição de regras e práticas desta corte, a pesquisa avança para uma
2 Vide VERMEULE, 2011, p. 27.
Gabriel Rübinger-Betti
Juliano Zaiden Benvindo

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