A escolha pela responsabilização não criminal das pessoas jurídicas por atos de corrupção no Brasil e as repercussões na esfera da cooperação internacional

AutorMarcelo Ribeiro de Oliveira
Páginas337-352
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A ESCOLHA PELA RESPONSABILIZAÇÃO
NÃO CRIMINAL DAS PESSOAS JURÍDICAS
POR ATOS DE CORRUPÇÃO NO BRASIL
E AS REPERCUSSÕES NA ESFERA DA
COOPERAÇÃO INTERNACIONAL
Sara Martins Gomes Lopes456
Marcelo Ribeiro de Oliveira457
456 Advogada da União em exercício na Procuradoria Nacional de Assuntos Inter-
nacionais da AGU. Pós-graduada em Direito Administrativo. Atuou com acordos de
leniência de 2017 a 2021. Membro da delegação brasileira no Grupo de Trabalho
sobre Suborno (WGB) da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Eco-
nômico (OCDE) de 2018 a 2022. Membro da delegação brasileira no Grupo de Ação
Financeira Internacional – GAFI de 2022 até o momento.
457 Pós-Doutor pela Universidade de Salamanca. Doutor em Direito pela Universi-
dade de Lisboa, Mestre em Direito e Estado e Bacharel em Direito pela Universidade
de Brasília. Ex-Procurador da República, tendo sido, de 2020 a 2022, Secretário
Adjunto de Cooperação Internacional do Ministério Público Federal. Professor e
Advogado, Sócio de Lefosse Advogados
338 10 ANOS DA LEI ANTICORRUPÇÃO AVANÇOS E DESAFIOS
INTRODUÇÃO
A efetiva responsabilização das pessoas jurídicas é questão funda-
mental para o sucesso de qualquer estratégia de combate à corrupção
e à lavagem de dinheiro. A opção do legislador brasileiro pela respon-
sabilização não criminal de pessoas jurídicas, com exceção dos crimes
ambientais, é incomum quando considerado o cenário internacional.458
Essa escolha provoca impactos práticos e desaf‌ios na implementação
da legislação anticorrupção no Brasil, sobretudo nas repercussões das
sanções patrimoniais em casos transnacionais.
Os ativos desviados nos grandes esquemas de corrupção não são
normalmente mantidos no Brasil, e por vezes passam por sof‌isticada
lavagem de dinheiro por meio de extensa rede de contas bancárias em
nome de offshores em paraísos f‌iscais. Nesse contexto, as sanções pa-
trimoniais, cruciais no contexto empresarial, são as mais prejudicadas
na prática da cooperação jurídica internacional na esfera não criminal.
Imagine-se um grande caso de corrupção que envolva o pagamento
de vantagens indevidas (“propinas”) por uma empresa estrangeira no
contexto de um contrato público obtido ilicitamente e que não possua
bens no país lesado. A investigação e a responsabilização dessa pessoa
jurídica - seja ela administrativa, civil ou criminal – demandarão gran-
des esforços de cooperação jurídica internacional formal e informal,
além de considerável sintonia com as autoridades estrangeiras onde
estão situadas as provas, os bens da empresa ou para onde foram diri-
gidos os valores desviados.
Desde a obtenção de provas na fase de investigação, passando pela citação,
implementação de eventuais medidas cautelares patrimoniais e f‌inalizando
na efetiva repatriação de valores ilicitamente desviados, a complexidade e
os obstáculos teóricos e práticos da cooperação jurídica internacional amea-
çam a efetividade do sistema sancionador em escala global.
Tais barreiras são ainda maiores nos procedimentos não criminais.
Vale ainda mencionar que, quanto a eventuais multas patrimoniais ci-
458 A responsabilização não é incompatível com o direito brasileiro, mas, por ora,
houve apenas a opção deliberada pela responsabilização criminal das pessoas jurídi-
cas, conforme art. 225, § 3º, da Constituição Federal: “As condutas e atividades con-
sideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas,
a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os
danos causados”. Compreendemos que essa opção não exclui a possibilidade de que
outras responsabilidades criminais possam ser trazidas por lei ordinária.

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