Gestão de parques urbanos por particulares: o caso da cidade de São Paulo

AutorPatrícia Regina Pinheiro Sampaio, Rômulo Silveira da Rocha Sampaio, Bianca Borges Medeiros Pavão
CargoDoutora e Mestre em Direito pela USP/Doutor em Direito Ambiental pela Pace University/Doutora em Política Públicas e Sustentabilidade pelo Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília (UnB)
Páginas1998-2029
Revista de Direito da Cidade vol. 13, nº 4. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2021.51798
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Revista de Direito da Cidade, vol. 13, nº 4. ISSN 2317-7721. pp.1998-2029 1998
GESTÃO DE PARQUES URBANOS POR PARTICULARES: O CASO DA CIDADE DE SÃO PAULO1
MANAGEMENT OF URBAN PARKS BY PRIVATE PARTIES: THE CASE OF THE CITY OF SÃO PAULO
Patrícia Regina Pinheiro Sampaio2
Rômulo Silveira da Rocha Sampaio3
Bianca Borges Medeiros Pavão4
RESUMO
Os parques urbanos, se bem geridos, constituem espaços que podem influenciar positivamente
diversos aspectos do funcionamento das cidades. Entretanto, diversas cidades já enfrentam ou
preveem dificuldades em garantir os recursos necessários para se cuidar adequadamente desses
espaços. Como consequência, diversos parques urbanos encontram-se deteriorados ou subutilizados.
O presente artigo tem como intuito apresentar exemplos de soluções jurídicas para a transferência,
total ou parcial, da gestão de parques urbanos a particulares, com ou sem finalidade lucrativa. Como
metodologia, utiliza-se a de estudo de casos, abordando-se três parques urbanos localizados no
município de São Paulo, escolhidos por terem sido identificados como os únicos daquele município
que, no m omento em que a pesquisa foi realizada, traziam soluções que compartilhavam iniciativas
1 Os autores agradecem ao Instituto Semeia, na pessoa do seu Diretor Presidente Fernan do Peroni, o apoio à
realização desta pesquisa, por meio das di scussões que permitiram a escolha d os casos a serem estudados,
assim como o acesso a dados e às instituições envolvidas na gestão dos parques analisados. Eventuais erros e
omissões, como de praxe, devem ser atribuídos exclusivamente aos autores.
2 Doutora e Mestre em Direito pela USP. Bacharel em Direito pela PUC -RJ. Pesquisadora do Centro de Pesquisas
em Direito e Economia (CPDE) da FGV DIREITO RIO. Prof essora da FGV DIREITO. Afliação:Fun dação Getulio
Vargas (FGV). Lattes: http://lattes.cnpq.br/2726556686020429. ORCID: h ttps://orcid.org/0000-0002-6072-5324
E-mail:atricia.pinheiro@fgv.br
3 Doutor em Direito Ambiental pela Pace University. Mestre em LL.M. em Direito Ambiental pela Pace
University. Mestre e graduado em Direito pela PUC-PR. Professor da Graduação e do Mestra do em Direito da
Regulação da FGV DIREITO RIO. Professor adjunto na Pace University de Nova York. Professor visitante da
Georgia State University College of Law em Atlanta. Lidera o Grupo de Pesquisa de Direito e Meio Ambiente do
CNPq no âmbito da FGV DIREITO RIO e ainda atua como coordenad or do curso de especialização em Dir eito da
Regulação Ambiental. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Dir eito Ambiental, atuando
principalmente nas seguintes ár eas de sustentabilidade, governança ambiental, mudança climática e direito de
águas. Afliação:Fundação Getulio Vargas (FGV) Lattes: http://lattes.cnpq.br/6567295009605161 ORCID:
https://orcid.org/0000-0001-8009-7815. E-mail: romulo.sampaio@fgv.br
4 Doutora em Política Públicas e Sustentabilidade pelo Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade
de Brasília (UnB). Possui Mestrado em Planejamento e Gestão Ambiental pelo Programa de Pós-Graduação e m
Geografia (UFRJ), especialização em Gestão Ambiental (UFRJ) e Bacharelad o em Geografia (UFRJ). Pesquisadora
no Centro de Pesquisa em Direito e Economia, n o Programa de Direito e Meio Ambiente da FGV Direito Rio.
Afliação:Fundação Getulio Vargas (FGV). Lattes: http://lattes.cnpq.br/4486474790016543 ORCID:
https://orcid.org/0000-0001-8224-9288. E-mail:medeiros.biancab@gmail.com
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estatais e privadas. O est udo permitiu discutir as possibilidades e os desafios presentes nos modelos
de gestão que se baseiam na assunção privada da gestão desses parques, preferencialmente sem a
necessidade de aportes de recursos orçamentários. Como resultados, as experiências estudadas
ilustram que os instrumentos jurídicos desenhados em apoio às cooperações e à delegação da gestão
dos parques podem operar como importantes instrumentos visando garantir a sustentabilidade
financeira e a adequada governança dessas áreas.
Palavras-chave: parques urbanos; bens públicos; gestão por particulares; direito ambiental; direito
urbanístico.
ABSTRACT
The urban parks, if well managed, are spaces that can positively influence diverse aspects of the
functioning of the cities. However, several cities face difficulties raising the funds required to
properly take care of these spaces. As a consequence, several urban parks are deteriorated or
underutilized. This paper discusses possibilities that may rise from the transfer of urban parks’
management to private parties, whether for profit or not. As per the methodology, we chose the
case study of three urban parks located in the city of São Paulo, which were the only ones that
experienced some sort of public-private arrangement at that time. The study allowed us to discuss
the possibilities and challenges present in the management models that are based on the private
assumption of the management of these parks, preferably without the need of budgetary resources.
As a result, the experiences studied have shown that legal instruments designed to support
cooperation and delegation of park management can operate as important instruments to ensure
financial sustainability and adequate governance of these areas.
Keywords: urban parks; public goods; management by private parties; environmental law; urban law.
INTRODUÇÃO
O ano de 2017 foi marcado por uma iniciativa pioneira na gestão de parques urbanos: o
município de São Paulo lançou um Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI) para obter
subsídios para a gestão privada de quatorze parques públicos urbanos. A iniciativa partiu da
constatação de que há profunda dificuldade em se despender recursos orçamentários para este fim:
em que pese o custo da gestão dos parques urbanos ser, em tese, pouco significativo em termos de
percentual sobre o orçamento total de um município, a realidade é que a maioria das cidades
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brasileiras convive com mais demandas do que aquelas que é capaz de suportar (FIRJAN apud
SILVEIRA, 2019)5.
A Constituição Federal atribui a municípios uma plêiade de políticas públicas que disputam
verbas orçamentárias, como educação, saúde, saneamento e o meio ambiente urbano. Essa
concorrência por recursos em áreas bastante sensíveis frequentemente relega a um segundo plano
de hierarquia o investimento com a criação e a manutenção de áreas verdes urbanas. Viabilizar
financeira e juridicamente esses espaços passa a ser fundamental para que possam continuar a
produzir externalidades positivas e, sobretudo, evitar que sejam fontes de externalidades negativas.
A cidade de São Paulo deu um passo importante na tentativa de testar modelo alternativo à
dependência exclusiva do orçamento municipal para viabilizar a gestão de parques urbanos. A
proposta de São Paulo residiu em pedir à iniciativa privada e à sociedade civil que se habilitassem ao
fornecimento de estudos que, caso julgados viáveis pelo ó rgão competente municipal, a Secretaria
Municipal do Verde e do Meio Ambiente (“Secretaria do Verde”), poderiam vir a ser licitados e
contratados com a iniciativa privada, ou ser, alternativamente, objeto de parcerias.
Premissa básica do chamamento consistiu na gratuidade do acesso. Os projetos não
poderiam contemplar cobrança por ingresso no parque. A receita teria de vir da exploração de
atividades acessórias e de espaços no interior dos parques (como estacionamento, quiosques e
restaurantes). O chamamento também mencionava que a municipalidade daria preferência a
modelagens econômico-financeiras que dispensassem o aporte de recursos públicos para a
manutenção dos parques: assim , projetos de concessões comuns aparentemente seriam priorizados
em detrimento, por exemplo, de parcerias público-privadas que previssem pagamento de
contraprestação pecuniária pública. Dez agentes se pré-qualificaram para participar do processo,
sendo sete deles com finalidade lucrativa; duas instituições sem finalidade lucrativa; e uma pessoa
física.
A primeira razão para a reduzida participação privada no investimento em parques urbanos
reside em ser esta situação uma consequência da sua natureza de bem público (em sentido
econômico): as externalidades geradas pelos parques urbanos são muito superiores ao retorno que
investidores são capazes de se apropriar individualmente com sua exploração.6 Dessa forma, na
ausência de regulação estatal, sua provisão pelo mercado será subótima, ou seja, aquém do
5 O índice Firjan de Gestão Fiscal 2019 (ano-base 2018), após analisar 5337 municíp ios, informa que “40,5% têm
situação crítica, 33,4% difícil, 22,1% boa, e apenas 4% obtiveram excelência na gestão fiscal”. 34,8% dessas
entidades não se sustentam, não gerando receita capaz de cobrir sua estrutura administrativa (SILVEIRA, 2019).
6 “Parks are public goods which in many countries are commonly maintained and preserved with public fund.”
((FEINERMAN et al., 2004, p. 370).

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