Hermenêutica jurídica e as lacunas do legislador ante a falta de procedimentalização das normas

AutorAntonio Baptista Gonçalves
Páginas77-110
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CAPÍTULO 2
HERMENÊUTICA JURÍDICA E AS LACUNAS
DO LEGISLADOR ANTE A FALTA DE
PROCEDIMENTALIZAÇÃO DAS NORMAS
2.1 Introdução
Hermenêutica é a ciência que estuda e interpreta a lin-
guagem. Esta pode ser falada, escrita ou representada por
símbolos e signos. Cabe à hermenêutica a compreensão des-
ses signos para aproximar o receptor da intenção do emissor
ao conceber a mensagem.
Na realidade do Direito, cabe à hermenêutica a interpre-
tação das leis, normas de convívio social em relação à própria
sociedade para, assim, aproximar os membros do povo daque-
les que elaboram as normas.
A hermenêutica jurídica é um instrumento muito usado
em consonância com o positivismo jurídico e consiste na arte
de interpretar, porém que deve evoluir e se adequar ao pós-
positivismo e aos problemas de um legislador que nem sem-
pre se faz claro, ou ainda pior, cria normas sem procedimento,
com vagueza e lacunas.
É função da hermenêutica estabelecer os caminhos para
que a objetividade possa imperar em detrimento da subjetivi-
dade e, assim, que o juiz não crie soluções ou entendimentos
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ANTONIO BAPTISTA GONÇALVES
próprios que sejam contrários à própria norma ou ao espírito
da mesma.
Para chegarmos ao nosso intento teremos de analisar al-
gumas questões acerca do positivismo jurídico e seus proble-
mas com a zona de penumbra, e como que a hermenêutica se
aplica ante a falta de uma procedimentalização adequada.
No entanto, não podemos esquecer do papel fundamen-
tal da hermenêutica: manter vivo o próprio direito, uma vez
que este usa da interpretação para viver e, também, para se
manter vivo, uma vez que não sendo mais compreendido sua
função social perecerá.
2.2 Conceito de hermenêutica
De Plácido e Silva:191
Do latim hermenêutica
192
(que interpreta ou que explica), é em-
pregado na técnica jurídica para assinalar o meio ou modo por
que se devem interpretar as leis, a fim de que se tenha delas o
exato sentido ou o fiel pensamento do legislador.
Tercio Sampaio Ferraz Jr.:
O termo “hermenêutica” significa declarar, interpretar ou escla-
recer e por último, traduzir.
193
191. SILVA, De Plácido e. Dicionário Jurídico Conciso. Rio de Janeiro: Forense,
2008, p. 387.
192. Willis Santiago Guerra Filho desenvolve um caminho histórico para a herme-
nêutica jurídica: “A hermenêutica aparece como uma tradição filosófica extrema-
mente antiga, que remonta aos gregos, mantida viva em disciplinas outrora de im-
portância capital, como a teologia, com a tentativa de se desenvolver uma
metodologia específica das chamadas ciências humanas diversa daquela das ciên-
cias naturais, ao que se associam nomes como os de Wilhelm Dilthey e Max Weber.
A hermenêutica vem a ocupar um lugar central no pensamento de filósofos contem-
porâneos, como Heidegger e, principalmente, seu discípulo H. G. Gadamer, ou o fi-
lósofo francês Paul Ricouer, bem como em concepções epistemológicas “pós-mo-
dernas”, a exemplo daquela apresentada pelo português Boaventura de Sousa
Santos, sociólogo de direito, em obra recente”. GUERRA FILHO, Willis Santiago.
Teoria da ciência jurídica. São Paulo: Saraiva, 2001, págs. 20 e 21.
193. FERRAZ JÚNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito – técni-
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HERMENÊUTICA E A LINGUAGEM
Carlos Maximiliano:
A Hermenêutica jurídica tem por objeto o estudo e a sistema-
tização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o
alcance das expressões do Direito.
194
Vicente Ráo:195
A hermenêutica tem como objetivo investigar e coordenar por
modo sistemático os princípios científicos e leis decorrentes, que
disciplinam a apuração do conteúdo, no sentido e nos fins das
normas jurídicas e a restauração do conceito orgânico do direito,
para o efeito de sua aplicação.
Pode parecer um tanto quanto contraditório, afinal, é ne-
cessário existir uma técnica que aponte um caminho a ser se-
guido para determinar o pensamento do legislador?
Já deveria ser função do legislador criar as normas ju-
rídicas que sejam claras e aplicáveis. Contudo, na prática, o
que se observa é exatamente o contrário: normas sem proce-
dimentos, com ausência de clareza e com margens a várias
interpretações.
No entanto, o mau uso da linguagem, com sentenças
redigidas com sentidos incompletos, dúbios ou contraditó-
rios dificultam a aplicação das normas jurídicas inseridas no
ordenamento.
Logo, a hermenêutica cumpre o papel de evitar que o apli-
cador da norma, o magistrado, crie elementos subjetivos tanto
de entendimento e compreensão como de aplicabilidade. Em
geral se considera a hermenêutica como a ciência da inter-
pretação, que trabalha com métodos que lhe são particulares.
ca, decisão, dominação. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 268.
194. MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 19. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2010, p. 1.
195. RÁO, Vicente. O direito e a vida dos direitos. 6. ed. Anotada e atualizada por
Sandoval, Ovídio Rocha Barros. São Paulo: RT, 2005, p. 486.

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