Impactos econômicos colaterais ao agronegócio brasileiro em razão das políticas externas norte-americanas contra o irã e o uso de lawfare na guerra econômica internacional

AutorMarcos Cordeiro Pires - Ubirajara Garcia Ferreira Tamarindo
CargoLivre-docente em Economia Política Internacional pela UNESP - Doutorando na linha de Relações Internacionais e Desenvolvimento do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UNESP
Páginas295-331
295
Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.18 n.41 p.295-331 Maio/Agosto de 2021
IMPACTOS ECONÔMICOS COLATERAIS AO
AGRONEGÓCIO BRASILEIRO EM RAZÃO
DAS POLÍTICAS EXTERNAS
NORTE-AMERICANAS CONTRA O IRÃ E O
USO DE LAWFARE NA GUERRA ECONÔMICA
INTERNACIONAL
Marcos Cordeiro Pires1
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP)
Ubirajara Garcia Ferreira Tamarindo2
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP)
RESUMO
Em um incidente diplomático sem precedentes, em julho de 2019 a
República Islâmica do ameaçou cortar todas as relações comerciais com
o Brasil caso não houvesse o abastecimento de seus navios, Bavand e
Termeh, que estavam atracados no porto de Paranaguá-PR, carregados
com toneladas de milho brasileiro destinados à exportação, e que não
foram abastecidos pela Petrobras temendo sanções econômicas por parte
dos Estados Unidos, que retaliam economicamente os iranianos. Nesse
contexto, embora Brasil e Irã não tenham histórico de disputas, esse
episódio demonstrou como a política externa dos Estados Unidos tem
potencial de prejudicar os interesses do agronegócio brasileiro, setor
econômico que atualmente mais exporta e gera superavit na balança de
pagamentos do País. Portanto, este artigo, conduzido por uma abordagem
qualitativa e de revisão bibliográca e documental, examinou, a partir de
1 Livre-docente em Economia Política Internacional pela UNESP. Doutor e Mestre em História
Econômica e graduado em História pela Universidade de São Paulo (USP). Professor nos cursos
de graduação em Relações Internacionais e pós-graduação em Ciências Sociais da Faculdade de
Filosoa e Ciências da UNESP. Professor no Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais
“San Tiago Dantas” (UNESP/PUC-SP/UNICAMP). Membro da diretoria do Instituto Confúcio, da
UNESP. Coordenador do Instituto de Estudos Econômicos e Internacionais e pesquisador do Instituto
Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU). ORCID:
https://orcid.org/0000-0001-9668-2664 / e-mail: marcos.cordeiro@unesp.br
2 Doutorando na linha de Relações Internacionais e Desenvolvimento do Programa de Pós-Graduação
em Ciências Sociais da UNESP. Mestre em Agronegócio e Desenvolvimento pela UNESP. Especialista
em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET-SP). Master of business
Administration (MBA) em Gestão Tributária pela FEA/USP. Pós-graduado em Direito Tributário pelo
Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Pós-graduado em Direito Tributário pela Fundação
Getúlio Vargas (FGV). Pós-graduado em Processo Tributário pelo pelo Instituto Brasileiro de Estudos
Tributários (IBET-SP). Pós-graduado em Tributação do Agronegócio pela FGV-SP. Advogado.
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8346-2782 / e-mail: ubirajara.tamarindo@unesp.br
http://dx.doi.org/10.18623/rvd.v18i41.1909
IMPACTOS ECONÔMICOS COLATERAIS AO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO EM RAZÃO DAS POLÍTICAS...
296 Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.18 n.41 p.295-331 Maio/Agosto de 2021
um incidente diplomático entre o Brasil e o Irã, as razões geopolíticas do
conito existente entre iranianos e norte-americanos, e, ainda, como o
uso do lawfare, especialmente pelos órgãos U.S. Department of Justice
e Federal Bureau of Investigation, como instrumento de política externa
na guerra comercial e geopolítica contra países, empresas, organizações
internacionais e até mesmo pessoas, pode impactar colateralmente os
interesses econômicos do agronegócio brasileiro.
Palavras-chave: agronegócio brasileiro; Estados Unidos; impactos; Irã;
sanções econômicas.
ECONOMIC IMPACTS ON BRAZILIAN AGRIBUSINESS DUE
TO NORTH AMERICAN FOREIGN POLICIES AGAINST IRAN
AND THE USE OF LAWFARE IN THE INTERNATIONAL
ECONOMIC WAR
ABSTRACT
In an unprecedented diplomatic incident, in July 2019 the Islamic Republic
of threatened to cut o all trade relations with Brazil if there was no
supply of its ships, Bavand and Termeh, which were berthed at the port of
Paranaguá-PR, loaded with tons of Brazilian corn destined for export, and
which were not supplied by Petrobras fearing economic sanctions by the
United States, which would retaliate economically against the Iranians.
In this context, although Brazil and Iran have no history of disputes,
this episode demonstrated how the US foreign policy has the potential
to harm the interests of Brazilian agribusiness, an economic sector
that currently exports the most and generates a surplus in the country’s
balance of payments. , this article, conducted by a qualitative approach
and bibliographic and documentary review, examined, from a diplomatic
incident between Brazil and Iran, the geopolitical reasons for the conict
between Iranians and North Americans, and also how the The use of
lawfare, especially by the US Department of Justice and Federal Bureau
of Investigation, as an instrument of foreign policy in the commercial and
geopolitical war against countries, companies, international organizations
and individuals, can collaterally impact the economic interests of Brazilian
agribusiness.
Keywords: Brazilian agribusiness; economic sanctions; impacts; Iran;
U.S.
Marcos Cordeiro Pires & Ubirajara Garcia Ferreira Tamarindo
297
Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.18 n.41 p.295-331 Maio/Agosto de 2021
INTRODUÇÃO
Em julho de 2019, a Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras), temendo
sanções econômicas por parte dos Estados Unidos, recusou-se a abastecer
os navios cargueiros iranianos Bavand e Termeh, que estavam atracados no
porto paranaense de Paranaguá, carregados com toneladas de milho brasi-
leiro destinados à exportação, visto que tanto a proprietária das embarca-
ções quanto a operadora marítima, iranianas, fazem parte de uma lista de
sancionados econômicos imposta unilateralmente pelo governo norte-ame-
ricano à República Islâmica do Irã.
Como retaliação, o governo iraniano, em um incidente sem preceden-
tes na história dos países, ameaçou cortar todas as relações comerciais com
o Brasil caso não houvesse o abastecimento de seus navios e, por conse-
quência, eventual adesão de Brasília ao embargo econômico norte-ameri-
cano.
Sem perquirir o acerto ou desacerto das sanções lideradas ou impostas
unilateralmente pelo governo norte-americano, até porque este não é o ob-
jetivo do presente trabalho, é fato que o Irã, assim como, o próprio merca-
do muçulmano de maneira geral, são importantes compradores de produtos
agropecuários brasileiros, e a política externa dos Estados Unidos, de iso-
lar nanceira e comercialmente países, empresas e pessoas desalinhados
com seus interesses, como é o caso dos iranianos, traz, como efeito colate-
ral, ameaças de prejuízos concretos ao agronegócio brasileiro, atualmente
principal exportador e gerador de superavit da economia nacional.
De fato, o agronegócio constitui, na atualidade, a base econômica
de muitos estados e municípios brasileiros, possibilitando a produção de
alimentos não somente para suprir as necessidades internas, mas também
para gerar excedentes destinados às exportações. Não por acaso, o Brasil é,
atualmente, o maior exportador mundial de açúcar (48%), café (27%), suco
de laranja (76%), soja em grãos (43%), carne bovina (20%) e de frango
(42%); o segundo maior de milho (20%), de óleo (12%) e de farelo de soja
(22%). É, ainda, o maior produtor mundial também de açúcar, café e suco
de laranja; o primeiro na produção de soja em grãos, o segundo de carnes
bovina e de frango e o terceiro na produção mundial de milho.
Além disso, em 2020 as exportações do setor alcançaram a cifra de
US$ 100,80 bilhões, alta de 6,77% em relação a 2019 (R$ 96.85 bilhões), e
superavit de US$ 87,76 bilhões, representando, por si, 48% de todo o fatu-
ramento brasileiro no mercado externo. As importações do setor totalizaram

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT