Inter-relação entre direito e alimentação: percepções de consumidores sobre seus direitos

AutorCecilia Maria Resende Gonçalves de Carvalho, Danley Dênis da Silva, José Guilherme Campos Teles, Marco Aurélio Araújo Campelo, Martha Teresa Siqueira Marques Melo
CargoUniversidade Federal do Piauí ? Campus Ministro Petrônio Portela. Teresina/PI, Brasil.
Páginas1-16
1
R. Dir. sanit., São Paulo v.22n2, e0009, 2022
https://doi.org/10.11606/issn.2316-9044.rdisan.2022.171479
Artigo Original
http://revistas.usp.br/rdisan
RESUMO
A concretização do direito à alimentação saudável
implica a necessidade de pesquisas acerca de
mecanismos que favoreçam a construção
de uma cultura apta a reforçar a adoção de
atitudes positivas em prol dessa conquista.
A presente pesquisa analisou o conhecimento
acerca de direitos fundamentais/consumeristas,
identificando aspectos relacionados às práticas
alimentares cotidianas do consumidor de
alimentos em restaurantes de um mercado
público. Tratou-se de pesquisa qualitativa, com
notas de observação em diário de campo e
roteiro de entrevista. Na análise das narrativas,
foi produzido o mapa analítico que entrelaçou
as falas dos parti cipantes com as categorias mais
relevantes: direitos e alimentação; disponibilida de
de informações; exigência de informações pelo
consumidor; desistência do consumo devido
às condições do local. Observou-se que os
entrevistados apresentaram desconhecimento
sobre os direitos relacionados à alimentação.
Tempo, preço, sabor, praticidade e higiene foram
valores destacados nas narrativas, porém, não
se mostrou compromisso em publicizar dados
importantes so bre produtos e serviços ofe recidos
nos restaurantes. A compreensão dos resultados
aponta a necessidade de uma educação em
direito à segurança alimentar e nutricional
na cadeia de produção e comercialização de
alimentos, uma vez que a alimentação precisa
ser pensada de mod o multidimensional.
Palavras-Chave: Direito à Alimentação;
Comportamento do Consumidor; Segurança
Alimentar; Serviços de Alimentação.
ABSTRACT
The realization of the r ight to healthy eating implies
the need for research on mechanisms that favor
the construc tion of a culture capable of reinforcing
the adoption of positive attitudes in favor of this
achievement. This research an alyzed the knowledge
about fundamental rights/consumers, identifying
aspects rela ted to the daily eating practices of the
food consumer in restaurants in a public market.
It is a qualitative research, with observation notes
in a field diary and an interview script. In the
analysis of the narratives, an analytical map was
produced that intertwined the speeches of the
participants (3 men and 2 women) with the most
relevant categorie s: rights and food; availability of
information; consumer demand for information;
consumer demand for information; withdrawal
from consumption due to local conditions. It was
observed that with regard to knowle dge of law
related to food, the inter viewees showed ignor ance.
Time, price, flavor, practicality and hygiene were
values highlighted in the showed ignorance.
Time, price, flavor, practicality and hygiene were
values highlighted in the narratives, but there is
no commitment to publicize impo rtant data about
products and showe d ignorance. Time, price, flavor,
practicality and hygiene were values highlighted
in the narratives, but there is no commitment to
publicize important data about products and
services offered in restaurants. Understanding the
results shows the ne ed for education in the right to
food and nutrition se curity in the food production
and marketing chain, since food needs to be
thought of in a multidimension al way.
Keywords: Right to Food; Consumer Behav ior;
Food Security; Food Services.
Cecilia Maria Resende Gonçalves de Carvalho1
https://orcid.org/0000-0002-8707-1447
Danley Dênis da Silva1
https://orcid.org/0000-0002-1058-7891
José Guilherme Campos Teles1
https://orcid.org/0000-0001-5421-4125
Marco Aurélio Araújo Campelo1
https://orcid.org/0000-0002-9563-4780
Martha Teresa Siqueira Marques Melo1
https://orcid.org/0000-0002-5858-9298
1 Universidade Federal do Piauí – Campus Ministro Petrônio Portela. Teresina/PI, Brasil.
Correspondência:
Cecilia Maria Resende Gonçalves
de Carvalho
ceciliamaria.pop@hotmail.com
Recebido: 25/06/2020
Revisado: 09/07/2021
Aprovado: 23/09/2021
Conito de interesses:
Os autores declaram não haver
conflito de interesses.
Contribuição dos autores:
Danley Dênis da Silva executou
a pesquisa e contribuiu para
a elaboração do artigo. José
Guilherme Campos Teles e
Marco Aurélio Araújo Campelo
auxiliaram na pesquisa de campo
e na análise dos dados. Martha
Teresa Siqueira Marques Melo
formulou o desenho, desenvolveu
a pesquisa e a escrita do artigo.
Cecilia Maria Resende Gonçalves
de Carvalho coordenou a
pesquisa, orientou os alunos e
revisou criticamente o artigo.
Copyright: Esta licença permite
que outros remixem, adaptem
e criem a partir do seu trabalho
para fins não comerciais, desde
que atribuam a você o devido
crédito e que licenciem as novas
criações sob termos idênticos.
Inter-relação entre direito e
alimentação: percepções de
consumidores sobre seus direitos
Interrelations between law and food: consumer perceptions of
their rights
2
Inter-relação entre direito e alimentação: percepções de consumidores sobre seus direitos
Carvalho C. M. R. G., Silva D. D., Teles J. G. C., Campelo M. A. A., Melo M. T. S. M.
R. Dir. sanit., São Paulo v.22n2, e0009, 2022
Introdução
A alimentação é uma prática complexa, que abrange ricos significados pessoal, social,
cultural, psicológico e político. Conforme salienta Poulain (2016) , o passadio é um
tema multidimensional por excelência: universal e particular ao mesmo tempo, é prática
experimentada cotidiana e ritualmente por todas as pessoas.
Para viver, os seres humanos, independentemente de suas diferenças morfológicas ou
etárias, precisam se alimentar. Entretanto, antes de tudo, comer é um ato sociocultural
alicerçado em significados e que agrega pessoas, rima o cotidiano, marca os
momentos festivos, requer conhecimentos técnicos para a preparação das receitas
e exige cuidados para a manipulação e o cozimento dos alimentos. Desse modo, as
acepções da alimentação para as pessoas não podem ser compreendidas apenas por
meio de parâmetros nutricionais e biológicos (MULLER; AMAR AL; REMOR, 2010). A
fome biológica distingue-se dos apetites, dos anseios humanos, do contentamento
proporcionado pelo ato de levar o alimento à boca (comer), pois se consolida em
atitudes, hábitos, costumes, rituais e etiquetas (CARNEIRO, 2017).
À luz do pensamento de Bourdieu (2013), o capital cultural influencia de modo marcante
o estilo próprio e similar com que cada grupo consome seus alimentos. Certamente,
o momento da refeição é repleto de associações sensoriais complexas, e o indivíduo
pode evidenciar dificuldades, satisfação ou insatisfação nas experiências vivenciadas
com a comida (NADON et al, 2011; LU et al., 2016). Nesse contexto, pode-se pensar
que a alimentação, em um sentido mais amplo, é capaz de estabelecer vinculação
entre os aspectos natural, emocional, social e político, bem como marcar identidades
e estilos individuais ou coletivos (ALMEIDA, 2017).
De fato, a produção e a transformação das matérias-primas em alimentos são marcadas
pela diversidade e ancoradas no meio ambiente: há uma variação quase infinita nos
ingredientes utilizados nos preparos, nas técnicas de corte ou de cozimento e no uso
de condimentos, o que torna a comida um dos principais marcadores de diferenças.
Comer e beber são atos sociais que produzem modelos identitários contrastados;
revelam desigualdades ou reforçam laços sociais; implicam uma reciprocidade quase
imediata de bens, favores e obrigações (POULAIN, 2016).
Do ponto de vista propriamente jurídico – o qual constitui a abordagem predominante
deste texto –, não resta dúvida de que a promoção de conhecimentos sobre o direito à
alimentação é prevista no artigo 6º da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988);
esse direito deve ser ressaltado e bem explorado ao lado dos demais direitos sociais,
uma vez que somente por meio da cognição responsável é possível gozarmos com
plenitude daquilo que nos é garantido por lei.
No entanto, apesar da importante consagração constitucional, a alimentação adequada
é pouco reconhecida como direito, o que representa um grande desafio para o
processo político nacional (ALCANTARA, 2014; ALIAGA; SANTOS; BOMFIM, 2019).
Sem conhecimento, os meios de exigibilidade disponíveis aos titulares de direitos são
lançados no vazio (LEÃO, 2013).
Nesta análise, é fundamental perceber que a concretização do direito à alimentação
implica a discussão do tema e a necessidade de debates e pesquisas acerca de
mecanismos que favoreçam a construção de uma cultura apta a reforçar a adoção de
atitudes positivas em prol dessa conquista.
A alimentação é uma das necessidades mais básicas do ser humano e trata-se de
um direito inalienável e intrínseco à condição humana, portanto imprescindível para
a realização dos outros direitos sociais consagrados constitucionalmente, incluindo
também as noções de segurança alimentar e nutricional (MARTINS, 2018; ROSENDO;
KIHNEN, 2019). Salienta-se, assim, a necessidade de pensar e refletir sobre a questão

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