Introdução

AutorFelipe Kirchner
PáginasXXIII-XXXVIII
Introdução
É difícil identificar a gênese histórica da conexidade, em face
da amplitude e da heterogeneidade dos casos possíveis de vincula-
ção contratual coligada. Contudo é possível reconhecer que se tra-
ta de uma técnica conformada primariamente pela doutrina1 e sur-
gida no âmbito empresarial, e que posteriormente tem reconheci-
mento jurisprudencial e se alastra para outros campos do Direito,
em especial do privado.2
O tema da coligação não é essencialmente novo,3 uma vez que
sua utilização prática e concepção teórica surgiram no início do sé-
culo XX, se consolidando em razão da necessidade de readaptação
dos tipos e das estruturas contratuais a novas realidades econômi-
1
1 A doutrina foi a primeira fonte do Direito a se preocupar com a estrutu-
ração e a conformação da categoria. A jurisprudência e a lei não apenas se
debruçam posteriormente sobre o tema, como o fazem de forma tímida na
maioria dos sistemas jurídicos (MARINO, 2010, p. 43).
2 KONDER, 2011. p. 317; MARINO, 2010, p. 1-2.
3 Refere Marques que a novidade não está centrada na categoria jurídica e
nem diz com tipologias contratuais, pois advém da relevância da conexão de
contratos no contexto atual, onde a realidade econômica fomenta serviços
complexos que se tornam socialmente essenciais e demandam o repensar de
sua disciplina jurídica (MARQUES, 2002. p. 80). Em outra passagem a
autora refere que “na sociedade moderna por vezes as relações contratuais
são tão conexas, essenciais, interdependentes e complexas que é impossível
distingui-las, realizar uma sem a outra, deixar de realizá-las ou separá-las”
(MARQUES, 2004. p. 63). É consenso na doutrina a importância da conexi-
dade perante a realidade negocial e a teoria do direito, em especial pela
complexidade do tema e pela modificação paradigmática por ele promovida
na concepção clássica de contrato (WALD, 2010, p. 272; BODIN DE MO-
RAES, 2006, p. I).
cas e negociais, perante as quais o esquema clássico de organização
contratual não apresentava soluções suficientes.4
A conexidade traz inúmeros benefícios aos contratantes coliga-
dos – em relações jurídicas de natureza civil, empresarial ou consu-
merista5 –, constituindo-se, por vezes, em um verdadeiro impera-
tivo às partes, que não têm outra opção senão contratar de forma
coligada, tanto porque em muitas situações o negócio sequer exis-
tiria sem uma estruturação contratual por conexidade (v.g. plano
de saúde, cartão de crédito, franquia e shopping center), quanto
pela insuficiência das figuras típicas existentes.6 Tamanha é a im-
portância da conexidade perante a economia contemporânea que a
doutrina chega a identificar a coligação contratual como sendo uma
nova modalidade de desenvolvimento empresarial7 e de consumo.
O fenômeno da conexidade é fruto da hipercomplexidade das rela-
ções socioeconômicas,8 da especialização e da sofisticação que faz
nascerem novas necessidades econômicas, tais como a abrangência
pelo contrato de um maior número de obrigações e partes integran-
tes nos negócios.9
2
4 MARINO, 2010, p. XIII, 1-2 116-117; BAGGIO TORRES, 2007. p.
67-68; FERNANDES, 2014. p. 205-206; REBAZA, 2013, p. 12.
5 LORENZETTI, 1998b. p. 23; LORENZETTI, 1999a. p. 162.
6 LORENZETTI, 2007, p. 182-183.
7 Refere Leonardo que a coligação se constitui em “um meio de atuação
diverso daquele promovido pela união de esforços e recursos em sociedades
que, tradicionalmente, constituem o principal núcleo para o desenvolvimen-
to da atividade empresarial” (LEONARDO, 2013b, p. 5).
8 TARTUCE, 2012, p. 1; FAJNGOLD, 2019, p. 364.
9 A doutrina apresenta diversas causas para a expansão do fenômeno da
coligação contratual, cabendo aqui efetivar uma enumeração não taxativa: (i)
condicionantes da pós-modernidade nos contratos; (ii) globalização dos ne-
gócios; (iii) expansão do crédito; (iv) racionalização e especialização das
tarefas produtivas; (v) divisão do trabalho; (vi) diminuição dos custos (de
produção e distribuição de produtos e serviços); (vii) diluição dos riscos;
(viii) aumento da eficiência (de consumo e de produção e circulação de bens
e serviços); (ix) potencialização de benefícios; (x) potencialização da colabo-
ração entre contratantes; (xi) ampliação do setor geográfico de atividades
comerciais; (xii) necessidade de transporte de bens e insumos a longas dis-
tâncias; (xiii) existência e sobrevivência de organizações no mercado concor-
rencial; (xiv) melhoria do atendimento das demandas de mercado; (xv)
incremento das relações jurídicas imateriais e incorpóreas pela via digital

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT