Introdução: por que estudar precedentes? Precisamos de referências práticas? Para que investigar o common law?

AutorCesar Zucatti Pritsch
Ocupação do AutorJuiz do Trabalho na 4ª Região/RS e Juris Doctor pela Florida International University (FIU)
Páginas17-19
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1. INTRODUÇÃO:
POR QUE ESTUDAR PRECEDENTES?
PRECISAMOS DE REFERÊNCIAS PRÁTICAS?
PARA QUE INVESTIGAR O COMMON LAW?
Nos últim os anos tem aumentado de forma exponencial o interesse do operador do
direito brasileiro pela instituição de técnicas que permitam a estabilização e uniformização
de jurisprudência, dada a explosão de litigiosidade e massificação dos recursos, em contraste
com a incapacidade do Judiciário — dentro das regras processuais até então vigentes — para
absorver no mesmo ritmo o vertiginoso crescimento da demanda.
Embora a jurisprudência dos tribunais, notadamente dos superiores, sempre tenha sido
observada de forma persuasiva, efetivamente dando um norte para a interpretação de uma
determinada questão de direito nas instâncias inferiores, a falta de efeito vinculante ensejava
contínua e resistente divergência de muitos juízes e tribunais, amparados na democrática
garantia da independência funcional. Antagonistas dos precedentes vinculantes argumentam
que o juiz decidir conforme sua própria interpretação da lei, ainda que divergindo daquela já
firmada em instâncias superiores, é faculdade necessária à oxigenação jurisprudencial bem
como para evitar excessiva concentração de poder em mãos de poucos juízes da cúpula. No
entanto, a evolução legislativa das últimas duas décadas, culminando com a edição do Código
de Processo Civil de 2015, mostra a opção do legislador no sentido de que o Judiciário possa
unificar seus entendimentos, em algum momento dando-lhes a palavra final, visando à segu-
rança jurídica, pacificação social, estabilidade das relações e desestímulo à litigiosidade.(1)
Para atingir tal desiderato, os proponentes do CPC 2015 buscaram inspiração no direi-
to comparado, notadamente nas técnicas de precedentes vinculantes típicas dos sistemas
jurídicos anglo-saxões ou de common law.(2) A “evolucionária”(3) introdução de técnicas de pre-
cedente vinculante no Código de Processo Civil de 2015, de inspiração nos sistemas jurídicos
de common law, leva o Brasil a uma situação híbrida ou intermediária entre tal tradição e a do
direito romano-germânico. Onde chegaremos com tal inovação é uma incógnita. Chegaremos
à efetiva estabilização da jurisprudência? Chegaremos a uma racionalização da quantidade
e qualidade dos recursos? Haverá maior respeito ao trabalho do primeiro grau de jurisdição,
prejudicado pela quantidade de incidentes, requerimentos e recursos que exploram a disper-
são da jurisprudência? Conseguirão os juízes, através da fixação de precedentes desenvolvidos
em casos concretos, auxiliarem na evolução e aprimorarem o direito? A experiência de um
país em que a vinculação a precedentes já funciona há séculos pode ser útil para que se possa
compreender ou antever os efeitos de tal inovação no Brasil.
Embora o texto finalmente veiculado em nosso codex processual seja bastante diferente
da praxe processual da tradição anglo-saxã, é nítida a importação de alguns de seus institu-
tos, como a vinculação aos fundamentos determinantes (ratio decidendi / holding) de um
(1) Ver, de forma geral, Exposição de Motivos, Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil. Disponível em:
<http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/anteprojeto.pdf>. Acesso em: 21 out. 2017.
(2) Especificamente no processo do trabalho, além da aplicação subsidiária e supletiva das regras do CPC, foram
introduzidas regras próprias para os recursos de revista repetitivos e uniformização de jurisprudência, posteriormente
alteradas pela Reforma Trabalhista de 2017, que revogou a referência ao regramento de uniformização de
jurisprudência do CPC de 1973 e detalhou os critérios de transcendência para a admissibilidade dos recursos de revista.
(3) Evolucionária, e não revolucionária, já que a introdução limitada de técnicas do common law apenas solidifica
uma tendência de fortificação da jurisprudência dos tribunais que já se tentava implantar há décadas.

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