Entre jalecos e togas: um ensaio sobre Ciências, Desastres e Processo. O que o jurista tem a ver com isso?

AutorHermes Zaneti Junior, Diego Pereira
CargoAssessor na Presidência da República com atuação na Assessoria Jurídica para Assuntos Jurídicos. Procurador Federal/AGU. Doutorando em Direito Constitucional pela Universidade de Brasília/UNB com período de visitação na Universidade de Salamanca/Espanha. / Possui Pós-Doutorado em Direito pela Università degli Studi di Torino (2014). Doutorado...
ENTRE JALECOS E TOGAS: UM ENSAIO SOBRE CIÊNCIAS, DESASTRES E PROCESSO. O
QUE O JURISTA TEM A VER COM ISSO?
BETWEEN JALECOS AND TOGAS: AN ESSAY ON SCIENCES, DISASTERS AND PROCESS. WHAT
DOES THE JURIST HAVE TO DO WITH THIS?
DOI:
Diego Pereira
Assessor na Presidência da República com atuação na
Assessoria Jurídica para Assuntos Jurídicos. Procurador
Federal/AGU. Doutorando em Direito Constitucional pela
Universidade de Brasília/UNB com período de visitação
na Universidade de Salamanca/Espanha.
EMAIL: diegopereiradireito@hotmail.com
LATTES: http://lattes.cnpq.br/2609737408214683
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3706-6313
Hermes Zaneti Junior
Possui Pós-Doutorado em Direito pela Università degli
Studi di Torino (2014). Doutorado em Direito pela
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2005),
área de concentração Direito Processual.
EMAIL: hermeszanetijr@gmail.com
LATTES: http://lattes.cnpq.br/5343355826023519
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6461-6742
RESUMO: Este artigo coloca em discussão o papel das ciências jurídicas em um cenário de
busca pela verdade em contextos de recorrentes desastres. Se as ciências têm um papel
fundamental no esclarecimento da ocorrência de tais eventos, o posicionamento do direito
não é diferente, especialmente porque é sua responsabilidade o fortalecimento dos direitos
humanos, sempre ameaçados e em constante luta social por afirmação e reconhecimento. O
trabalho se baseou em uma leitura crítica das perspectivas de epistemologia e de ciência
delineadas por Bruno Latour, que mergulhou em laboratórios de ciências duras tentando
compreender o caminhar dos cientistas em busca da verdade. A partir disso, traçou-se como
objetivo aqui lançar algumas provocações no sentido de pensar como o d  
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uma perspectiva mais ampla e revisitada, aliar-se a outras ciências para dar conta das
demandas contemporâneas provocadas por desastres globais, c omo a pandemia de covid-19
que assolou o Brasil e o mundo nos últimos dois anos. Não pretendemos com essas discussões
esgotar o debate, tão pou co apresentar respostas definitivas para problemas dessa ordem,
mas sim, pensarmos juntos uma aproximação entre a    
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dos problemas ambientais e reduzir as injustiças que acometem, sobretudo, as camadas
sociais mais vulneráveis. Consoante ao pensamento dos autores que apresentamos neste
artigo, compreende-se que respeitados os limites de cada área do conhecimento e
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sentido coletivo de manutenção harmônica da vida.
PALAVRAS-CHAVE: C V  D D N
ABSTRACT: This article discusses the role of l egal sciences in a search for truth in contexts of
recurrent disasters. If the sciences play a fundamental role i n clarifying the occurrence of such
events, the position of law is no different, especially since it is their responsibility to strengthen
human rights, which are always threatened and in constant social struggle for declaration and
recognition. The work is based on a critical reading of the perspectives of epistemology and
science outlined by Bruno Latour, who immersed hi mself in hard science laboratories trying to
understand the journey of scientists in search of the truth. From this, the objective here was to
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scenario of environmental disasters, or rather, how this field can, from a broader and revisited
perspective, combine draws on other sciences to deal with contemporary demands caused by
global disasters, such as the covid-19 pandemic that has devastated Brazil and the world in the
last two years. With these discussions, we do not inte nd to exhaust the debate, nor to present
definitive answers to problems of this order, but rather, to think together about an
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way to circumvent the information of the population about environmental problems and
reduce the injustices that affec t, above all, the most competitive social federations. According
to the thoughts of the authors presented in this articl e, it is understandable that we salute the
limits of each area of           
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SUMÁRIO: 1 I ntrodução. 2 A epistemologia de Bruno Latour e o papel das ciências no mundo
contemporâneo. 3 O direi to é, afinal, uma ciência? . 3.1 A verdade do direi to (sempre
opinativa) e a verdade da ciência (sempre falseável). O ponto de vista da filosofia da justiça
(aporia fundamental do direito) como questão não ex plicitada na obra de Latour. 4 Desastres
na história da humanidade: um desafio às ciências. 4.1 A resposta da teoria do direito ao s
desastres e o direito positivo dos desastres. 4.2 O processo judicial como esfera pública
regrada e veículo condutor da identificação (mapeamento), estruturação das políticas de
emergência e de redução de riscos e v ulnerabilidades no contexto dos desastres. 4.3
Constitucionalismo global: convergência da modernidade em meio ao caos? 5 Os desafios do
cientista do Sul: afastar o negacionismo que evita aproximar as togas dos jalecos. 5.1 O
problema é meu? Por uma aproximação entre ciê ncia e senso comum: o discurso dos
cientistas, o discurso dos juristas e o discurso do cidadão. 6 Considerações Finais. 7
Referências.
1 Introdução
Em perguntas escritas, o idioma espanhol obriga a utilização do sinal de
interrogação no início e no final das frases, sinalizando ao leitor que se trata de uma
pergunta, o que implica o devido cuidado com a entonação na leitura. Já no idioma
português, coloca-se a interrogação apenas no final, cabendo ao leitor a correção de
rumo e a adequada entonação à pergunta que se avizinha.
Perguntas necessitam mais do que entonação. Elas reclamam atenção e
importância especial no mundo das ciências. A ciência nasce da pergunta,
independentemente do idioma em que se queira fazê-la. Fazer perguntas importa
muito mais do que trazer respostas. A pergunta é cíclica, podendo ser respondida por
outros cientistas, por outros experimentos, por outras pesquisas. A pergunta é
reflexiva, instigante, circular e responsiva.
O direito tradicional, o método dogmático-sistemático, no qual as normas
previstas anteriormente resolvem todos os problemas, costuma fazer poucas
perguntas, preferindo trazer respostas, fechar o ciclo, sinalizar a conclusão de um caso
concreto com o manto do ato jurídico perfeito (contrato), da lei escrita (direito
positivo) e da coisa julgada (caso concreto). Diferentemente, a verdade científica não
tem consenso, porque ela é colocada em debate, discussão e verificação a todo o
momento.
Quando se imagina um laboratório de física quântica, um experimento da
biologia ou uma invenção da química, há uma efusão de interrogações, tais como
efeitos colaterais, extensão dos resultados esperados, mudanças comportamentais,
entre outras.
A pergunta leva o cientista ao laboratório, acompanha-o em seu experimento,
mas também é levada aos seus relatórios, papers, bulas e até ao prêmio Nobel. Fazer
ciência é perguntar, refletir, ir, voltar, testar e verificar.
Pode haver uma pergunta na conclusão de uma dissertação jurídica? Ou uma
interrogação em uma tese de doutorado em direito; um questionamento em um
dispositivo de sentença? É possível uma indagação em um parecer jurídico ou mesmo
em um dispositivo de lei? Não, pois para o método dogmático, a resposta é o início, o
fim e o meio. A dedução é a metodologia mais apropriada de solução. As ciências
jurídicas afastam as perguntas do início ao final. Elas estão, por outro lado, no mundo

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