O legado de Weimar no Brasil

AutorMarco Aurelio Peri Guedes
Ocupação do AutorAdvogado. Mestre em Teoria Geral do Estado e Direito Constitucional pela PUC-Rio. Doutor em Direito pela UNESA. Professor Adjunto de Direito Público da UFRRJ
Páginas103-142
CAPÍTULO 4
O legado de Weimar no Brasil
4.1 – O Brasil na década de 1930
A política no Brasil do início dos anos 30 começa
um pouco agitada214. A reforma constitucional do texto
vigente de 1891, de 1926215, não resolveu alguns dos
principais problemas da época: o sistema eleitoral ine-
ficiente e antiquado e a crise do federalismo. As
transformações sociais por que passou o Brasil no pe-
ríodo de pós-guerra deixam clara a obsolescência das
práticas políticas brasileiras. Como nota Bastos
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214. Vamireh Chacon vai mais longe e, em sua obra Vida e Morte das
Constituições Brasileiras, afirma à página 127 que a década de 1930 foi
uma das mais agitadas no mundo todo.
215. POLETTI, Ronaldo. A Constituição de 1934. Brasília: Centro de
Ensino à Distância, 1987, p. 12-13: “Um dos pontos cruciais da discussão
constitucional, que viria a refletir no anteprojeto e na futura Constitui-
ção, era o da Federação. (...). No Brasil, a República padecia do mal
de um federalismo que não se ajustava à realidade nacional. (...). A
Reforma Constitucional de 1926 não resolvera o problema”.
(...) a crise econômica de 1929, bem como o surgimento
de movimentos sociais pleiteando melhores condições de
vida, trabalho e distribuição de renda, geraram contro-
vérsias quanto à validade da Democracia Liberal e do
Liberalismo Econômico216.
O espírito de renovação surgira principalmente das
fileiras militares, por ocasião do florescimento do movi-
mento Tenentista nas jornadas de 1922 e 1924, desejan-
do o fim do modelo agrário regional e de seu poder na
sociedade brasileira217. Este desejo, obsessão dos jovens
oficiais, vai ao encontro dos ideais da classe média218.
Como observa Santa Rosa em prefácio à sua obra, a
essência do movimento tenentista consistiu no seu pa-
pel ligado ao processo de ascensão da burguesia brasi-
leira, em luta contra o absoluto domínio exercido pela
classe latifundiária”219.
A tradicional política do café-com-leite, que durante
longo tempo manteve no poder líderes políticos das
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216. BASTOS, Celso R. A Constituição de 1934. Revista de Direito Cons-
titucional e Ciência Política, Rio de Janeiro, n. 1, jul. 1983, p. 108.
217. SAMPAIO, Nelson de Souza. A Revolução de 1930 e seu legado
político. Revista de Informação Legislativa, n. 72, out./dez. 1981, p.32. Ver
também COSTA, Cruz. Pequena História da República. 3. ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1974, p. 98.
218. O Pensamento Constitucional Brasileiro. Brasília: Centro de Documen-
tação e Informação, 1978. Desenvolve acerca da Constituição de 1934
PEREIRA LYRA à p. 81: “O que, porém, assumiu importância excep-
cional concentrou-se na convicção geral de que os males, pelo País
sofridos, tinham a sua raiz no imobilismo da Constituição de 1891”.
Ver também MIRANDA VALVERDE, Trajano de. A Intervenção do Estado
na Economia. Rio de Janeiro: Forense, 1940, p. 11 e SAMPAIO, Nelson
de Souza., ob. cit., p. 34.
219. SANTA ROSA, Virgínio. O sentido do tenentismo. 3. ed. São Paulo:
Alfa-omega, 1976, p. XVII. Ver também p. 53, 54 e 55, mais detalhes
sobre o Tenentismo e a sua ascensão no cenário político nacional,
depois das jornadas de 1922 e 1924.
oligarquias rurais de São Paulo e Minas Gerais, iria en-
contrar seu fim com a Revolução de 3 de outubro de
1930220. Nessa data, o estopim da revolução foi a vontade
de Washington Luís de indicar um candidato de São
Paulo, contrariando o provável sucessor à Presidência,
que deveria ser de Minas Gerais. A revolução ganha
ímpeto em Minas Gerais, Paraíba e Rio Grande do Sul,
cuja liderança compartilhada de João Pessoa, Antônio
Carlos e Getúlio Vargas, seria essencial à vitória do mo-
vimento revolucionário.
O desenlace da revolução ocorre em 24 de outubro
de 1930, vinte e um dias após o seu início, com a depo-
sição do presidente Washington Luís pelos militares,
apoiados por amplos setores da sociedade, povo e dos
trabalhadores221. Segundo Hentschke, a Revolução sig-
nificou não apenas uma revolta regional de estados fe-
derais e sim o primeiro movimento no sentido de definir
um caráter nacional no Brasil222. O poder de fato estava
nas mãos da chamada ‘Junta Pacificadora’, no Rio de
Janeiro, integrada por Tasso Fragoso, Mena Barreto e
Isaías de Noronha, responsáveis pelo afastamento do
Presidente. No sentido de articular com o governo re-
volucionário gaúcho, sob as ordens de Getúlio Vargas,
é chamado Afrânio de Melo Franco para promover a
unificação do movimento e tentar conquistar a sua le-
gitimidade.
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220. BASTOS, Celso R., ob. cit., p. 110. Ver também BARBOSA LIMA
SOBRINHO, Barbosa. A verdade sobre a Revolução de Outubro. São Paulo:
Unitas, 1933, p. 262.
221. FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. São Paulo:
Saraiva, 1991, p. 61.
222. HENTSCHKE, Jens R. Estado Novo – Genesis und Konsolidierung der
brasilianischen Diktatur von 1937. Eine Fallstudie zu den sozioökonomis-
chen und politischen Transformationen in Lateinamerika im Umfeld
der Grossen Depression. Saarbrücken: Verlag für Entwicklungspolitik,
1996, p. 261.

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