A ordem econômica e social na República de Weimar

AutorMarco Aurelio Peri Guedes
Ocupação do AutorAdvogado. Mestre em Teoria Geral do Estado e Direito Constitucional pela PUC-Rio. Doutor em Direito pela UNESA. Professor Adjunto de Direito Público da UFRRJ
Páginas37-101
CAPÍTULO 3
A ordem econômica e social na
República de Weimar
3.1 – A Primeira Guerra Mundial e a Constituição de
Weimar
A guerra começou em 4 de agosto de 1914, sem que
a Alemanha estivesse economicamente preparada. Na
verdade, os militares e os políticos esperavam que a
guerra fosse vencida em poucas semanas. Não houve
qualquer preocupação governamental em estocar ali-
mentos para uma guerra a longo prazo, até porque tudo
estava concentrado no esforço de guerra66. O problema
que surgiu para o Império era o custeio da guerra, de-
mandando aprovação do Reichstag para o orçamento
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66. CARR, William. A History of Germany 1815 – 1990. 4. ed. London:
Edward Arnold, 1991, p. 218. O esforço de guerra consiste, em qualquer
Estado, na mobilização militar total, na conversão da indústria civil em
militar, no racionamento de víveres e roupas e na reorganização dos
serviços públicos para atender às demandas civis nas condições de guer-
ra.
militar, o que foi prontamente obtido67. Na sociedade
alemã como um todo, havia se desenvolvido a ideia de
que subsídios e incentivos seriam feitos pelo Estado à
indústria e principalmente à agricultura, como parte do
esforço de guerra envolvendo toda a economia68. A mo-
bilização de recursos humanos e materiais para o esforço
de guerra e a conversão do complexo industrial alemão
para produção de material bélico desequilibrariam eco-
nômica e socialmente a sociedade alemã no decorrer
da guerra69. Isto porque haveria um racionamento de
insumos básicos para a população alemã, que seria agra-
vado posteriormente com o bloqueio inglês aos portos
alemães. Este fator incitaria a população à revolta ao
final da guerra.
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67. Observação interessante é feita por Gustav STOLPER quanto à eco-
nomia alemã nos últimos anos do Império, o que contrasta com a
opinião de autores. Para este autor, “Quando a Alemanha entrou na
guerra, sua vida econômica era intrínsecamente livre, construída sobre
princípios liberais, capitalistas, ainda que muito mais limitada com
regulações estatais que a dos países do Ocidente. Quando terminou a
guerra tinha uma economia completamente militarizada à qual, metade
a sério e metade ironicamente, se dava o nome de ‘socialismo de guerra’
“ (STOLPER, Gustav, ob. cit., p. 103). Evidente contraste com a opinião
de outros autores que defendem a inexistência de uma economia de
orientação predominantemente liberal na Alemanha do século XIX.
Por outro lado, o aspecto financeiro deixava muito a desejar, pois com
a vigente Carta Constitucional de 1871, o Reich alemão não desfrutava
de autonomia financeira. Consultar HOLBORN, Hajo, ob. cit., p. 233-
368.
68. TREUE, Wolfgang, ob. cit., p. 72.
69. RICHARD, Lionel. A República de Weimar. São Paulo: Companhia
das Letras, 1988, p. 14: “Todo o país havia se transformado, mergu-
lhando rapidamente num desequilíbrio econômico e social”. Para este
autor a economia de guerra compele o Estado a racionar todo tipo de
produtos e insumos básicos à população. Para maiores detalhes acerca
da qualidade de vida na Alemanha de durante a guerra, ler Capítulo
I.
Depois de contida a investida inicial alemã pelos
franceses, a guerra de trincheiras dominaria o cenário
militar sem alterações significativas ou indício de vitória
para qualquer das partes até 1917.
Em 1917, a guerra na Europa ainda se desenrolava.
A entrada dos Estados Unidos da América na guerra, ao
lado de França e Inglaterra, com o peso de todo o seu
potencial industrial-militar e o envio de tropas america-
nas ao solo europeu faria com que, em breve, o pêndulo
da balança começasse a pesar em favor da Tríplice En-
tente (ingleses e franceses principalmente), combalidos
por três anos de guerra. Em pouco, a situação desespe-
radora dos exércitos da Entente, que se batiam contra
a última grande arremetida alemã às portas de Paris, se
reverteria e colocaria o exército imperial alemão num
impasse militar.
Neste momento, a Alemanha começa a mostrar o
caos em que se encontra provocado pela crise econômica
interna. Em razão de anos de intenso bloqueio naval
inglês, a população sofre com a escassez de alimentos e
com a inflação crescente70. Quanto à intervenção estatal
na economia, Carr é bastante elucidativo, ao afirmar
que
Precisamente porque o Estado estava intervindo tão ati-
vamente na regulação da economia os alemães comuns
começaram a culpar isto por sua manifesta falha em pro-
teger seus padrões de vida na segunda metade da guerra71.
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70. Para um aprofundamento das condições de vida da população alemã
durante a primeira guerra, consultar BESSEL, Richard, Germany after
the first world war. New York: Oxford University Press, 1995. No Cap. 1,
a análise do autor sobre os aspectos econômico-sociais é muito rica em
detalhes.
71. CARR, William, ob. cit., p. 219.

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