A livre iniciativa no direito tributário brasileiro: análise do artigo 116 do Código Tributário Nacional

AutorPaulo de Barros Carvalho
Páginas67-91
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Tema IV
A LIVRE INICIATIVA NO DIREITO
TRIBUTÁRIO BRASILEIRO :
Sumário: 1. Introdução. 2. Sistema jurídico e conceito de
validade. 3. Interpretação dos fatos: delimitação do conteúdo
de “fato puro”, “fato econômico” e “fato jurídico”. 4. Fato
jurídico e “fato elisivo”: adequação dogmática desses concei-
tos às premissas adotadas. 5. O sistema jurídico e os princípios
ontológicos do direito. 6. O princípio da autonomia da von-
tade e da livre iniciativa. 7. A figura da simulação no direito
positivo brasileiro. 8. Licitude da elisão fiscal. 9. Imprescin-
dibilidade do elemento subjetivo “dolo” para configurar si-
mulação ou fraude. 10. Conclusões e respostas às indagações
formuladas.
1. INTRODUÇÃO
Na tarefa de construção da realidade jurídica, as autori-
dades constituídas servem-se da função linguística própria,
qual seja, a prescritiva de condutas. Todavia, a produção das
normas de mais elevada hierarquia no sistema, que são gerais
e abstratas, está confiada aos parlamentos, casas legislativas
de natural heterogeneidade, na medida em que se pretendam
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PAULO DE BARROS CARVALHO
democráticas e representativas. Com isso, a despeito dos es-
forços na elaboração de uma linguagem técnica, dotada da
racionalidade suficiente para atingir padrões satisfatórios de
eficácia social, a verdade é que a mensagem legislada quase
sempre vem penetrada de imperfeições, com problemas de
ordem sintática e semântica, tornando muitas vezes difícil sua
compreensão pelos sujeitos destinatários. É neste ponto que a
Dogmática (Ciência do Direito em sentido estrito) cumpre
papel de extrema relevância, compondo os enunciados fre-
quentemente dispersos em vários corpos legislativos, ajeitando-
-os na estrutura lógica compatível e apontando as correções
semânticas que a leitura contextual venha a sugerir. Com tais
ponderações, a comunicação normativa flui mais facilmente
do emissor ao receptor, realizando os propósitos da regulação
jurídica com mais clareza e determinação.
Convoco a atenção neste momento para a advertência de
que a lei, acertadamente, nada diz, em expresso, sobre elisão
fiscal, cabendo ao exegeta do direito a árdua tarefa de constru-
ção deste conceito normativo a partir da base objetiva do di-
reito posto, orientado pelos ditames dos princípios gerais de
direito tributário assentados no texto da Constituição. O acer-
to a que me referi, vale lembrar, toma como pressuposto que
não cabe ao legislador definir conceitos jurídicos. Imersos na
heterogeneidade das Casas Legislativas e cristalizados no
tempo e no espaço na letra da lei, os conceitos legais não al-
cançam o rigor terminológico exigido para a perfeita regulação
de condutas, sendo mais apropriado deixar à doutrina ou aos
tribunais superiores a conceituação dos termos em linguagem
técnica, obtendo como resultado uma constante atualização
conceptual, a mesma exigida pela prática jurídica.
Neste contexto, se é verdade que o intérprete tem de
buscar, no discurso científico, o sentido das locuções utilizadas
pelo direito positivo, em virtude da precisão característica da
linguagem científica, muito maior a necessidade de se tomar
em consideração o sentido que o próprio ordenamento jurídi-
co confere a determinados termos, pois, ao definir, o direito

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