Marcas no espaço digital

AutorWilson Pinheiro Jabur e Lucas Ramires Pêgo
Ocupação do AutorMestre em Direito Comercial pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP); Advogado, agente da propriedade industrial, árbitro e mediador em São Paulo; Diretor da Câmara de Nomes de Domínio do Centro de Solução de Disputas da Associação Brasileira da Propriedade Intelectual (CSD-ABPI). / Bacharel em Direito pela Faculdade ...
Páginas99-130
MARCAS NO ESPAÇO DIGITAL
Wilson Pinheiro Jabur*1
Lucas Ramires Pêgo**2
Sumário: Introdução – 1. Marcas; 1.1 Evolução histórica e tratados internacionais; 1.2 A impor-
tância dos princípios gerais para a interpretação do direito de marcas; 1.2.1 Territorialidade;
1.2.2 Especialidade; 1.2.3 Repressão à concorrência desleal; 1.2.4 Livre-iniciativa; 1.2.5 Distin-
tividade; 1.2.6 Disponibilidade, veracidade e licitude – 2. Espaço digital e evolução da internet;
2.1 O e-commerce e a Web 1.0; 2.2 Web 2.0; 2.3 Web 3; 2.4 Web 4.03. Evolução da proteção
às marcas no espaço digital; 3.1 Oportunidades e desaos do metaverso para as marcas – 4.
Considerações nais – Referências.
INTRODUÇÃO
As marcas permeiam as vidas dos seres humanos no mundo contemporâneo.
Da hora em que se acorda até a hora em que se vai dormir, são centenas de marcas
com que um indivíduo habitando uma região urbana trava contato ao longo de
um dia de sua existência.
Com a crescente importância do mundo digital, intensicada pela pandemia
do coronavírus que atingiu escala planetária em 2020 e que determinou relevante
migração das atividades presenciais para o espaço digital, as marcas adquiriram
ainda maior importância, passando a desempenhar papel fundamental em um
contexto tecnológico cada vez mais complexo, dado o desenvolvimento e alcance
da rede mundial de computadores.
Esta importância é sensivelmente mensurável pelo crescente número de
redes sociais e da destinação de quantias cada vez mais vultosas para a difusão de
marcas no espaço virtual e busca pelo engajamento de consumidores também
nessa dimensão.
* Mestre em Direito Comercial pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP); Advoga-
do, agente da propriedade industrial, árbitro e mediador em São Paulo; Diretor da Câmara de Nomes
de Domínio do Centro de Solução de Disputas da Associação Brasileira da Propriedade Intelectual
(CSD-ABPI).
** Bacharel em Direito pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ); Advogado, cofundador da Liga Acadêmica de Propriedade Intelectual da UFRJ; Membro do
Observatório de Sinais Distintivos em P.I. e Estudos Transdisciplinares na Academia de Propriedade
Intelectual e Inovação do INPI.
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Neste artigo serão abordados os aspectos jurídicos inerentes às marcas no
espaço digital.
Para tanto, serão apresentadas denições sobre as marcas, sua evolução
histórica, tratados internacionais e princípios gerais que norteiam o reconheci-
mento deste direito. Na sequência, serão abordados o espaço digital e a evolução
da internet, desde seu início até as tendências para o futuro da rede. No quarto
capítulo, serão apresentados alguns dos desdobramentos jurídicos acerca do es-
paço digital e sua correlação com as marcas. Por m, considerações nais seguidas
das referências utilizadas neste estudo.
1. MARCAS
De acordo com a sua semântica, marca pode signicar “sinal que serve para
que se reconheça uma coisa, para distingui-la de outra, para identicar uma função”. 1
Com a industrialização e a ampliação das relações de comércio e serviços, a
importância das marcas foi crescendo, adquirindo “aspectos sociais, econômicos,
políticos e pedagógico-culturais exigidos e regulamentados pelo ordenamento jurídico”. 2
No segmento mercadológico, para designar uma atividade própria, o titular
de uma marca utiliza palavras, símbolos e imagens que permitam ao público
identicar os produtos e serviços que assinala. Já em outras áreas, como no design
gráco, por exemplo, a abordagem dada às marcas está usualmente relacionada
à construção de uma identidade visual.
Cada jurisdição opta por um sistema de aquisição de direitos sobre uma
marca, dividindo-se os países, classicamente, entre aqueles em que direitos são
adquiridos pelo uso do sinal (sistemas declarativos) e outros em que os direitos
são adquiridos pelo registro (sistemas atributivos).
Fato é que a grande maioria dos países, como se verá adiante, prevê uma forma
de atribuição de direitos exclusivos sobre um sinal em relação a certos produtos
ou serviços e estes direitos exclusivos podem se tornar ativos muito valiosos, quer
para pessoas físicas, quer para empresas, exercendo papel fundamental para o
desenvolvimento econômico de um país.3
1. DICIO. Dicionário Online de Português. Disponível em: https://www.dicio.com.br/marca/. Acesso
em: 11 jul. 2022.
2. BRANT, Cássio Augusto Barros. Lições preliminares de propriedade intelectual. Belo Horizonte: Edição
do autor, 2012, p. 19.
3. Nesse sentido, Moreira ressalta que “é através da marca que a empresa promete e entrega ao cliente um
valor superior ao encontrado no mercado. Quando as empresas fazem isso contínua e consistentemente,
tendem a ser mais lembradas, desenvolvem a preferência e contam com a lealdade do consumidor, são
mais protegidas da concorrência e fortalecem o poder de barganha com os canais de distribuição e com
os fornecedores. [...] A marca estabelece um relacionamento e uma troca de intangíveis entre pessoas e
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Dada a instantaneidade e ubiquidade características do espaço digital, as
marcas têm buscado estar nele inseridas de modo a interagirem com os consu-
midores mais rapidamente e buscando criar conexões e empatia com seu público.
Para atingirem tais objetivos, muitas marcas têm se valido de campanhas
promocionais, em que o fator custo-benefício também deve ser ressaltado. Um
bom exemplo disto foi a campanha feita em 2011 pela marca Guaraná Antarctica
na rede social Facebook segundo a qual a titular da marca prometeu presentear os
consumidores que “curtissem” sua página naquela rede social com mil litros de
refrigerante, caso os números do sorteio da Mega-Sena saíssem na ordem crescente
de 1 a 6. O resultado do sorteio foi outra combinação de números e a empresa não
precisou entregar refrigerante algum, mas como resultado da campanha milhares
de fãs foram agregados à sua página.4
1.1 Evolução histórica e tratados internacionais
A proteção às marcas, tal qual se conhece hoje, é fenômeno relativamente
recente, que desponta com a Revolução Industrial, no século XIX.
Há, contudo, indícios do uso de marcas e de legislações esparsas, trazendo
alguns estudiosos exemplos de proteção na Antiguidade como indicações de
procedência.5 Para outros, as marcas teriam surgido no período medieval por
levarem em consideração a função por elas exercida6 e o momento em que o
comércio adquire relevante papel econômico e jurídico.7
Desde então, a noção jurídica de marca tem evoluído através dos tempos dadas
as novas realidades e necessidades que surgem com a prática mercantil.8 Verica-se
produtos. O produto é o que a empresa fabrica, o que o consumidor compra é a marca. Os produtos não
podem falar por si: a marca é que dá o signicado e fala por eles”. MOREIRA, Cínthia Lopes. Direito
de Marca: a marca e seu registro. Belo Horizonte: Mundo de Cetim, 2006, p. 8.
4. Disponível em: https://uaigo.com.br/blog/marcas-de-sucesso-na-internet-aprenda-com-elas-a-tur-
binar-a-sua. Acesso em: 11 jul. 2022.
5. “Daí dizer Reynoard que as marcas de fábrica são tão antigas como o mundo romano. Na Grécia,
também, atesta Ramon Pella, a existência de marcas de fábrica é fato que a arqueologia deixa fora de
qualquer dúvida; mas pondera que as iniciais e guras gravadas pelos artíces gregos nos vasos [...]
só de maneira muito lata merecem o nome de marcas de fábrica [...]”. GAMA CERQUEIRA, João da.
Tratado da Propriedade Industrial. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, v. I, Parte I, p. 237.
6. Para Maitê Moro, na Antiguidade, não se podia atribuir à marca o sentido comercial, pois não visavam
as marcas a conquista de clientela: sua função era restrita à indicação da propriedade do objeto a uma
relação de pertinência. MORO, Maitê Cecília Fabbri., Direito de marcas: abordagem das marcas notórias
na Lei 9.279/1996 e nos acordos internacionais. São Paulo: Ed. RT, 2003, p. 23-24.
7. FERREIRA, Waldemar. Tratado de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1962, v. VI, p. 256.
8. Denis Borges Barbosa ensina que, “no tocante a marcas, [o] surgimento como direito de propriedade
industrial é contemporâneo à internacionalização do uxo do comércio de bens produzidos pela
indústria de transformação”. BARBOSA, Denis Borges. Uma Introdução à Propriedade Intelectual. 2.
ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 151.
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