Normas jurídicas: Sistema de precedentes no direito brasileiro
Autor | Fernando Pessoa de Aquino Filho |
Cargo | Advogado |
Páginas | 56-60 |
56 REVISTA BONIJURIS I ANO 33 I EDIÇÃO 669 I ABR/MAIO 2021
DOUTRINA JURÍDICA
Portanto, se a interpretação que advém da
jurisdição é uma atividade adscritiva de senti-
do que reconstrói a norma jurídica, parece ser
mais importante, por exemplo, em um caso de
controle abstrato de constitucionalidade apre-
ciado pelo Supremo Tribunal Federal, construir
a ratio decidendi vencedora no colegiado do que
apenas expor um “placar de julgamento” pela
(in)constitucionalidade do texto – no qual os
votos podem ter a mesma conclusão, mas com
razões completamente distintas6.
Ademais, se isso tudo é verdade, nota-se que
o sistema de precedentes obrigatório está longe
de ser mera técnica de gestão de processos que
visa à “diminuição da sobrecarga de processos
no Judiciário”7. Em verdade, a regra do stare
decisis constitui a referência da segurança ju-
rídica em um direito caracterizado pela dupla
indeterminação8, fazendo com que os arts. 926 e
927 do sejam apenas elementos para torná-
-la mais visível.
Em verdade, a substancial justificativa para
tratar casos idênticos da mesma forma está no
deslocamento de uma perspectiva cognitivista
da interpretação judicial para uma perspectiva
adscritivista da interpretação.
Fernando Pessoa de Aquino FilhoADVOGADO
SISTEMA DE PRECEDENTES NO
DIREITO BRASILEIRO
I
SE OS TEXTOS DAS LEIS PODEM GERAR EQUÍVOCOS E AS NORMAS
SÃO VAGAS, ENTÃO É NO PRECEDENTE QUE A ORDEM JURÍDICA
GANHA UNIDADE
Ofenômeno jurídico sofre de dupla inde-
terminação: os textos das leis podem
gerar equívocos e as normas são vagas1.
Diante desse problema, a jurisdição se
despiu de uma visão cognitivista na in-
terpretação, na qual imaginava-se o juiz como
oracle of the law ou como étre inanimé, e pas-
sou, de fato, a interpretar textos de maneira a
adscrever sentido a eles, convertendo-os em
normas. Esse fenômeno demonstra a transfor-
mação de um elemento significante (texto) em
um verdadeiro significado (norma)2.
Assim, se nas teorias clássicas da jurisdição
o juiz declarava a lei (magistrado esclave de la
loi) ou, no máximo, criava uma norma individu-
al baseada na norma geral (magistrado ministre
d’équité)3, hoje ele reconstrói a norma jurídica
baseando-se na interpretação como uma ativi-
dade “adscritiva” de sentido ao texto legal4.
Em resumo, pode-se afirmar que a doutrina
finalmente entendeu que não se interpretam
normas, mas sim textos dotados de autoridade
jurídica5. Constatando-se esse real papel da ju-
risdição diante da nova teoria das normas com-
preende-se o novo significado de interpretação
judicial.
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