Pan-Africanismo & Internacionalismo em 1945: "O trabalhador de pele branca não pode emancipar-se onde o trabalhador de pele negra é marcado com ferro em brasa"./Pan-Africanism and Internationalism in 1945: "Labour cannot emancipate itself in the white skin where in the black it is branded".

AutorAdi, Hakim
  1. Introdução

    O 5? Congresso Pan-Africano realizado na Grã-Bretanha em outubro de 1945 foi visto como representando o auge do movimento Pan-Africano e o mais significativo de todos os congressos Pan-Africanos desde a histórica Conferência Pan-Africana convocada por Henry Sylvester Williams em Londres em 1900 (LANGLEY, 1973, p. 355). Foi amplamente reconhecido que os trabalhos deste Congresso deram origem a um novo tipo de Pan-Africanismo anti-imperialista e internacionalista. A ideologia pan-africanista de Manchester do pós-guerra tentou basear-se nos interesses das massas populares nas colônias e enxergou os trabalhadores urbanos e rurais como a principal força na luta anticolonial. Muitos dos delegados no Congresso de Manchester eram representantes de organizações trabalhistas e sindicais.

    As preocupações do trabalho pan-africano não foram ouvidas apenas em Manchester em 1945. Ao longo daquele ano, os representantes dos trabalhadores africanos e caribenhos manifestaram suas preocupações no cenário internacional, talvez pela primeira vez desde a fundação do Comitê Sindical Internacional dos Trabalhadores Negros (International Trade Union Committee of Negro Workers - ITUCNW) na década de 1930. No ano de 1945 também foram realizadas as conferências fundadoras da Federação Sindical Mundial (World Federation of Trade Unions - WFTU), a primeira central sindical verdadeiramente internacional. Representantes de trabalhadores africanos e caribenhos tiveram um papel significativo em sua fundação e foi após sua participação na Conferência Sindical Mundial (World Trade Union Conference) de Londres em fevereiro de 1945, que vários dos principais representantes sindicais africanos e caribenhos defenderam a convocação do 5? Congresso Pan-Africano.

    Este artigo visa delinear o importante papel desempenhado pelo trabalho Pan-Africano em 1945, particularmente nas conferências fundadoras da WFTU, bem como em outros eventos e nos preparativos para o Congresso Pan-Africano de Manchester. Os representantes do trabalho pan-africano argumentaram que "o trabalhador de pele branca não pode emancipar-se onde o trabalhador de pele negra é marcado com ferro em brasa" (MARX, 1988, p. 228; MARX; ENGELS, 2010, p. 305).(1) Mas, ao mesmo tempo, é claro que eles viram a unidade e os avanços empreendidos pelos trabalhadores e povos oprimidos nas colônias e em todo o mundo, como tão cruciais para a libertação colonial quanto às lutas das massas trabalhadoras na África e no Caribe. Se os interesses das massas populares nas colônias avançassem, eles argumentaram, os movimentos trabalhistas teriam que desenvolver um caráter polÃÂtico em oposição ànoção de "sindicalismo responsável" defendida pelo governo britânico e pelo Congresso Sindical. A fundação de uma central sindical internacional, que apoiaria as demandas anticoloniais do povo da África e do Caribe, foi vista como vital, uma luta na qual os representantes do trabalho pan-africano tiveram que desempenhar um papel de vanguarda.

    Os quatro Congressos Pan-Africanos anteriores foram amplamente organizados pelo escritor e ativista afro-americano W. E. B. Du Bois. Em 1945, embora ele tenha participado do Congresso de Manchester como delegado da Associação Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor (National Association for the Advancement of Colored People - NAACP), Du Bois desempenhou apenas um papel secundário nos preparativos. O Congresso foi organizado e dominado por organizações e ativistas britânicos e representantes do trabalho do império colonial britânico. É significativo que a sessão de abertura do Congresso tenha focado em "O problema de cor na Grã-Bretanha" (ESEDEBE, 1980, pp. 18-35; ADI; SHERWOOD, 1995). (2) Durante as décadas de 1930 e 1940, a Grã-Bretanha se tornou um centro de atividade pan-africana, corno seria de esperar, uma vez que muitos na diáspora eram súditos do Império Britânico e, por razões económicas e polÃÂticas, gravitavam em direção ao seu centro (ADI, 2020, pp. 697-716).

    Várias organizações foram formadas não apenas para combater os efeitos do racismo na Grã-Bretanha, mas também para fazer campanha contra o domÃÂnio colonial e pelo autogoverno nas colônias. As mais importantes foram a União dos Estudantes da África Ocidental (West African Students' Union - WASU) formada em Londres em 1925, a Liga dos Povos de Cor (League of Coloured Peoples - LCP) formada em 1931, e o Bureau Internacional de Serviço Africano (International African Service Bureau - IASB) formada em Londres por George Padmore em 1937. Todas essas organizações mantiveram vÃÂnculos nas colônias africanas e caribenhas da Grã-Bretanha e, como consequência, Londres se tornou uma base importante para uma luta comum contra o imperialismo britânico.

    A influência de indivÃÂduos como Padmore, Wallace-Johnson, Arnold Ward e Desmond Buckle significava que cada vez mais era a ideologia do marxismo que entusiasmava esse movimento anticolonial e anti-imperialista de base britânica. O movimento também foi influenciado não apenas pelas ideologias de organizações como a Liga Contra o Imperialismo (League Against Imperialism - LAI) e o Partido Comunista na Grã-Bretanha, mas também por muitos dos desenvolvimentos na União Soviética e a oposição bem conhecida do paÃÂs ao colonialismo (PADMORE, 1946).

    Em 1944, após a iniciativa do IASB, representantes de várias organizações africanas e britânicas se reuniram em Manchester para formar "um movimento pan-africano de frente única", a ser conhecido como Federação Pan-Africana (Pan-African Federation - PAF). De fato, a maioria das organizações britânicas de povos da África e do Caribe foi incluÃÂda, com as notáveis exceções da WASU e da LCP. Mesmo assim, foi a primeira vez que tantas organizações se uniram em uma frente única. Talvez ainda mais significativo tenha sido o fato de a Federação Pan-Africana também incluir representantes de três organizações africanas: a Associação Central Kikuyu (Quénia), representada por Jomo Kenyatta; a Liga da Juventude Africana (seção Serra Leoa), representada por Isaac Wallace-Johnson; e a Sociedade Amigos da Liberdade Africana (Costa do Ouro). Aqui em embrião estava a base organizacional do Congresso Pan-Africano de Manchester. Embora a WASU e a LCP não fizessem parte formal da nova Federação, eles frequentemente se aliavam a ela em questões de interesse geral. Durante os últimos estágios da guerra, todas essas organizações se preocuparam em formular polÃÂticas para o mundo pós-guerra, o que poderia colocar a África e a diáspora no centro dos assuntos mundiais, e que poderia intensificar a luta contra a discriminação racial, pelo desenvolvimento econômico e pelo autogoverno. Eles estavam preocupados em garantir que o artigo 3?? da Carta do Atlântico, que se referia ao direito àautodeterminação, fosse aplicado a todos os paÃÂses, inclusive as colônias. (3)

    Quando a guerra chegou ao fim, W. E. B. Du Bois começou a investigar a possibilidade de realizar um congresso Pan-Africano em Londres ou na própria África. No entanto, a iniciativa de realizar esse congresso foi logo adotada pela Federação Pan-Africana na Grã-Bretanha, que viu as possibilidades de consultar representantes trabalhistas coloniais após a Conferência Sindical Mundial realizada em Londres em fevereiro de 1945. (4)

  2. A Conferência Sindical Mundial e o Trabalho Pan-Africano

    A Conferência Sindical Mundial foi um evento extremamente significativo na história do movimento internacional dos trabalhadores. Foi a primeira vez que todas as principais organizações, centrais sindicais e trabalhistas, incluindo os sindicatos da União Soviética, se uniram na tentativa de formar uma organização internacional dos trabalhadores e tentar influenciar a polÃÂtica internacional. Organizações sindicais de todos os continentes esperavam ser representadas nos órgãos das Nações Unidas, incluindo o Conselho de Segurança, e desejavam dar a sua opinião sobre como a guerra seria encerrada e como o mundo do pós-guerra seria construÃÂdo (WALLACE, 1945).

    Do ponto de vista pan-africano, ainda mais importante foi o fato de que os movimentos trabalhistas emergentes na África Ocidental, no Caribe e na América do Sul estavam representados. Havia também delegados da antiga Rodésia do Norte, da África do Sul, ÃÂndia, Palestina e outros lugares. (5) Todas as quatro colônias da África Ocidental da Grã-Bretanha enviaram delegados. A Nigéria foi representada por T. A. Bankole, Presidente do recém-formado Congresso Sindical da Nigéria e por M. A. Tokunboh. O Congresso Sindical da Serra Leoa foi representado pelo lÃÂder nacionalista Isaac Wallace-Johnson, que havia sido libertado recentemente de cinco anos e meio de prisão e exÃÂlio, ocasionados por suas atividades polÃÂticas anti-imperialistas (SPITZER; DENZER, 1973, pp. 413-52). O delegado da Costa do Ouro foi J. S. Annan do Sindicato dos Funcionários Públicos e Técnicos Ferroviários, enquanto o Sindicato dos Trabalhadores da Gambia foi representado pelo veterano organizador trabalhista E. F. Small e por I. Garba Jahumpa.

    Além dos delegados da Ãfrica Ocidental, a Guiana Britânica na América do Sul e a Jamaica no Caribe também enviaram delegados. A Guiana Britânica foi representada por um pioneiro do sindicalismo, Hubert Critchlow, Presidente do Conselho Sindical da Guiana Britânica, que havia sido o secretário do primeiro sindicato de seu paÃÂs formado em...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT