Planejamento do uso

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PLANEJAMENTO DO USO
11.1 INSTRUMENTOS DE PLANEJAMENTO DO USO DA ÁGUA
O Estado brasileiro contemporâneo segue um modelo de Estado de bem-
-estar social, em uma abordagem intervencionista. A implementação de seus
objetivos e nalidades, nos âmbitos social, econômico e, mais recentemente,
ambiental, implica a instituição de políticas públicas. Segundo Maria Paula Dallari
Bucci, como tipo ideal, a política pública deve visar à realização de objetivos de-
nidos, expressando a seleção de prioridades, a reserva dos meios necessários à sua
consecução e o intervalo de tempo em que se espera o atingimento dos resultados.1
No âmbito da temática ambiental, especialmente os recursos hídricos, coube
a instituição de normas especícas, visando solucionar tanto as demandas do
processo de desenvolvimento, como buscando meios de conservar e proteger
as águas. Nesse diapasão, para cumprir os propósitos estabelecidos, surge o
planejamento que
no conceito de ciência econômica, onde é bastante empregado, é a forma de conciliar recursos
escassos e necessidades abundantes. Em matéria atinente aos recursos hídricos, pode ser denido
como o conjunto de procedimentos organizados que visam ao atendimento das demandas de
água, considerada a disponibilidade restrita desse recurso.2
A noção de planejamento está vinculada às ciências da economia, das nan-
ças e do orçamento. O Estado, ao proceder à intervenção econômica, estabelece
metas a serem atingidas, alocando recursos para tanto.
No caso dos recursos hídricos, o planejamento opera-se por meio do es-
tabelecimento de metas de natureza física a serem alcançadas e que podem ser
traduzidas em melhoria dos aspectos de quantidade e qualidade das águas. Nessa
sistemática, não deixa de haver uma interface com os aspectos econômicos e
1. BUCCI, Maria Paula Dallari. O conceito de política pública em direito. In: BUCCI, Maria Paula Dallari
(Org.). Políticas públicas: reexões sobre o conceito jurídico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
p. 39.
2. BARTH, Flávio Terra. Fundamentos para a gestão de recursos hídricos. In: Modelos para gerenciamento
de recursos hídricos. São Paulo: Nobel/ABRH, 1987. p. 12.
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DIREITO DE ÁGUAS • Maria Luiza Machado Granziera
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nanceiros, à medida que são necessários recursos dessa natureza para atender
aos objetivos propostos, de melhoria dos recursos hídricos e manutenção dos
usos, para as atuais e futuras gerações.
Além disso, a inserção de instrumentos econômicos nas políticas ambientais
e de recursos hídricos, como forma de garantir a efetividade das normas, por meio
da oferta de benefícios aos agentes sociais que aderirem a práticas ambientalmente
desejadas, impõe um contraponto de cunho econômico aos mecanismos de coman-
do-controle, insucientes para garantir a melhoria da qualidade dos bens ambientais.
Eros Roberto Grau, ao manifestar-se sobre o planejamento econômico,3 cita
Charles Bettelhein, para quem
a planicação pode ser denida como uma atividade que visa: (1) xar objetivos e prioridades
para o desenvolvimento econômico e social; (2) determinar os meios apropriados para atingir
esses objetivos; e (3) por efetivamente em prática esses meios tendo em vista a realização dos
objetivos visados.
Feitas as devidas adaptações, posto que a denição anterior versa especica-
mente sobre planejamento econômico, é justamente dessa natureza o conteúdo
da Lei 9.433/93, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, e cujos
fundamentos encontram-se estabelecidos no art. 1º, conforme segue:
I – a água é um bem de domínio público;
II – a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico;
III – em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano e a
dessedentação dos animais;
IV – a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar o uso múltiplo das águas;
V – a bacia hidrográca é a unidade territorial para implementação da Política Nacional de
Recursos Hídricos e atuação do sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos;
VI – a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder
público, dos usuários e das comunidades.
No que se refere aos objetivos da Política, o art. 2º assim os enumera:
I – assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de
qualidade adequados aos respectivos usos;
II – a utilização racional e integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte aquaviário,
com vistas ao desenvolvimento sustentável;
III – a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes
do uso inadequado dos recursos naturais.
3. Planejamento econômico e regra jurídica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978. p. 64-65 (nota de
rodapé 101).
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