A política externa brasileira no alvorecer da República (1889-1902)

AutorPablo de Rezende Saturnino Braga
Páginas37-53
37
Capítulo 02
A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NO
ALVORECER DA REPÚBLICA (1889-1902)
Pablo de Rezende Saturnino Braga1
Introdução
A Proclamação de República em 15 de novembro de 1889
ocorreu em um cenário de grave crise política no Brasil. Em um
contexto de instabilidade, a rearticulação das forças políticas em um
novo regime produziu, naturalmente, importantes impactos para a
política externa, a começar pela necessidade de garantir o
reconhecimento internacional da República.
A formulação da política externa na primeira década de
República foi marcada, portanto, pelas dificuldades do quadro
político doméstico, o que é simbolizado pela grande alternância de
chanceleres a frente do Ministério das Relações Exteriores (MRE):
foram 12 ministros2 até a chegada do Barão do Rio Branco a chefia
do Itamaraty. Este capítulo perpassará pelos principais desafios da
política externa brasileira (PEB) no período de consolidação da
República, de 1889 a 1902, explorando, sobretudo, a complexidade
da reorientação da estratégia de inserção regional e internacional do
país em um quadro de crises políticas e econômicas.
1 Doutor em Ciência Política - IESP/UERJ. Mestrado em Relaçõ es Internacionais
PUC/RJ. Professor da graduação em Relações Internacionais da Ibmec e da
UERJ. Pesquisador da Fundação Alexandre de Gusmão (FUNAG). E-mail:
pablo.bra ga@pr ofessores.ibmec.edu.br
2 Para a lista dos ministros das Relações Exteriores do Brasil, ver: https://www.gov
.br/funag/ptbr/chdd/historia-diplomatica/ministros-de-estado-das-relacoes-exter i
ores. Acesso em: 09 dez. 2022.
38
1. Política externa e mudança de regime político
Qual é o impacto da mudança de regime político para a
política externa de um país? Esta é uma questão complexa que
demanda resposta elaborada, principalmente considerando as
variáveis domésticas, regionais e sistêmicas que, em diferentes
escalas, podem influenciar a formulação da política externa. No caso
da PEB, o debate sobre o impacto da mudança da forma de governo
monárquico para o republicano em 1899 apresenta diversas nuances.
Como ponto de partida, destacamos uma da premissa analítica
apontada por Letícia Pinheiro: a mudança na natureza do regime não
determina, necessariamente, uma mudança de conteúdo da política
externa (2004, p.10).
Segundo a autora, no caso brasileiro, “pontos centrais da
linha diplomática defendida pelos monarquistas, como o equilíbrio
de poder na bacia do Prata e a consolidação das fronteiras do país,
foram igualmente apoiados pelos republicanos” (2004, p11). Por
outro lado, a autora, acompanhada de outros estudiosos da PEB
(CERVO; BUENO, 2008; BUENO, 1995; RICUPERO, 2013),
apontam a consolidação da priorização estratégica da relação com os
Estados Unidos da América (EUA), que se convencionou chamar de
“americanismo”.
O deslocamento do eixo dinâmico de poder do sistema
internacional da Europa para a América do Norte era um movimento
inescapável, ainda que incipiente. A transição hegemônica já era
uma realidade material para o Brasil, uma vez que o modelo de
desenvolvimento agroexportador, com ênfase no complexo cafeeiro,
dependia das importações dos EUA, principal comprador do café
brasileiro desde meados do século XIX (PRADO JR., 1995, p. 160).
Segundo Ricupero, a “americanização” da diplomacia brasileira
representa, sem dúvida, a transformação mais evidente e notável da
época” (2013, p.336).
A ruptura institucional provocada pelo golpe militar que
instalou a República não resultou em uma transformação do modelo

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT