O princípio da adequação setorial negociada no direito constitucional brasileiro: equilíbrio entre as dimensões democrática e inclusiva da negociação coletiva e a centralidade da pessoa humana no direito e na vida social

AutorEvellyn Thiciane Macêdo Coêlho Clemente
Ocupação do AutorMestre em Direito das Relações Trabalhistas e Sociais
Páginas105-168
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C IV
O princípio da adequação setorial negociada no
Direito Constitucional Brasileiro: equilíbrio entre as
dimensões democrática e inclusiva da negociação
coletiva e a centralidade da pessoa humana no
direito e na vida social
Tendo em vista que o progresso da sociedade tem exigido maior atenção
ao Direito Coletivo, no âmbito das relações de trabalho, ante os impactos
sociais, jurídicos, econômicos e políticos vivenciados na atualidade, o Direito
Coletivo do Trabalho busca retomar a aplicabilidade prática das Negociações
Coletivas de Trabalho. Por essa razão, mostra-se necessária e urgente uma
atitude de investigação científica acerca dos métodos de solução dos casos
judiciais, com o intuito de que, a partir do conhecimento adquirido, seja possível
apontar o caminho a ser seguido pelo ordenamento jurídico brasileiro.
A negociação coletiva do trabalho, instrumento legítimo, democrático e
eficaz para a solução de conflitos decorrentes da relação de trabalho e, ainda,
para o equilíbrio entre o capital e o trabalho, só cumprirá a função legalmente
imposta — conforme as diretrizes constitucionais — se realizada em harmonia
com os princípios constitucionais, humanísticos e sociais estabelecidos na
Constituição Federal, de 1988. Por esse motivo, faz-se imprescindível uma
criteriosa análise acerca das possibilidades de realização de negociação
irrestrita entre as partes convenentes.
4.1. DEMOCRATIZAÇÃO E INCLUSÃO NO CONTEXTO DA SOCIE-
DADE CIVIL — O PAPEL DA NEGOCIAÇÃO COLETIVA TRABALHISTA
O Direito do Trabalho é fruto das configurações político-econômicas da
Revolução Francesa e da Revolução Industrial, ante as precárias condições
impostas ao homem no ambiente laboral, em função da abusiva exploração
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dos trabalhadores. Esse fato resultou na união dos empregados contra os abu-
sos cometidos pelos patrões, em busca de melhores condições de emprego,
com o propósito de favorecer regulamentações mínimas de trabalho. Nesse
contexto geral, impende destacar que, no Brasil, a estruturação do Direito
Coletivo do Trabalho foi marcada pelo advento da Constituição da República,
promulgada em 05 de outubro de 1988.
A posição alcançada pelo trabalho na Constituição Federal de 1988 é
precedida de um longo e penoso trajeto percorrido pelo direito ao trabalho
nas Constituições anteriores, conquistando vantagens parciais e lentamente
progressivas, se comparadas às necessidades reais do trabalhador. Isso
demonstra, entretanto, seu merecido valor nos âmbitos social, econômico e
jurídico atuais, sendo a negociação coletiva de trabalho o mais significativo me-
canismo de realização das funções inerentes ao Direito Coletivo do Trabalho.
A respeito da negociação coletiva de trabalho, elucida com exatidão o
Ministro do TST Mauricio Godinho Delgado:
A negociação coletiva é um dos mais importantes métodos de solução
de conflitos existentes na sociedade contemporânea, sendo, indubi-
tavelmente, o mais destacado no tocante a conflitos trabalhistas de
natureza coletiva. Ao traduzir uma fórmula de autogestão da vida eco-
nômica e social, a negociação coletiva trabalhista tende a evidenciar,
com sua presença, significativo traço democrático da sociedade civil
componente do respectivo Estado Democrático de Direito. O desta-
que constitucional à negociação coletiva trabalhista como fórmula de
solução de conflitos e de criação de regras jurídicas realiza-se em ple-
na harmonia aos limites também constitucionais impostos às regras
coletivas negociadas.(200)
Desta forma, assinala ainda o autor:
[...] para a Constituição, as regras negociais coletivas podem instituir
parcelas novas, em acréscimo ao patamar civilizatório mínimo asse-
gurado pelas normas heterônomas estatais, com o poder de formatar
a estrutura e os efeitos jurídicos dessas parcelas novas instituídas.
Podem também as regras coletivas negociadas flexibilizar vantagens
criadas por norma estatal heterônoma, desde que essa regra criado-
ra efetivamente, de modo indubitável, confira à negociação coletiva
trabalhista tal prerrogativa. Entretanto não podem as regras coletivas
(200) DELGADO, Mauricio Godinho. Direito coletivo do trabalho. 7. ed. São Paulo: LTr, 2017.
p. 355.
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negociadas flexibilizar, restringir parcelas instituídas pela normativi-
dade heterônoma estatal — salvo os casos de explícita autorização
inserta na norma criadora da parcela.(201)
Corroborando esse pensamento, reafirmam Mauricio Godinho Delgado
e Gabriela Neves Delgado:
para a concepção de negociação coletiva trabalhista como mecanis-
mo de precarização e rebaixamento do valor trabalho e das condições
de contratação e gestão da força de trabalho na economia e na socie-
dade brasileira.
[...]
Nessa dimensão, como meio de favorecer a democratização da so-
ciedade civil, a Constituição da República reconheceu e conferiu
estímulos à negociação coletiva trabalhista, por meio de vários de
seus dispositivos: art. 7º, VI, XIII, XIV e XXVI, do texto constitucio-
nal original da Constituição que, em seus diversos incisos, trata das
entidades sindicais, instituições decisivas para a adequada dinâmica
negocial coletiva; art. 114, em seu novo § 2º (este, inserido pela EC
n. 45/2004), dispositivo que restringiu o anterior amplo acesso ao po-
der normativo judicial trabalhista, enquanto via concorrencial à clássi-
ca negociação coletiva trabalhista.(202)
A análise das normas diretivas de Direito do Trabalho, à luz da Constitui-
ção Federal de 1988, acarretou relevantes consequências jurídicas, que se
delineiam a partir da alteração da tutela para proteção, assegurada pela Magna
Carta, à dignidade da pessoa humana, elevada à condição de fundamento
da República Federativa do Brasil, retirando do “[...] limbo e inércia factuais a
dinâmica das negociações coletivas trabalhistas em todo o território brasileiro,
abrindo-lhe espaço de desenvolvimento que ainda não experimentara no
período histórico precedente a 1988”(203).
Atualmente, a busca pela fragilização do indivíduo no campo do Direito
do Trabalho, por meio de fatores que fragmentam cada vez mais e separam
as classes operárias, provoca seu enfraquecimento. Sendo assim, “a crise
(201) Idem.
(202) DELGADO, Mauricio Godinho; DELGADO, Gabriela Neves. A reforma trabalhista no
Brasil: com os comentários à Lei n. 13.467/2017. São Paulo: LTr, 2017. p. 249.
(203) Idem.

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