Os punitive damages no direito brasileiro e seus reflexos nas condenações por danos morais

AutorGregory Ibrahim Malfatti/Luiz Gustavo Thadeo Braga
CargoGraduado em Direito pela PUC-PR/Mestre em Direito Empresarial pelo Centro Universitário Curitiba - UniCuritiba
Páginas241-282
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Revista Judiciária do Paraná – Ano XVII – n. 23 – Maio 2022
Os punitive damages no direito brasileiro
e seus reexos nas condenações por
danos morais
Gregory Ibrahim Malfatti
1
Graduado em Direito pela PUC-PR
Luiz Gustavo Thadeo Braga
2
Mestre em Direito Empresarial pelo Centro Universitário Curitiba – UniCuritiba
Resumo: Os punitive damages são denidos como a imposição,
no âmbito da responsabilidade civil, de uma sanção punitiva
àquele que lesiona de maneira grave e reprovável bens
jurídicos alheios, indo além do simples caráter compensatório
da indenização. São igualmente denominados pela doutrina
estrangeira smart money, exemplary damages ou vindictive
damages. Se traduzem em um elemento sancionatório que
é acrescido ao aspecto da compensação do dano com a
nalidade de punir o ofensor e de servir de exemplo para
que ele e outras pessoas não venham a repetir a conduta
objeto de reprimenda. No Brasil, contudo, o Código Civil veda
indenizações estratosféricas e não há indenização punitiva
para o dano material apenas.
M   sobre a possibilidade de xação de indenizações pu-
nitivas (punitive damages) no Brasil, importadas do direito anglo-saxão.
Há os que as defendem, há os que a elas se opõem. E é justamente nisso
que reside a notória relevância do tema. Ou seja, a ausência de pacica-
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ção sobre o assunto demanda a realização de trabalhos como o presente,
destinados à exposição dos contornos acerca da eventual compatibilida-
de do instituto com o sistema jurídico aqui vigente.
Nesse contexto, o presente artigo tem por objetivo aferir o grau de
receptividade que o ordenamento jurídico nacional atribui à indeniza-
ção punitiva, mediante a exposição de entendimentos doutrinários e ju-
risprudenciais a respeito da questão. Buscar-se-á, portanto, responder
à seguinte indagação: a ausência de um dispositivo legal na legislação
civilista que expressamente preveja punitive damages como espécie in-
denizatória é suciente para obstar sua utilização pelos magistrados, ou
haveria alguma razão maior, algo por trás da simples inexistência de pre-
visão legal que dê respaldo à prevalência do instituto no país?
Para ns de transparecer a essência e a nalidade do dano puniti-
vo, far-se-á, num primeiro momento, uma análise sobre sua origem,
sua conceituação e seus objetivos, seguida de uma abordagem acerca de
como o valor do desestímulo é aplicado nos países onde vige o sistema
jurídico da common law, especialmente nos Estados Unidos da América,
cujo Poder Judiciário é conhecido por tê-lo adotado com veemência para
a formação de precedentes judiciais. Posteriormente, um estudo sobre a
eventual possibilidade de aplicar o instituto no Brasil será apresentado,
nomeadamente na seara das condenações por danos morais, expondo as
limitações e os requisitos que teriam de ser observados para sua adoção,
bem como os posicionamentos que lhe são contrários e favoráveis, averi-
guando quais deles apresentam maiores coerência e plausibilidade.
Ao nal, será imperiosa uma investigação acerca de como o Poder
Judiciário brasileiro vem enfrentando este debate, de modo a desvendar
se a aceitação dos punitive damages, se existente, dá-se em respeito às
características inerentes ao instituto e aos requisitos indispensáveis à sua
utilização.
1. Denição, origem e nalidade dos punitive damages
Os punitive damages tiveram origem durante o século 18, na
Inglaterra, sendo denidos como a imposição, no âmbito da responsabi-
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Os punitive damages no direito brasileiro e seus reexos nas condenações por danos morais
lidade civil, de uma sanção punitiva àquele que lesiona de maneira grave
e reprovável bens jurídicos alheios, indo além do simples caráter com-
pensatório da indenização.
São igualmente denominados pela doutrina estrangeira de smart
money, exemplary damages ou vindictive damages (MARTINS-COSTA;
PARGENDLER, 2005, p. 16).
Sobre o conceito de punitive damages, Salomão Resedá (2009, p. 225)
ensina que há
um acréscimo econômico na condenação imposta ao sujeito ativo
do ato ilícito, em razão da sua gravidade e reiteração que vai além do
que se estipula como necessário para satisfazer o ofendido, no intuito
de desestimulá-lo à prática de novos atos, além de mitigar a prática
de comportamentos semelhantes por parte de potenciais ofensores,
assegurando a paz social e consequente função social da responsabi-
lidade civil.
No mesmo sentido, dispõe o doutrinador norte-americano David
Owen (1976, p. 1265), para quem “punitive ou exemplar y damages são
acrescidos aos compensatory damages para punir o réu pelo cometimen-
to de uma má conduta grave ou ultrajante, bem como para dissuadi-lo e
também evitar que outros venham a praticar tal conduta no futuro.
Depreende-se, dessa forma, que os punitive damages se traduzem em
um elemento sancionatório que é acrescido ao aspecto da compensação
do dano – o qual, por sua vez, é intitulado pela doutrina estrangeira com-
pensatory damages –, com a nalidade de punir o ofensor e de servir de
exemplo para que ele e outras pessoas não venham a repetir a conduta
objeto de reprimenda, trazendo efetividade à função social da responsa-
bilidade civil.
Esse instituto originou-se na Inglaterra com o julgamento de dois
casos, em 1763, quais sejam, Huckle vs. Money e Wilkes vs. Wood (BELL;
PEARCE, 1987, p. 1).
O primeiro caso tratou-se de ação indenizatória movida por um
tipógrafo em face de um mensageiro do rei, por ter este, munido ape-
nas de um mandado genérico, invadido a residência do demandante e o
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