O reconhecimento constitucional dos direitos dos aborígenes e dos direitos dos tratados: um novo enquadramento da gestão do pluralismo jurídico no canadá?

AutorGhislain Otis
CargoTitular da Cátedra de Pesquisa do Canadá em Diversidade Jurídica e Povos Indígenas (Universidade de Ottawa)
Páginas263-293
Rev. direitos fundam. democ., v. 27, n. 1, p. 263-293, jan./abr. 2022.
DOI: 10.25192/issn.1982-0496.rdfd.v27i12404
ISSN 1982-0496
Licenciado sob uma Licença Creative Commons
O RECONHECIMENTO CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS DOS ABORÍGENES E
DOS DIREITOS DOS TRATADOS: Um novo enquadramento da gestão do
Pluralismo Jurídico no Canadá?
1
CONSTITUTIONAL RECOGNITION OF ABORIGINAL AND TREATY RIGHTS: a
new framework for managing legal pluralism in Canada?
Ghislain Otis
Titular da Cátedra de Pesquisa do Canadá em Diversidade Jurídica e
Povos Indígenas (Universidade de Ottawa) e especialista em direito
indígena, pluralismo jurídico, direito constitucional e direitos humanos, o
professor Ghislain Otis é Ph.D. pela Universidade de Cambridge. Como
titular da Cátedra em Diversidade Jurídica e Povos Indígenas, concentra
seu trabalho na governança indígena não territorial e no pluralismo
jurídico.Além disso, lidera uma equipe internacional de pesquisadores,
parceiros indígenas e não indígenas e estudantes no projeto Legitimus
(Estado Indígena e Culturas Jurídicas: Direito em Busca de Legitimidade).
É membro da Academia de Ciências Sociais da Royal Society of Canada.
Foi professor visitante em várias universidades estrangeiras e chefe de
importantes iniciativas internacionais de pesquisa sobre pluralismo jurídico
e povos indígenas.
Resumo
No Canadá, a seção 35 do Ato Constitucional de 1982 declara
que “os atuais direitos do povo aborígene e dos tratados no
Canadá são aqui reconhecidos e ratificados”. Esperava-se que
a seção 35 fosse o início de uma nova abordagem no manejo
da coexistência do direito indígena e do direito não indígenas
1
Artigo traduzido do original em inglês “Constitutional recognition of aboriginal and treaty rights: a new
framework for managing legal pluralism in Canada?” publicado pelo autor no “The Journal of Legal
Pluralism and Unofficial Law (v. 46, n. 3, 2014). Tradução do inglês por Luciana de Andrade Amoroso
Remer. Revisão da tradução por Marcos Augusto Maliska.
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O RECONHECIMENTO CONSTITUCIONAL
Revista de Direitos Fundamentais & Democracia, Curitiba, v. 27, n. 1, p. 263-293, jan./abr., de 2022.
como elemento chave do pluralismo jurídico no Canadá. Esse
artigo avalia até que ponto a implementação da seção 35 pelos
tribunais, governos e povos indígenas, tem realmente
fomentado, até agora, o reconhecimento e a proteção
constitucional do ordenamento jurídico indígena de forma
diferente da abordagem colonial. Após detalhada pesquisa
sobre os direitos jurisprudenciais aborígenes e a recente
prática de elaboração de tratados, o autor conclui que o
advento da seção 35 não alterou fundamentalmente a
tradicional relutância do Estado em permitir que o direito
indígena não estatal regulamente questões distributivas
intersocietárias que são consideradas fundamentais para as
ordens políticas e econômicas postas em prática como
resultado da afirmação da Soberania da Coroa sobre os povos
indígenas e suas terras.
Palavras-chave: direitos dos aborígene e direitos dos tratados;
povos indígenas; Canada; direito indígena; pluralismo jurídico.
Abstract
In Canada, section 35 of the Constitution Act, 1982 states that
“The existing aboriginal and treaty rights of the aboriginal
peoples of Canada are hereby recognized and affirmed”. It was
expected that section 35 would be the foundation for a new
approach to managing the coexistence of indigenous and non-
indigenous law as a key element of legal pluralism in Canada.
This paper assesses the extent to which the implementation of
section 35 by courts, governments and indigenous peoples has
so far actually fostered the constitutional recognition and
protection of indigenous legal orders in a way that departs from
the colonial approach. After a detailed survey of aboriginal
rights jurisprudence and recent treaty-making practice, the
author concludes that the advent of section 35 has not
fundamentally altered the state’s traditional unwillingness to let
non-state indigenous law settle inter-societal distributive issues
that are deemed fundamental to the political and economic
orders put in place as a result of the assertion of Crown
sovereignty over indigenous peoples and their land.
Keywords: aboriginal and treaty rights; indigenous peoples;
Canada; indigenous law; legal pluralism
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A seção 35 do Ato Constitucional de 1982 declara que “os atuais direitos
consignados do povo aborígene no Canadá são aqui reconhecidos e ratificados”.
Também especifica que os direitos consignados incluem aqueles derivados de
acordos assinados depois de 1982. Quando essa provisão constitucional entrou em
vigor, os povos indígenas esperavam que se criasse um espaço constitucional

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