O STF e a pandemia: os reflexos da alta judicialização da saúde no país

AutorWanderlei José dos Reis
CargoJuiz de direito e juiz eleitoral em Mato Grosso
Páginas131-154
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Revista Judiciária do Paraná – Ano XVI – n. 22 – Novembro 2021
O STF e a pandemia: os reexos da alta
judicialização da saúde no país
Wanderlei José dos Reis1
Juiz de direito e juiz eleitoral em Mato Grosso
Resumo: A saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem
reduzir o risco de doença e de outros agravos, com acesso
universal e igualitário aos serviços para sua promoção,
proteção e recuperação. O direito público subjetivo à saúde
é uma prerrogativa jurídica indisponível assegurada pela
carta política da república. Contudo, a alta da judicialização
do direito à saúde no Brasil reete a tensão entre o mínimo
existencial e a reserva do possível, o que denota a urgência
em se repensar a prestação do serviço de saúde pública no
país e a implementação de medidas que proporcionem uma
mudança denitiva.
O   devem ser considerados verdadeira meta
da limitação jurídica do Estado, e o conteúdo essencial do estado de
direito deve residir no reconhecimento dessa esfera de autonomia em
que os indivíduos são titulares de direitos subjetivos, oponíveis a tercei-
ros e ao Estado2.
A consagração constitucional dos direitos fundamentais teria sido
a limitação de todos os poderes do Estado acompanhada do reconheci-
mento da supremacia da Constituição em relação ao Poder Legislativo
ordinário3. Os direitos fundamentais assumiram, então, o caráter de di-
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reitos contra o Estado, de garantias da autonomia individual contrária
às invasões do soberano4.
Igualmente, no prisma constitucional, é relevante notar que o esta-
do democrático de direito gravita em torno do princípio da dignidade
da pessoa humana e da centralidade dos direitos fundamentais, estando
incluídos nos direitos fundamentais a liberdade, a igualdade e o mí-
nimo existencial que devem ser realizados pelo Legislativo, Executivo
e Judiciário na maior extensão possível, tendo como limite mínimo o
núcleo essencial desses direitos.
Nessa quadra de ideias, há que se assentar que a carta constitucional
de 1988, intitulada “Constituição Cidadã, abriga em seu art. 5º, incs. I
a LXXVIII, um vasto rol de direitos fundamentais, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos
direitos à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade,
além de outros direitos fundamentais esparsos no seu texto ao longo
dos 250 artigos, os quais possuem aplicação imediata (art. 5º, § 1º, CF),
estando protegidos, inclusive, de investidas do poder reformador (art.
60, § 4º, IV, CF), elevados ao status de cláusulas pétreas, mantendo hígi-
das a identidade e a continuidade da lei maior. Além do que, segundo a
advertência explícita do § 2º do art. 5º, os direitos e garantias previstos
no texto constitucional não excluem outros decorrentes do regime e
dos princípios por ela adotados ou dos tratados internacionais.
Assim, sob uma perspectiva dogmático-jurídica e em razão de seu
conteúdo, podem ser entendidos também como direitos fundamentais
outros postulados com rótulo diferente na carta magna, a exemplo dos
direitos sociais estampados no art. 6º, caput, como educação, saúde,
alimentação, trabalho, moradia, lazer, bem como o direito ao meio am-
biente ecologicamente equilibrado (art. 225, caput, CF), haja vista que
são inerentes à própria existência do ser humano.
A propósito, a Constituição da República de 1988 dispõe quanto à
saúde de modo especíco (arts. 6º, caput; e 196 a 200), tratando-a como
direito social e universal, expressamente, no art. 6º, caput, ao dispor
que “são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o
lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição,
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