Supremo Tribunal Federal e a criminalização da homotransfobia ativismo judicial ou constitucionalismo garantista?

AutorNestor Santiago, Luis Lima Verde Sobrinho
CargoUniversidade de Fortaleza - UNIFOR/Universidade de Fortaleza
Páginas104-127
Rev. direitos fundam. democ., v. 27, n. 2, p. 104-127, mai./ago. 2022.
https://doi.org/10.25192/issn.1982-0496.rdfd.v27i22101
ISSN 1982-0496
Licenciado sob uma Licença Creative Commons
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E A CRIMINALIZAÇÃO DA HOMOTRANSFOBIA:
ATIVISMO JUDICIAL OU CONSTITUCIONALISMO GARANTISTA?
BRAZILIAN SUPREME COURT AND THE CRIMINALIZATION OF
HOMOTRANSPHOBIA: JUDICIAL ACTIVISM OR GUARANTIST
CONSTITUTIONALISM?
Nestor Eduardo Araruna Santiago
Doutor em Direito Tributário (2005), com estágio Pós-Doutoral em Direito pela
Universidade do Minho, Portugal (2016); Mestre (2000) e Especialista (2000)
em Ciências Penais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Professor Titular do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito
Constitucional e do Curso de Graduação em Direito da Universidade de
Fortaleza (UNIFOR), onde ministra a disciplina Processo, Garantismo e Estado
Democrático de Direito (PPGD) e Direito Processual I (Graduação). Atua nas
áreas de Direito Processual Penal e Direito Penal, com interfaces para o
garantismo e o ativismo. Advogado.
Luis Lima Verde Sobrinho
Doutorando em Direito Constitucional pela Universidade de Fortaleza -
UNIFOR (2020). Mestre em Direito Constitucional pela Universidade de
Fortaleza UNIFOR (2017). Especialista em Direito Tributário pela
Universidade Anhanguera-Uniderp (2009). Graduado em Direito pela
Universidade de Fortaleza UNIFOR (2008). Professor das disciplinas de
Antropologia e Filosofia Jurídica, Direito Constitucional e Direito Administrativo
(graduação) e Tributos em Espécie (especialização). Membro associado do
Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito CONPEDI.
Membro dos Grupos de Pesquisa sobre Direitos Culturais GEPDC
(CNPq/UNIFOR) e Direitos Humanos (CNPq/ESMEC). Analista Judiciário.
Resumo
O STF, no Acórdão da ADO 26, conferiu à Lei n. 7.716/1989 interpretação
conforme a CF, para enquadrar a homotransfobia como espécie do gênero
racismo e criminalizá-la, tendo referida decisão sofrido críticas por excesso de
ativismo judicial. O objetivo deste ensaio é analisar se a ADO 26 foi,
realmente, ativista. O artigo contrasta as duas principais teorias da
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Rev. direitos fundam. democ., v. 27, n. 2, p. 104-127, mai./ago. 2022.
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hermenêutica constitucional na atualidade - o ativismo judicial e o
constitucionalismo garantista - para concluir que não houve ativismo judicial
no referido julgamento. Ao contrário, teria o STF se pautado pelo
constitucionalismo garantista. Ao considerar as práticas homotransfóbicas
como espécies do gênero racismo, o julgado não fez uso de analogia, não
dispensou a interpositio legis, nem aplicou o método da ponderação de
princípios, soluções comuns ao ativismo judicial. No caso, o STF reafirmou
sua jurisprudência acerca do conceito de racismo, o qual, para além de
aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, deve ser compreendido em
sua dimensão social.
Palavras-chave: Ação Direta de Constitucionalidade por Omissão 26.
Ativismo judicial. Criminalização. Garantismo. Homofobia.
Abstract
The Brazilian Supreme Court, in the Direct Action of Unconstitutionality due to
Omission no. 26 (ADO 26) judgment, gave interpretation according to the
constitution for Brazilian Statute Law no. 7.716 of 1989, in order to classify
homotransphobia as species of the genus racism and criminalize it, and this
decision was criticized for excessive judicial activism. The purpose of this
article is to analyze if the ADO 26 was trully activist. The article contrasts the
two main contemporary theories of constitutional interpretation - judicial
activism and guarantist constitutionalism - to conclude that there wasn’t judicial
activism in that judgment. Instead, the Brazilian Supreme Court would have
been based on guarantist constitutionalism. By considering homotransphobic
practices as species of the racism genre, the Court didn't use analogy, didn't
discharge the interpositio legis, nor did it apply the balancing principles
method, usual solutions in judicial activism. In this case, the Brazilian Supreme
Court reaffirmed its jurisprudence around the concept of racism, which
shouldn't be limited to strictly biological or phenotypic aspects, but must be
understood in its social dimension.
Keywords: Direct Action of Unconstitutionality due to Omission no. 26.
Judicial activism. Criminalization. Guarantist constitutionalism. Homophobia.
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A Constituição Federal de 1988 (CF), no rol de direitos e garantias
fundamentais individuais e coletivos (art. 5º), assegura que “a lei punirá qualquer
discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais” (inciso XLI) e que “a
prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de
reclusão, nos termos da lei” (inciso XLII). Passadas três décadas da promulgação da
CF, a prática de violências físicas e morais contra a comunidade LGBT1 no Brasil vem
crescendo exponencialmente, sem que haja por parte do Estado a efetiva aprovação
de leis capazes de reprimir o avanço da intolerância.
1 Conquanto haja variações da sigla, optou-se por utilizar LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis,
transexuais e transgêneros), mantendo-se o padrão conforme o Acórdão da Ação Direta de
Inconstitucionalidade por Omissão n. 26 (ADO 26).

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