Trabalhista: Nexo causal nos casos de covid-19

AutorAnderson Angelo Vianna da Costa - Cláudia Salles Vilela Vianna
CargoAdvogado, professor da universidade positivo - Advogada, conferencista e consultora jurídica
Páginas96-111
96 REVISTA BONIJURIS I ANO 32 I EDIÇÃO 667 I DEZ20/JAN21
DOUTRINA JURÍDICA
Anderson Angelo Vianna da Costa ADVOGADO, PROFESSOR DA UNIVERSIDADE POSITIVO
Cláudia Salles Vilela Vianna ADVOGADA, CONFERENCISTA E CONSULTORA JURÍDICA 
NEXO CAUSAL NOS CASOS DE
COVID-19
I
TODA DOENÇA OCUPACIONAL, PARA FICAR CARACTERIZADA,
NECESSITA DE COMPROVAÇÃO TÉCNICA COMO CLARAMENTE
DETERMINA A LEI 8.213/91. O MESMO SE APLICA AO CORONAVÍRUS
Acontínua expansão dos níveis de con-
taminação pelo novo coronavírus e do
número de mortes por covid-19 tem
produzido diversas situações de inse-
gurança para toda a coletividade.
No ambiente empresarial, fortemente impac-
tado, buscam-se as melhores alternativas para
garantir a continuação da atividade, preservar
a saúde e os direitos dos trabalhadores, sempre
com vistas à manutenção da empregabilidade,
além da necessidade de adequar todos os de-
mais contratos civis e comerciais.
Diante deste cenário, atos normativos vêm
sendo publicados regularmente com a preten-
são de interromper ou reduzir a expansão dos
casos de contaminação, bem como para viabili-
zar a continuidade das atividades empresariais,
a manutenção dos empregos e a saúde econô-
mica e social.
Tais medidas normativas, como temos vis-
to, têm provocado abruptas mudanças nos
comportamentos individuais e coletivos, bem
como impactado sobremaneira as relações de
trabalho, tornando necessária a imediata ade-
quação dos processos produtivos ao avanço da
covid-19.
As medidas normativas que trouxeram mais
consequências para as empresas e para os tra-
balhadores foram as Leis 13.979 e 13.982 e as Me-
didas Provisórias 927 e 936.
A Medida Provisória 927, de 22 de março,
trouxe várias possibilidades de gestão ao fle-
xibilizar em caráter excepcional a legislação
trabalhista para permitir a continuidade das
empresas e a empregabilidade. Dentre as me-
didas, seu art. 29 estabeleceu que “os casos de
contaminação pelo coronavírus (covid-19) não
seriam considerados ocupacionais, exceto com-
provação do nexo causal”.
A opção por definir que, salvo comprovação
em contrário, os casos de covid não seriam con-
siderados como laborativos gerou a insatisfação
de segmentos da população, culminando na in-
terferência do Supremo Tribunal Federal que,
em análise de diversas ações de inconstitucio-
nalidades propostas1, decidiu liminarmente por
afastar a eficácia do referido art. 29, dando azo a
diversas manifestações e intensificando o debate
sobre a eventual responsabilidade das empresas.
A  927 acabou tendo seu prazo de vigência
encerrado em 19 de julho de 20202, mas a discus-
são sobre o tema permanece ampla.
Anderson Vianna da Costa e Cláudia Vilela Vianna DOUTRINA JURÍDICA
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REVISTA BONIJURIS I ANO 32 I EDIÇÃO 667 I DEZ20/JAN21
1. A LEGISLAÇÃO VIGENTE SOBRE
OS ACIDENTES DE TRABALHO E A
OBRIGATORIEDADE DE COMPROVAÇÃO
DO NEXO CAUSAL
Em nosso ordenamento, o conceito de acidente
do trabalho e a possibilidade de se considerar
algumas ocorrências como laborativas estão
contidos na Lei de Benecios (Lei 8.213/91), em
seus arts. 19 a 23.
Além do conceito (art. 19), temos a definição
do que são doenças do trabalho e doenças pro-
fissionais (art. 20), bem como as ocorrências
equiparadas aos acidentes de trabalho (art. 21).
Na mesma lei estão os casos de enfermidades
que não podem ser consideradas como labora-
tivas (art. 20, § 1º) e a possibilidade da aplicação
de nexo técnico epidemiológico pela perícia pre-
videnciária (art. 21-A).
Logo, para se debater o caso covid-19 como
enfermidade ocupacional, há que se analisar,
antes de tudo, os textos destes artigos da Lei de
Benecios, o que faremos em linhas breves nos
próximos parágrafos.
O art. 19 dessa Lei 8.213/91 traz a necessidade
de se verificarem três requisitos para a caracte-
rização do sinistro como acidente do trabalho.
Confira-se:
Art. 19 – Acidente do trabalho é o que ocorre pelo
exercício do trabalho a serviço de empresa ou de
empregador doméstico ou pelo exercício do traba-
lho dos segurados referidos no inciso VII do art. 11
desta Lei, provocando lesão corporal ou perturba-
ção funcional que cause a morte ou a perda ou re-
dução, permanente ou temporária, da capacidade
para o trabalho. [...]
Trata o dispositivo, em sua essência, da carac-
terização do acidente típico, em que é possível
identificarmos: (i) o momento e o local de sua
ocorrência; (ii) a existência de lesão corporal ou
perturbação funcional; e (iii) a incapacidade para
o trabalho, ainda que parcial ou temporária.
No caso das doenças, a possibilidade de tê-las
definidas como acidentárias está no art. 20 aqui
transcrito, com nossos destaques:
Art. 20 – Consideram-se acidente do trabalho, nos
termos do artigo anterior, as seguintes entidades
mórbidas:
I – doença profissional, assim entendida a produzida
ou desencadeada pelo exercício do trabalho pecu-
liar a determinada atividade e constante da respec-
tiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e
da Previdência Social;
II – doença do trabalho, assim entendida a adquirida
ou desencadeada em função de condições especiais em
que o trabalho é realizado e com ele se relacione dire-
tamente, constante da relação mencionada no inciso I.
Fazendo a leitura conjunta dos arts. 19 e 20,
como assim determina o caput deste último,
veremos que nos casos de afastamentos decor-
rente da contaminação pelo novo coronavírus
os três requisitos deverão ser observados, quais
sejam, o trabalho como causa, a lesão/perturba-
ção e a incapacidade.
Assim, de início já podemos afastar plena-
mente do conceito de doença ocupacional os
afastamentos preventivos, ou seja, aqueles em
que o trabalhador não apresenta sintoma inca-
pacitante.
Por outro lado, quando verificada a existên-
cia de sintomas incapacitantes, dois dos requi-
sitos exigidos no art. 19 estarão cumpridos: a
perturbação funcional e a incapacidade dela
decorrente. Para que possa a contaminação ser
considerada como ocupacional, portanto, falta-
rá ainda a comprovação de ter sido ela provoca-
da pelo trabalho e a análise das demais condi-
ções previstas no art. 20.
No inciso I do referido dispositivo, trata o le-
gislador da doença profissional, definida como
aquela produzida ou desencadeada pelo exer-
cício do trabalho peculiar a determinada ativi-
dade. Assim sendo, podemos afastar a possibi-
lidade da contaminação pelo novo coronavírus
vir a ser considerada como doença profissional,
pois não se trata de uma enfermidade peculiar
à determinada atividade, mas sim decorrente
de infecção por vírus.
Em tese, poderia a contaminação estar atre-
lada ao ambiente no qual a atividade é exercida,
Quando vericada a existên cia de sintomas incapacitantes, dois
dos requi sitos exigidos no art. 19 estarão cumpridos: a perturbação
funcional e a incapacidade dela decorrente

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