Os tribunais da jurisdição constitucional

AutorJosé Adércio Leite Sampaio
Ocupação do AutorMestre e Doutor em Direito Constitucional pela UFMG. Professor do Curso de Graduação e Pós-Graduação da PUC-MG. Procurador da República
Páginas103-180
C
APÍTULO
III
OS TRIBUNAIS DA
JURISDIÇÃO
CONSTITUCIONAL
Como vimos no processo de evolução da jurisdição constitucio-
nal, com o surgimento na Europa de tribunais especializados em fiscalizar
a constitucionalidade das leis, operou-se uma verdadeira revolução
nos pilares não apenas da processualística, mas sobretudo na confi-
guração do Estado de Direito. Em seu primeiro instante, esses tri-
bunais possuíam exclusivamente a função de controle de legitimidade
constitucional de normas e marcadamente se destacavam por:
a) diferençar-se dos tribunais ordinários, haja vista não julga-
rem feitos ou casos concretos, detendo-se exclusivamente
na emissão de juízo de constitucionalidade normativa;
b) não integrarem, por conseguinte, o Poder Judiciário, a pon-
to de não serem, de regra, instâncias revisoras, quando muito
se limitando a pronunciar a legitimidade ou não de norma,
suscitada pelos tribunais inferiores; e
c) possuírem suas decisões eficácia erga omnes, força que
lhes marcaria, segundo Kelsen, a natureza legislativa, confi-
gurando um verdadeiro legislador negativo.
1
1Essa é a opinião do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Carlos Velloso: “É que a
decisão proferida no controle concentrado de constitucionalidade tem a natureza de
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104 A CONSTITUIÇÃO REINVENTADA
Este primeiro desenho, como já anotamos, sofreu muitas mo-
dificações desde então, ganhando complexidade, enriquecimento
de atribuições e uma reconsideração de sua natureza jurídica, assi-
nalada assim por Montoro Puerto:
“O modelo configurado por KELSEN, o que inicialmente servirá de
base, com as matizações e retificações que iremos deduzindo, quan-
do através das concepções de CALAMANDREI e NAWIASKY,
Itália e Alemanha, respectivamente, e por imperativo de evitar as
seqüelas jurídicas de seus sistemas políticos precedentes, em parti-
cular a arbitrariedade do legislativo, voltam à velha idéia de defesa
da Constituição, de CARL SCHMITT, se bem que, em última ins-
tância, nem a Lei Fundamental de Bonn de 23 de maio de 1949, nem
a Constituição italiana de 17 de dezembro de 1947 refletem aquela
tese, o modelo kelseniano com uma aproximação mais acentuada ao
sistema norte-americano em alguns de seus aspectos, resultando,
em suma, o Tribunal Constitucional configurado como uma verda-
deira jurisdição, em detrimento daquela posição orientada para a
sua consideração como um próprio legislador, sequer negativo. Pro-
duz-se, em nosso modo de ver, um certo sincretismo estrutural e
competencial que, em definitivo, dará resultados positivos.” 2
Com todas essas variantes, os modelos de Corte Suprema e
de Corte Constitucional muito se aproximaram, permitindo um exame
conjunto de sua conformação estrutural (I) e de seus espectros de
competência (II).
SEÇÃO I
A ESTRUTURA DOS TRIBUNAIS DA
JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL
A estrutura dos tribunais, bem como o seu funcionamento po-
dem vir disciplinados diretamente pela Constituição, como podem
norma, de norma em sentido negativo, porque ela afasta da ordem jurídica a norma
incompatível com o ato normativo inicial...”: Supremo Tribunal Federal, Corte Consti-
tucional, p. 10.
2PUERTO. Jurisdicción Constitucional y Processos Constitucionales, p. 34.
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OS TRIBUNAIS DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL
ser deixados para o legislador infraconstitucional. Essa última opção
procura responder à necessidade de rápidas adaptações. A Lei Fun-
damental de Bonn, por exemplo, dispõe que uma lei federal deve
regular a organização e procedimento do Tribunal Constitucional Federal,
precisando os casos em que suas decisões terão força de lei (art. 94.2).
Esta Lei, promulgada em 1951, tem sofrido uma série de alterações
ao longo do tempo, reduzindo o número de magistrados (originaria-
mente 24, para 16), reduzindo os seus mandatos, modificando o regime
das incompatibilidades, introduzindo o voto particular, fora mudan-
ças nos procedimentos perante a Corte.
3
Não faltam, para quem não
adota esse sistema, modificações no texto constitucional, de forma a
promover mudanças na estrutura ou funcionamento dos tribunais.
Na Hungria estava previsto inicialmente o número de quinze magis-
trados; uma reforma constitucional em 1994 reduziu esse número
para onze (Lei n. LXXVII/1994 e art. 32A.4 da Constituição). Por-
tanto, o quadro que apresentaremos a seguir é dinâmico e mutável,
sem embargo, fundamental para enxergarmos, como um instantâneo
fotográfico, a estruturação dos tribunais: o número de juízes (1), o
modo de designação (2), requisitos para nomeação (3), período de
mandato (4), incompatibilidades (5) e garantias (6). Será uma amostragem
pequena, todavia reveladora.
§1.N
ÚMERO
DE
JUÍZES
A Sala Constitucional da Corte Suprema paraguaia (art. 1.º da
Lei n. 609/1995), a Suprema Corte Constitucional do Chipre
(art. 133.1.1) e a Corte Constitucional de Malta possuem três mem-
bros (art. 95.2); o Tribunal Constitucional boliviano (art. 121.2),
guatemalteco (art. 269.1), sírio (art. 139), o Conselho Constitucio-
nal senegalês (art. 89.1), a Suprema Corte uruguaia (art. 234) e a
Sala Constitucional da Corte Suprema de Justiça de El Salvador
(art. 174.2) são compostos de cinco magistrados; o Conselho Consti-
tucional da Mauritânia (art. 81.1) é composto de seis integrantes; a
Sala Constitucional da Corte Suprema de Justiça da Costa Rica
(Lei n. 7.135/1989), o Tribunal Constitucional chileno (art. 81.1),
iugoslavo (art. 125.1) e peruano são integrados por sete juízes;
4
oito, no Conselho Constitucional do Marrocos (art. 77.1); na Albânia
3HEYDE. Das Bundesverfassungsgerichtsgesetz in der Bewährung, p. 229.
4YUPANQUI. Peru, p. 310.
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