A Ação Rescisória no Processo do Trabalho e o Novo CPC

AutorFrancisco Rossal de Araújo
Páginas47-62

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Introdução

Desconstituir a coisa julgada é o objetivo da ação rescisória e, por isso, elemento central de sua definição. Tendo em vista esta característica, a ação rescisória conecta-se com o tema da segurança jurídica, pois, pendente de ação rescisória, a prestação jurisdicional ainda pode ser modificada. Por este mesmo motivo, a ação rescisória tem traços em comum com o tema dos recursos.

O objetivo deste estudo é mapear os principais temas relacionados com a ação rescisória no âmbito da jurisdição trabalhista, apresentando uma visão atualizada do tema, de acordo com as diretrizes traçadas pelo novo CPC (Lei n. 13.105/2015) e sua aplicação subsidiária/ supletiva ao Processo do Trabalho. Na primeira parte, serão estudados o conceito e as principais características deste instituto. A seguir, serão analisadas as hipóteses de rescindibilidade, tais como previstas no art. 966 do CPC. Após, será abordada a legitimidade e, em seguida, os requisitos formais, competência e procedimento.

1. Conceito e características

A ação rescisória é aquela que visa a desconstituir a coisa julgada. É uma relativização do princípio da Segurança Jurídica e, por essa razão, sua proposição somente é admitida em hipóteses excepcionais, quando existirem graves vícios na decisão impugnada.

A ação rescisória não é recurso. Para ser recurso são necessárias três características: abordagem de error in judicando e error in procedendo, ser exercido na mesma relação processual e adiar a coisa julgada. A ação rescisória é uma ação autônoma, que é exercida após a materialização da coisa julgada e em processo diferente daquele em que foi prolatada a decisão rescindenda. Pode atacar tanto um error in procedendo (infringência do Juiz encarregado de dirigir o processo de qualquer norma procedimental que ponha em risco a relação jurídico processual) quanto error in judicando (vício de fundo, de natureza substancial, que provoca a injustiça do ato processual). Não visa adiar a coisa julgada, mas desconstituí-la.

As hipóteses de rescisão da sentença de mérito, são taxativas e enunciadas no art. 966, CPC.

A ação rescisória tem dois objetivos: rescindir a coisa julgada (declaração) e promover novo julgamento. É um instrumento para a tutela do direito justo e do processo justo. Não constitui instrumento para a tutela da ordem jurídica, mesmo quando fundada em ofensa à norma jurídica. Portanto, pertence ao campo da tutela dos direitos em particular, e não ao âmbito da tutela em dimensão geral. Em outras palavras, não serve para reexaminar a prova e corrigir a justiça da decisão. É uma medida excepcional e seu fundamento é restrito às hipóteses taxativas do art. 966, do CPC.

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Nesse sentido, no Processo do Trabalho, diferencia-se do recurso de revista e, no Processo Civil, diferencia-se do recurso especial. Embora com este comungue um dos pressupostos, a violação de dispositivo literal de lei, o que faz aproximar a jurisprudência neste ponto específico. Entretanto, a ação rescisória tem como objetivo o caso concreto e o recurso de revista e o recurso especial, por seu turno, têm como objetivo a interpretação objetiva do direito e sua respectiva homo-geneização pela corte extraordinária.

Em um sistema de precedentes, como quer institui o novo CPC (arts. 926 e 927) e em harmonia com a Constituição (arts. 102, III e 105, III), podem ocorrer, em um dado momento, interpretações diversas de alguma norma constitucional ou legal. Por essa razão, não constitui motivo para ação rescisória para desconstituir coisa julgada, quando ao tempo do julgamento, havia controvérsia na jurisprudência sobre a questão enfrentada.

Um exemplo dessa perspectiva, são as Súmulas
n. 343, do STF e n. 83, do TST:

Súmula n. 343 STF – Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.

Súmula n. 83 do TST – AÇÃO RESCISÓRIA. MATÉRIA CONTROVERTIDA (incorporada a Orientação Jurisprudencial n. 77 da SBDI-2) – Res. n. 137/2005, DJ 22, 23 e 24.08.2005
I – Não procede pedido formulado na ação rescisória por violação literal de lei se a decisão rescindenda estiver baseada em texto legal infraconstitucional de inter-pretação controvertida nos Tribunais. (ex-Súmula n. 83 – alterada pela Res. n. 121/2003, DJ 21.11.2003)

II – O marco divisor quanto a ser, ou não, controvertida, nos Tribunais, a interpretação dos dispositivos legais citados na ação rescisória é a data da inclusão, na Orientação Jurisprudencial do TST, da matéria discutida. (ex-OJ n. 77 da SBDI-2 – inserida em 13.03.2002)

Também não se confunde a ação rescisória com o recurso de revista no Processo do Trabalho no que tange ao pressuposto de admissibilidade previsto nos arts. 896, a e b, da CLT, ou seja, a divergência jurisprudencial. A ação rescisória não é admitida para analisar confronto de jurisprudência entre tribunais de diferentes regiões ou entre TRTs e o TST. Nesse sentido, a Súmula
n. 413, do TST:

Súmula n. 413 do TST – AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA DE MÉRITO. VIOLAÇÃO DO Art. 896, “A”, DA CLT (nova redação em decorrência do CPC de 2015) – Res. n. 209/2016, DEJT divulgado em 01, 02 e 03.07.2016.

É incabível ação rescisória, por violação do art. 896, a, da CLT, contra decisão transitada em julgado sob a égide do CPC de 1973 que não conhece de recurso de revista, com base em divergência jurisprudencial, pois não se cuidava de sentença de mérito (art. 485 do CPC de 1973). (ex-OJ n. 47 da SBDI-2 – inserida em
20.11.2000)

A decisão deve ser de mérito. Para que seja sentença de mérito, tem de observar alguns requisitos de existência (jurisdição do juiz, petição inicial, capaci dade postulatória, e citação do réu), requisitos de validade (juiz não impedido, juiz que não seja absolutamente incompetente, petição inicial apta, citação regular do réu, inexistência de coisa julga, litispendência ou perempção) e condições da ação (legitimidade de parte e interesse de agir).

Somente pode ser objeto de rescisão, acórdão que conhece do recurso, isto é, que lhe julga o mérito, provendo ou negando provimento. A decisão que julga o mérito do recurso substitui a decisão recorrida (art. 1.008, do CPC). Nesse caso, não há substituição da sentença pelo recurso. Por essa razão, se o acórdão não for conhecido, dele não cabe ação rescisória. Caberá da sentença de mérito que permanece intacta.

Sobre decisão de mérito e pronunciamento explícito a respeito da matéria debatida na rescisória, ver Súmula n. 298, TST:

Súmula n. 298 do TST – AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO A DISPOSIÇÃO DE LEI. PRONUNCIAMENTO EXPLÍCITO (Redação alterada pelo Tribunal Pleno na sessão realizada em 6.2.2012) – Res. n. 177/2012, DEJT divulgado em 13, 14 e 15.02.2012
I – A conclusão acerca da ocorrência de violação literal a disposição de lei pressupõe pronunciamento explícito, na sentença rescindenda, sobre a matéria veiculada.

II – O pronunciamento explícito exigido em ação rescisória diz respeito à matéria e ao enfoque específico da tese debatida na ação, e não, necessariamente, ao dispositivo legal tido por violado. Basta que o conteúdo da norma reputada violada haja sido abordado na decisão rescindenda para que se considere preenchido o pressuposto.

III – Para efeito de ação rescisória, considera-se pronunciada explicitamente a matéria tratada na sentença quando, examinando remessa de ofício, o Tribunal simplesmente a confirma.

IV – A sentença meramente homologatória, que silencia sobre os motivos de convencimento do juiz, não se mostra rescindível, por ausência de pronunciamento explícito.

V – Não é absoluta a exigência de pronunciamento explícito na ação rescisória, ainda que esta tenha por

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fundamento violação de dispositivo de lei. Assim, prescindível o pronunciamento explícito quando o vício nasce no próprio julgamento, como se dá com a sentença “extra, citra e ultra petita”.

A Súmula n. 192, do TST, relaciona o exame do mérito da causa com a competência para julgamento da ação rescisória. A referência ao art. 512 do CPC/1973 (itens III e IV da Súmula), agora está no art. 921 do CPC/2015. O texto é o seguinte:

Súmula n. 192 do TST – AÇÃO RESCISÓRIA. COMPETÊNCIA (atualizada em decorrência do CPC de 2015) – Res. n. 212/2016, DEJT divulgado em 20, 21 e 22.09.2016
I – Se não houver o conhecimento de recurso de revista ou de embargos, a competência para julgar ação que vise a rescindir a decisão de mérito
é do Tribunal Regional do Trabalho, ressalvado o disposto no item II.

II – Acórdão rescindendo do Tribunal Superior do Trabalho que não conhece de recurso de embargos ou de revista, analisando arguição de violação de dispositivo de lei material ou decidindo em consonância com súmula de direito material ou com iterativa, notória e atual jurisprudência de direito material da Seção de Dissídios Individuais (Súmula n. 333), examina o mérito da causa, cabendo ação rescisória da competência do Tribunal Superior do Trabalho. (ex-Súmula n. 192 – alterada pela Res. n. 121/2003, DJ 21.11.2003)

III – Sob a égide do art. 512 do CPC de 1973, é juridicamente impossível o pedido explícito de desconstituição de sentença quando substituída por acórdão do Tribunal Regional ou superveniente sentença homologatória de acordo que puser fim ao litígio.

IV – Na vigência do CPC de 1973, é manifesta a impossibilidade jurídica do pedido de rescisão de julgado proferido em agravo de instrumento que, limitando-se a aferir o eventual desacerto do juízo negativo de admissibilidade do recurso de revista, não substitui o acórdão regional, na forma do art. 512 do CPC. (ex-OJ n. 105 da SBDI-2 – DJ 29.04.2003)

V – A decisão proferida pela SBDI, em agravo regimental, calcada na Súmula n. 333, substitui acórdão de Turma do TST...

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