Benefício Assistencial ao Portador de Deficiência (B87): Contemporâneos Aspectos Processuais nas Demandas Judiciais contra o INSS

AutorFernando Rubin
Páginas252-260

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Fernando Rubin 1

1. Introdução

Não obstante ser benefício ao cidadão que não contribua com o Instituto Nacional de Seguro Social e por isso possuir, no campo do direito material, questões menos complexas atinentes às condições para percepção da benesse, notamos uma dificuldade ímpar no campo do direito processual, já que o deficiente, para fins de gozo do B87, só poderá ter êxito no pleito judicial se demonstrada não só a incapacidade ao menos provisória para o labor, como também se demonstrada a miserabilidade, a exigir exame cuidadoso e minudente das condições específicas de vida do cidadão — o que nos faz recordar do conceito da perícia biopsicossocial.

2. Da hipótese de LOAS aos deficientes

O benefício assistencial, diversamente do benefício pre-videnciário, prescinde de contribuição ao sistema; trata-se justamente de amparo aos necessitados (idosos a partir de 65 anos — B88) e incapacitados para o trabalho (de qualquer idade) em razão de deficiência (mesmo que transitória) que impeça desenvolver atividade remunerada por pelo menos 2 anos — B87, cujo valor é sempre de um salário mínimo nacional vigente, tudo de acordo com a Lei n. 8.742/93, com as ulteriores modificações — em especial as Leis ns. 12.470/2011, 13.301/2016 e Decreto n. 8.805/2016.

Comparando a complexidade da legislação previdenciária com a assistencial, nota-se visivelmente que a regulamentação da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) é muito menos complexa e disposta em número reduzido de dispositivos. Por certo, para benefícios que exigem contraprestação, a regulamentação do custeio para ulterior possibilidade de saída em beneficio exige sistema de maior complexidade, coesão e organização, o que não se adequa as características do sistema assistencial, em que há mera regulamentação dos requisitos para concessão do benefício, sem qualquer desenvolvimento da rede específica de custeio2.

E um breve exame histórico do benefício assistencial no Brasil sempre indicou para esse sentido, com disposições de pequena envergadura, atreladas a um sistema maior, nacional de Previdência Social — antes de 1988, e tão só a partir de 1977, integrando o SINPAS (Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social), espécie de embrião do que seria o Sistema de Seguridade Social a partir da novel Lei Funda-mental3.

Por fim, diga-se ainda que é sabido que pelos esforços do Poder Executivo outros mecanismos de assistência social, na sua mais lata acepção, são oferecidos aos cidadãos mais vulneráveis, do ponto de vista econômico, os quais devem estar devidamente dispostos no Cadastro Único para programas sociais (CadÚni-

(1) Bacharel em Direito pela UFRGS, com a distinção da Láurea Acadêmica. Mestre em processo civil pela UFRGS. Doutorando pela PUC-RS. Professor da Graduação e Pós-graduação do Centro Universitário Ritter dos Reis — UNIRITTER, Laureate International Universities. Professor Colaborador da Escola Superior de Advocacia — ESA/RS. Professor Pesquisador do Centro de Estudos Trabalhistas do Rio Grande do Sul — CETRA-Imed. Professor convidado de cursos de Pós-graduação lato sensu. Parecerista, Colunista e Articulista. Advogado Sócio do Escritório de Direito Social

(2) RUBIN, Fernando. Introdução geral à previdência social. São Paulo: LTr, 2016, capítulo 2.

(3) BALERA, Wagner; MUSSI, Cristiane Miziara. Direito previdenciário. 9. ed. São Paulo: Método, 2012. p. 31-32.

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co4). Aqui se enquadrariam as bolsas-auxílio (prestações estatais mínimas), como a bolsa-família, a renda mínima e a fome zero, em rede regionalizada de controle e execução5. No entanto, a cargo do INSS, como entidade centralizadora de concessão de benefícios regulares, temos somente àquelas prestações elencadas no LOAS, marco referência absoluto nessa acepção mais restrita da Assistência Social, de que nos cabe examinar na presente obra6.

Situação mais grave de saúde pública no Brasil, a macrocefalia, que aumentou vertiginosamente no Brasil no final de 2015 e início de 2016, autoriza a concessão de LOAS à criança (B87), sendo dado tratamento preferencial para diagnóstico e concessão do benefício de prestação continuada, com a confirmação ainda da baixa renda da família7.

Pois bem. Tem-se claro que no âmbito do direito pre-videnciário, a cargo do INSS a partir de 1988, encontramos a dimensão da Previdência e da Assistência Social, sendo a primeira muito mais ampla e organizada, direcionada a todos aqueles que contribuem com o regime, ainda podendo beneficiar os seus dependentes.

Nessa quadra, nota-se que da ausência de contribuições regulares ao sistema previdenciário, advém uma série de restrições às prestações assistenciais — destinadas aos idosos e deficientes pobres no sentido legal do termo.

Em rápida comparação com alguns benefícios previden-ciários fácil perceber que os requisitos para saída em benefício assistencial são mais rigorosos — por exemplo: uma segurada pode se aposentar por idade (B41) ao complementar 60 anos de idade (na cidade) ou mesmo 55 anos de idade (no campo), mas para fins de obter o LOAS (B88) só com idade mínima de 65 anos; ou um segurado pode sair em benefício auxílio--doença a partir do 16º dia de afastamento (B31), mesmo que a incapacidade persista por mais alguns dias ou meses, mas para fins de obter o LOAS por incapacidade/deficiência (B87)

deve demonstrar que o afastamento do labor deve se operar por prazo não inferior a de dois anos.

Destaquemos, nessa parte inicial do ensaio, outras principais distinções.

O benefício assistencial é sempre de um salário mínimo (R$ 937,00 em 2017), enquanto que as prestações previdenciárias podem chegar a cifras maiores, até o teto do Regime Geral de Previdência Social — RGPS (R$ 5.579,06 em 2017), sendo pago benefício de acordo com o valor das contribuições vertidas pelo segurado (princípio da contrapartida)8. O benefício assistencial, diversamente do previdenciário, não gera 13 (abono anual) e nem pensão por morte, tendo sua natureza personalíssima muito bem identificada. Mais: o benefício assistencial deve ser revisado de dois em dois anos, a fim de ser averiguado se as condições que o mantém estão presentes, dada a precariedade da sua concessão, o que hodiernamente não se sucede com as prestações previdenciárias9.

Ainda, necessário registrarmos que a renda per capita de 1/4 salário mínimo (levando em conta as pessoas que, grosso modo, vivem sob o mesmo teto), como prevista no LOAS, embora mais abrandada pela jurisprudência no último período, traz limitações muito duras para a concessão do benefício assistencial, sendo cortada a prestação caso haja melhora das condições financeiras — o que se enquadra também nos procedimentos previstos em lei de revisões bienais10.

Não, há, por isso, maiores dúvidas de quão realmente é menos acessível a saída em benefício assistencial, daquele cidadão que não estando em dia com o Instituto Nacional de Seguro Social busca uma determinada agência da autarquia federal para obter um dos dois específicos códigos de benefício assistencial — o B87 ou o B88.

Passemos então agora a desenvolver as questões processuais mais relevantes envolvendo o B87.

(4) O Cadastro Único (Cadúnico) é um sistema que identifica e caracteriza as famílias de baixa renda, para que possam ter acesso aos programas Sociais desenvolvidos pelo executivo. O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) é responsável pela coordenadoria do Cadúnico. O sistema é de uso obrigatório nas seleções de beneficiários de programas sociais promovidos pelo Governo Federal — Informações do sítio do Governo Federal. Disponível em: . Acesso em:

27.1.2017.

(5) MARTINEZ, Wladimir Novaes. Os deficientes no direito previdenciário. São Paulo: LTr, 2009. p. 83.

(6) BARBOSA GARCIA, Gustavo Filipe. Curso de direito da seguridade social. Rio de Janeiro: Forense, 2015. p. 257 e ss.

(7) Informações do sítio O Estado de S. Paulo, matéria de Murilo Rodrigues Alves e Lígia Fomenti — . Acesso em: 12.3.2016.

(8) Conforme informações obtidas no sítio da Previdência Social: "Índice de reajuste para segurados que recebem acima do mínimo é de 6,58% em 2017," Disponível em: . Acesso em 27.1.2017.

(9) O Governo Federal em janeiro de 2017 editou nova MP, de n. 767, represtinando os termos da malfadada MP n. 739/2016, a fim de que as perícias de revisão passem a ocorrer a todo volume na via administrativa também para benefícios previdenciários — sendo que a MP é voltada para a realização de perícias em segurados que estão há mais de dois anos em gozo de benefício por incapacidade.

(10) O idoso ou o deficiente devem ter renda per capita que pode chegar até % salário mínimo, já que o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional a aplicação rígida do patamar de 1/4 previsto na legislação originária. O julgamento deu-se nos autos da Reclamação 4374. Conforme informações do próprio sítio do Pretório Excelso: "STF declara inconstitucional critério para concessão de benefício assistencial a idoso". Disponível em: . Acesso em: 7.2.2016.

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3. Questões processuais atinentes à prova pericial no B87

Como havíamos referido na parte introdutória, embora o benefício seja de tão só um salário mínimo nacional e seja disponível para quem não possui condições básicas de contribuir para a Previdência, o processo envolvendo o benefício assistencial tem as suas complexidades, já que a deficiência que gera incapacidade, momentânea ou mesmo definitiva, pode ser de difícil diagnóstico, cabendo ainda ser feito exame da condição socioeconômica do cidadão.

Em suma: o benefício pode ser singelo, mas a demanda tende a se revelar complexa.

Tal aspecto encaminha para...

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