A boa-fé objetiva: notas essenciais sobre o princípio no Código Civil de 2002

AutorLeonardo Mattietto
Páginas35-43
3
A BOA-FÉ OBJETIVA: NOTAS ESSENCIAIS SOBRE O
PRINCÍPIO NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
Leonardo Mattietto
Doutor e Mestre em Direito pela UERJ. Professor-Associado de Direito Civil na Uni-
versidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), onde coordena o Curso de
Mestrado em Direito. Professor na UCAM. Procurador do Estado do Rio de Janeiro.
E-mail: leonardo.mattietto@unirio.br.
Sumário: 1. Introdução e panorama histórico da boa-fé no direito privado brasileiro – 2. A boa-fé
e a remodelação da autonomia privada – 3. Boa-fé subjetiva e objetiva – 4. As funções da boa-fé
objetiva: interpretativa, corretiva e integrativa – 5. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO E PANORAMA HISTÓRICO DA BOA-FÉ NO DIREITO
PRIVADO BRASILEIRO
O Código Civil de 2002 trouxe a boa-fé objetiva como um de seus mais destaca-
dos princípios, como protagonista de uma nova era para o direito privado brasileiro1.
Não foi a primeira vez, certamente, que um texto legal no Brasil consagrou a
boa-fé. De modo pioneiro, o Código Comercial de 1850 havia apontado, no art. 131,
n. 1, que “a inteligência simples e adequada, que for mais conforme à boa-fé, e ao
verdadeiro espírito e natureza do contrato, deverá sempre prevalecer à rigorosa e
restrita signif‌icação das palavras”2.
Por outro lado, o Código Civil de 1916 havia sido bastante tímido3, dispondo
quanto à sua incidência para um dos contratos em espécie, o seguro, no art. 1.443:
“O segurado e o segurador são obrigados a guardar no contrato a mais estrita boa
fé e veracidade, assim a respeito do objeto, como das circunstâncias e declarações a
ele concernentes”.
1. Nas palavras de inesquecível mestre, a boa-fé objetiva e a função social do contrato “serão os dois inexpug-
náveis pilares de sustentação da teoria geral dos contratos, traduzindo necessário temperamento dos valores
clássicos da autonomia da vontade e da força obrigatória”. SOUZA, Sylvio Capanema de. In: TEIXEIRA,
Sálvio de Figueiredo (Coord.). Comentários ao Código Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2004. v. VIII, p. XII.
2. A norma do art. 131, n. 1, do Código Comercial “(...) permaneceu letra morta por falta de inspiração da
doutrina e nenhuma aplicação pelos tribunais”. AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado de. A boa-fé na relação de
consumo. Revista de Direito do Consumidor, v. 14, p. 378. São Paulo, abr./jun. 1995.
3. O acanhamento ref‌letiu a mentalidade jurídica da época de sua elaboração, no f‌inal do século XIX, até mes-
mo em contraste com o Código Comercial de 1850. AZEVEDO, Antonio Junqueira de. Rapport brésilien.
La Bonne Foi (Journées louisianaises). Travaux de l’Association Henri Capitant des amis de la culture juridique
française. Paris: Litec, 1992. p. 77.
EBOOK VINTE ANOS DO CODIGO CIVIL.indb 35EBOOK VINTE ANOS DO CODIGO CIVIL.indb 35 22/02/2022 09:59:0722/02/2022 09:59:07

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT