Capítulo 8 - Tanatologia forense e cronotanatognose

Páginas111-142
CAPíTulO 8
TANATOlOGIA FORENSE
E CRONOTANATOGNOSE
A Tanatologia Forense é o estudo da morte, do cadáver e de suas repercussões
nas esferas jurídica e social. Compreende o estudo da realidade e do tempo da morte,
ressaltando-se que morte para ns jurídicos e cientícos é a morte encefálica, cuja
comprovação com certeza e segurança é imperiosa para que ocorra eventual doação
de órgãos e tecidos para transplantes.
O diagnóstico do tempo de morte se faz pela cronotanatognose (“crono” é tempo;
“tanatos” é morte e “gnose” é conhecimento). Trata-se do estudo dos fenômenos cada-
véricos que, contudo, apresenta expressiva variação inter e intrasubjetiva. Isso porque
a morte não é um momento preciso e sim um processo, uma vez que a cessação das
funções vitais ocorre de forma gradativa. Logo, o diagnóstico do tempo de morte não
é um método absolutamente preciso e os sinais observados não se repetem, sempre, ao
mesmo tempo e da mesma forma. Por isso, falamos em faixas e períodos aproximados
em que os fenômenos cadavéricos surgem e sucedem-se.
(MÉDICO LEGISTA – PC/MA – 2012 – FGV) A necropsia pode ser realizada conforme várias técnicas. Quanto
à técnica de Ghon, assinale a armativa correta.
(A) Ela se inicia pela abertura da cavidade tóracoabdominal.
(B) O primeiro monobloco engloba todo o mediastino.
(C) O esôfago faz parte do primeiro monobloco, segundo esta técnica.
(D) O segmento terminal do duodeno, o jejuno, o íleo e o cólon são os últimos a serem exa-
minados.
(E) Os testículos fazem parte do quarto monobloco.
A, C, D e E: incorretas. Há 4 principais técnicas de necropsia: de Virchow (órgãos retirados individualmente e examinados
posteriormente), de Ghon (evisceração por meio de monoblocos de órgãos relacionados funcional ou anatomicamente);
de Letulle (conteúdo tóracoabdominal retirado em um único monobloco) e de Rokitanski (órgãos abertos e examinados
“in situ” e depois retirados isoladamente). Na técnica de Ghon, inicia-se pela análise da cavidade encefálica. Já na cavidade
tóracoabdominal, o primeiro monobloco engloba órgãos torácicos e cervicais, incluindo porção superior do esôfago. O
segundo monobloco compõe sistema digestivo superior e órgãos anexos, como fígado, baço e pâncreas. O terceiro engloba
o sistema urogenital, reto e suprarrenais. No quarto, está compreendida a maior parte dos intestinos. B: correta. O primeiro
monobloco na técnica de Ghon é formado pelo conteúdo cervical e torácico, incluindo as estruturas mediastinais. A maior
parte do esôfago está incluída no primeiro monobloco; contudo, o esôfago inferior consta do segundo.
Gabarito “B”
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MEDICINA LEGAL • Luciana de PauLa Lima GazzoLa
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(MÉDICO LEGISTA/AC – 2015 – FUNCAB) Acerca dos tipos de morte, assinale a assertiva CORRETA.
(A) A morte violenta é aquela que tem como causa determinante a ação abrupta e intensa,
física ou química, sobre o organismo, de causa interna.
(B) A morte súbita é aquela imprevista, que sobrevém instantaneamente e sem causa manifesta,
atingindo pessoas em aparente estado de boa saúde.
(C) A morte natural é a que resulta da alteração orgânica ou perturbação funcional provocada
por agentes naturais, de causa externa.
(D) A morte súbita é aquela imprevista, que sobrevém instantaneamente e sem causa manifesta,
atingindo pessoas com estado de saúde delicado.
(E) A causa médica da morte se divide em natural ou violenta.
A: incorreta. A morte violenta não ocorre por causas internas, mas sim externas, sendo que a ação pode corresponder
a diversas energias transferidas do meio para o corpo, como as de ordem mecânica, física, química, físico-química,
biodinâmica e mista. Trata-se de situação em que se deve investigar a ocorrência de uma causa jurídica para a
morte, como suicídio, homicídio/crime ou acidente. O diagnóstico da causa jurídica da morte é a principal razão da
obrigatoriedade de uma necropsia forense ou médico-legal. Contudo, cabe ressaltar que não cabe ao médico legista
estabelecer com certeza a causa jurídica de uma morte, pois isso é um critério de julgamento, sendo o laudo de
necropsia apenas um dos elementos do corpo de delito. Cabe ao médico legista ver e reportar, de maneira objetiva,
os elementos e lesões observados, de acordo com a máxima do visum et repertum; B: correta. Trata-se de conceito
aceito na doutrina para a morte súbita. Hygino de Carvalho Hércules arma que o conceito de morte súbita prende-se
mais à inexistência de uma doença prévia que possa explicá-la do que propriamente à evolução temporal rápida, uma
vez que tal critério temporal é relativo e difícil de ser estabelecido com precisão. Arma o autor que morte súbita
não é sinônimo de morte fulminante e, para ele, toda morte súbita deve ser considerada suspeita até que se prove
o contrário e deve ser esclarecida por necropsia forense (HÉRCULES, Hygino de Carvalho. Medicina Legal Texto e
Atlas. 2ª ed. São Paulo: Atheneu, 2014, p.145); C: incorreta, pois a morte natural não resulta de agentes de causa
externa, mas sim de antecedentes patológicos, doenças; D: incorreta. A morte súbita, conceitualmente, não é a que
atinge pessoas com estado de saúde debilitado ou delicado, pela já citada tese de Hygino de Carvalho Hércules, autor
cuja doutrina é muito utilizada pela banca examinadora FUNCAB; E: incorreta. O evento que causa a morte pode ser
considerado sob o ponto de vista médico (causa médica da morte: a doença ou alteração orgânica que ocasionou
a morte) ou sob o ponto de vista jurídico, correspondendo às causas jurídicas de uma morte violenta ou por causa
externa: homicídio/crime, suicídio ou acidente.
Gabarito “B”
(MÉDICO LEGISTA – PC/ES – 2019 – AOCP) A necropsia médico-legal, realizada por médico-legista, é “a
perícia das perícias”. Sobre a necropsia médico-legal, assinale a alternativa correta.
(A) Deve ser realizada em toda morte ocorrida por causa natural.
(B) O exame externo deve ser sumário e omisso.
(C) É obrigatória em morte de pessoas falecidas por morte natural sem assistência médica.
(D) Não existe justicativa para não realizar o exame interno das 3 cavidades: craniana,
torácica e abdominal.
(E) Tem como nalidade, dentre outras: identicar o cadáver, a cronotanatognose e determinar
a causa médica da morte.
A e C: incorretas. Não há obrigatoriedade de se realizar necropsia em mortes ocorridas por causa natural, por antecedentes
patológicos. Se houve assistência médica, o médico assistente atestará o óbito, sem necessidade de exame cadavérico.
Caso a morte natural tenha ocorrido sem assistência médica, o corpo será encaminhado ao Serviço de Vericação de
Óbitos (SVO) para que a morte seja atestada. Não havendo SVO na localidade, qualquer médico do serviço público de
saúde pode atestar o óbito e emitir a Declaração de Óbito. Mesmo em tais casos, não há obrigatoriedade de realização
de necropsia. B: incorreta. O exame externo em qualquer necropsia deve ser completo e detalhado, observando-se e
descrevendo-se lesões externas, vestes, sinais descritivos para identicação do cadáver, dentre outros. D: incorreta.
Embora preconize-se que o exame interno das três cavidades seja realizado, há casos em que a própria legislação o
dispensa: nos casos de morte violenta, quando não houver infração penal que apurar ou quando as lesões externas
permitirem precisar a causa da morte e não houver necessidade de exame interno para vericar alguma circunstância
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TANATOLOGIA FORENSE E CRONOTANATOGNOSE
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relevante, nos termos do parágrafo único do art. 162 do CPP. E: correta. As nalidades principais da necropsia forense
são conrmar a morte, determinar a causa medico-biológica da morte, identicar o cadáver, determinar o tempo de
morte, fornecer elementos e contribuir para a determinação judicial da causa jurídica da morte e satisfazer interesses de
ordem civil, sanitária, estatística e demográca.
Gabarito “E”
(DELEGADO DE POLÍCIA CIVIL/SP – 2018 – VUNESP) De modo geral, nos casos de morte de causa desconhecida,
o cadáver deve ser encaminhado para o IML (Instituto Médico Legal) ou para o SVO (Serviço
de Vericação de Óbitos), respectivamente, quando a morte for decorrente de:
(A) causa externa ou morte suspeita – morte natural sem assistência médica.
(B) homicídio – suicídio.
(C) acidente de trânsito – suicídio.
(D) causa natural sem assistência médica – acidente de trânsito.
(E) suicídio – morte natural ou suspeita sem assistência médica.
A: correta. O uxo de encaminhamento de cadáveres para realização de necropsia é simples e depende do tipo de morte,
em uma primeira análise. Se a morte foi decorrente de causas externas, ou seja, em razão de transferência de energia do
meio para o corpo, é tida por morte violenta. Também assim se considera quando há necessidade de se investigar eventual
causa jurídica (homicídio, suicídio ou acidente) para essa morte. Já a morte suspeita é aquela em que há possibilidade de
não ter sido natural a sua causa, sendo que os motivos da suspeição podem decorrer de circunstâncias do local, de carac-
terísticas próprias do cadáver e até mesmo de informações dadas por familiares. Em casos de mortes violentas e suspeitas,
a necropsia será obrigatoriamente realizada, devendo o corpo ser encaminhado para os serviços médico-legais (IML ou
postos médico-legais). Já o Serviço de Vericação de Óbitos (SVO) é uma instituição com atribuição de análise de mortes
naturais – por antecedentes patológicos – sem assistência médica, uma vez que, quando há assistência na morte natural,
é o médico assistente o responsável pela emissão da declaração de óbito (DO). B, C, D e E: incorretas.
Gabarito “A”
(DELEGADO DE POLÍCIA CIVIL/MG – 2018 – FUMARC) Custodiado pela Polícia, um suposto infrator queixa
que se sente mal na viatura policial ao ser transferido do local do fato para a delegacia
responsável. Ele relata ser “cardíaco” e que usa medicação para evitar infarto do miocárdio.
Em seguida, ca em silêncio e imóvel. Os responsáveis constatam a realidade do óbito. A
conduta CORRETA é:
(A) Entrar em contato com alguma autoridade do Ministério Público ou do judiciário para
tomada de decisão do caso.
(B) Por não haver violência, procurar os meios para encaminhamento ao Serviço de Vericação
de Óbito.
(C) Procurar os meios e as formalidades para o encaminhamento ao IML.
(D) Trata-se de morte natural; dar seguimento aos procedimentos para encaminhamento à
funerária.
Genival Veloso de França, doutrinador adotado pela banca examinadora FUMARC, é claro ao armar que toda morte sob
custódia de autoridades judiciárias ou policiais deve ser considerada, a priori, como morte suspeita, estando sujeita à
apreciação médico-legal (FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 11ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017,
p. 513). São exemplos: mortes de pessoas que encontram-se detidas em delegacias, penitenciárias, hospitais judiciários,
adolescentes que estão cumprindo medidas socioeducativas ou pessoas em cumprimento de medidas de segurança, bem
como durante a transferência de detidos para instituições de custódia ou hospitais. Logo, ainda que o custodiado apre-
sentasse doença prévia e zesse uso de medicamentos, a morte é considerada suspeita e o corpo deve ser encaminhado
ao IML ou serviço médico-legal. Não há como se armar que a morte ocorrera de forma natural, tampouco que não houve
violência. Ressalte-se, ainda, que a necropsia forense ou médico-legal dispensa autorização de familiares do morto, sendo
obrigatória por disposição legal.
Gabarito “C”
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