Controle de constitucionalidade enquanto decorrência da rigidez constitucional

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CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
ENQUANTO DECORRÊNCIA DA RIGIDEZ
CONSTITUCIONAL
O controle de constitucionalidade é a operação cognitiva de aferi-
ção entre a norma-objeto cuja constitucionalidade – e permanência no
sistema – se questiona e a norma-parâmetro constitucional, resultando
na possível constatação da inconstitucionalidade-vício e consequente
aplicação da inconstitucionalidade-sanção.
Desse exame, encarrega-se a Jurisdição Constitucional que tem,
por função precípua “instrumentalizar a função primordial do próprio
constitucionalismo, qual seja, coibir os excessos do Poder Público”, além
de “assegura[r] a preservação do direito, bem como possibilita[r] o con-
trole judicial amplo do Poder Executivo, em concreto a atividade da
Administração Pública.489
Não se diga, porém, que as funções atribuídas ao Órgão Judiciário
implicariam a tomada das atribuições dos demais órgãos, em especí-
co, do Legislativo. Eventual intromissão indevida de um Órgão no
outro violará a dinâmica da separação das funções do Poder, se com
isso houver a transferência do debate próprio da seara legislativa para
489 ABBOUD, Georges. P rocesso Constitucional Brasileiro. 2. ed. São Pau lo: Revista dos
Tribunais, 2018, p. 358-359.
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João Guilherme Gualberto Torres
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o Judiciário, e este, sem se abrir à participação da comunidade política
e sem cumprir o dever de fundamentação das decisões, incorrendo em
décit democrático.490
O controle de constitucionalidade reveste-se, isso sim, da roupa-
gem do novo constitucionalismo, contribuindo para o fortalecimento
do Estado Democrático Constitucional, para a limitação aos abusos
perpetrados pelos Órgãos Executivo e Legislativo, para controle dos
erros provenientes da Casa de Leis, para garantia da preservação das
minorias, bem como concretização e respeito ao catálogo de direitos
fundamentais.491
É, nesse sentido, que o Guardião da Constituição não pode se
amesquinhar no desempenho das atividades de um “legislador negati-
vo”, adquirindo a legitimidade para a tomada de decisões manipulativas
ou suprimento de omissões legislativas, em prol da defesa dos direitos
insculpidos na Carta Magna, porque igualmente se encontra subordina-
do à Constituição e deve intervir quando as instâncias prévias falharam.
A scalização judicial da constitucionalidade de normas jurídicas
inseridas no sistema pelos mais diversos veículos introdutores, consti-
tui, leciona Canotilho, “um dos mais relevantes instrumentos de con-
trolo do cumprimento e observância das normas constitucionais”. Além
disso, constitui verdadeira garantia da observância da Constituição,
490 SAMPAIO, José Adércio Leite. Discurs o de Legitimidade da Jur isdição Constituciona l e as
Mudanças Lega is do Regime de Const itucionalidade no Bra sil. In: SAR MENTO, Daniel
(org ). O controle de const itucionalidade e a Lei 9.868/99. Rio de Ja neiro: Lumen Juris, 2001,
p. 165-218, p. 167-173.
491 ABBOUD, George s. Processo Constitucional Brasileiro. 2. ed . São Paulo: Revist a dos
Tribunais, 2016, p. 358-372 passim. Cf. ARAGÃO, Alexa ndre Santos de. O Controle da
Constitucional idade pelo Supremo Tribunal Federal à Lu z da Teoria dos Poderes Neutrais.
In: SARME NTO, Daniel (org). O controle de cons titucionalidad e e a Lei 9.868/99. Rio de
Janeiro: Lumen Juris , 2001, p. 21-37; SAMPAIO, José Adércio Leite. Discur so de Legit imidade
da Jurisdição C onstitucional e as Mudanças Le gais do Regime de Constituciona lidade no
Brasil. In: SAR MENTO, Daniel (org). O controle de constitucio nalidade e a Lei 9.868/99.
Rio de Janeiro: Lumen Jur is, 2001, p. 165-218.
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CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE ENQUANTO
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porquanto assegura “a dinamização da força normativa” e reage “através
de sanções contra sua violação”.492
A Constituição não se operacionaliza por si mesma, dependendo
da atuação de órgãos para efetivação da sua força normativa, sob pena
de redundar num vazio. Signica dizer que não se satisfaz o constitu-
cionalismo forjado na tradição democrática, sobretudo no momento
pós-Segunda Guerra se, de um lado, não se exige a atuação do Órgão
Legislativo e do Órgão Executivo no implemento de políticas públi-
cas e na realização das promessas constitucionais, e, de outro, o Órgão
Judiciário não intervém para controlar o produto legislado quando vio-
lador de direitos e garantias fundamentais ou scalizador do implemen-
to de políticas públicas e efetivação dos direitos sociais.493
Com efeito, é a institucionalização de um controle de constitucio-
nalidade que viabiliza a consolidação do modelo do Estado Democrático
Constitucional, pelo que a Jurisdição Constitucional contará com meca-
nismo suciente para desempenho da função de guardiã da Constituição
e zelo pela supremacia desta.
A existência de uma Corte Constitucional, cuja função precípua
é regular o funcionamento das demais funções do Poder e controlar a
lei em consentaneidade com a Constituição, agura-se essencial para a
garantia da supremacia constitucional, contra possíveis violações prati-
cadas por maiorias, sem o que, ademais, restaria recorrer a um direito à
força ou à revolução.494
492 CANOTILHO, J. J. Gomes. Dire ito constitucional e teoria da con stituição. 7. ed. Coimbra:
Editora Almed ina, 2003, p. 889.
493 STRECK, Len io Luiz. Jurisdição constitucional e decisão jurídica . 4. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2014, p. 275-277, 412-413.
494 “Inne c’è um terz o carattere; e que sto ilpiù improtante di tut tti, perchè gara ntisce la
supremazia della leg ge o meglio della Cos tituzione. Se tr atta del potere giudi ziario [...],
insomma di una C orte giudizia ria, che regola il ret to funziona mento dei diversi organi
dello Stato e che controlla e s indaca la giust izia della legge, e c ioè la sua conformità a lle
norma fondamentali . L’esistenza di que sto organo à essenzia le, perchè altrimenti, contro
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