Das limitações constitucionais ao poder de tributar

AutorDiego Bomfim
Ocupação do AutorDoutor em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universidade de São Paulo/USP
Páginas117-206
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TERCEIRA PARTE – LIMITES
CONSTITUCIONAIS À EXTRAFISCALIDADE
CAPÍTULO V – DAS LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS
AO PODER DE TRIBUTAR
5.1. Submissão das normas tributárias extrafiscais às
limitações constitucionais ao poder de tributar
Não há dúvidas sobre o importante papel que a tributação
exerceu e exerce na vida em sociedade. A tributação pode ser
encarada como um dos instrumentos mais destacados de de-
monstração do poder estatal, havendo preocupação constante
com os seus limites; com a conformação de suas limitações208.
No Brasil, estas limitações foram alçadas ao plano cons-
titucional, razão pela qual este deve ser o ponto de partida do
intérprete. Como lembra GERALDO ATALIBA209, “o direito
208. A doutrina brasileira é tradicionalmente voltada para a apresentação destes li-
mites, merecendo destaque a obra seminal de Aliomar Baleeiro. Cf. BALEEIRO,
Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 2ª ed., Rio de Janeiro: 1960,
passim.
209. ATALIBA, Geraldo. Apontamentos de ciência das finanças, direito financeiro e
tributário. São Paulo: RT, 1969, p. 103.
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EXTRAFISCALIDADE
constitucional cuida precipuamente de limitar o poder tributá-
rio e condicionar seu exercício”.
O objetivo deste capítulo é justamente investigar de que
forma as chamadas limitações constitucionais ao poder de
tributar210 atuam diante do emprego de normas tributárias
extrafiscais.
É que, mesmo diante da existência de fundamentos váli-
dos ao emprego da extrafiscalidade no ordenamento jurídico
pátrio, ainda assim, as limitações constitucionais ao poder de
tributar devem atuar, dando feição à competência tributária
dos entes subnacionais. Aqui, mais importante do que as fi-
nalidades a serem alcançadas pela tributação será verificar
em que extensão os meios escolhidos, no caso as normas tri-
butárias extrafiscais, possuem fundamento de validade cons-
titucional para funcionar como instrumentos de consecução
daquelas mesmas finalidades.
As normas tributárias extrafiscais, pelo fato de direta ou
indiretamente atuarem em torno de uma relação jurídica tri-
butária, devem se submeter ao regime jurídico tributário, sob
pena de a extrafiscalidade servir de argumento de sustenta-
ção para rupturas graves com os direitos e garantias funda-
mentais dos contribuintes.
Estas normas, por estarem voltadas à intervenção (por
indução) do Estado sobre o domínio econômico, não deixam
de ser tributárias para ser econômicas (no sentido de se sujei-
tarem apenas aos ditames do direito econômico), como aliás
210. A utilização da expressão limitações constitucionais do poder de tributar pela
Constituição Federal, além de salutar do ponto de vista didático, tem o condão de
fixar a ideia de que os entes políticos possuem um rígido e limitado caminho a ser
percorrido quando da instituição, exoneração ou administração de tributos. Não se
trata, portanto, de se perquirir a respeito de uma definição de poder tributário –
que imporia uma ruptura metódica das premissas eleitas neste trabalho – e sim de,
aceitando a existência pré-jurídica de um poder tributário ilimitado detido pela As-
sembleia Nacional Constituinte, apreender a noção, recortada, de competência tri-
butária, via limitação do poder tributário.
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parte da doutrina já defendeu211. Sujeitam-se sim aos limites
impostos pelo direito econômico, inclusive no que se refere à
necessidade de existência de competência para regular este
tipo de matéria (a chamada competência reguladora), mas
não deixam de, conformadas como normas tributárias, estar
submetidas a todas as importantes e extensas limitações ao
poder de tributar.
Em verdade, ainda que não se possa falar em uma seg-
mentação rígida dos ramos do direito, quando se reconhece a
necessidade de interpretação do ordenamento como um cor-
po único, não se pode esquecer que o próprio direito positivo
exige que, em certa medida, esta segmentação seja empreen-
dida. Prova disso é que a Constituição Federal distribui a
competência legislativa entre União, Estados, Distrito Federal
e Municípios, por meio da indicação de ramos do direito212.
Por isso se reconhece que há competência concorrente entre
os entes subnacionais para legislar sobre “direito tributário”,
enquanto há competência privativa da União para legislar so-
bre “direito econômico”. O intérprete, portanto, ainda que a
tarefa em algumas situações não seja fácil, precisa encontrar
elementos seguros de identificação e associação das normas
jurídicas aos ramos a que estas pertencem, de modo a subme-
tê-las ao regime próprio prescrito pelo direito positivo. A par-
tir daí, aquela norma passa a ser reconhecida como integrante
de um conjunto de normas que estão direta ou indiretamente
associadas a um núcleo aglutinante que, no caso do direito tri-
butário, é efetivamente o tributo213, tomado como relação obri-
gacional que liga o contribuinte ao Estado214. Havendo essa
associação, a norma passa a ser tratada como norma tributá-
ria, devendo sujeitar-se às regras e princípios informadores
daquele ramo do direito.
211. NABAIS, José Casalta. O dever fundamental de pagar impostos, cit., p. 658.
212. Nesse sentido, cf. os arts. 22, 24 e 30 da CF.
213. ATALIBA, Geraldo. Hipótese de incidência tributária, cit., p. 37-40.
214. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário, cit., p. 348-349.
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