Direito coletivo e sindicato

AutorMauricio Godinho Delgado
Páginas1619-1669
CAPÍTULO XXXV
DIREITO COLETIVO E SINDICATO
I. INTRODUÇÃO
Direito Coletivo do Trabalho é o conjunto de regras, princípios e institutos
regulatórios das relações entre os seres coletivos trabalhistas: de um lado,
os obreiros, representados pelas entidades sindicais, e, de outro, os seres
coletivos empresariais, atuando quer isoladamente, quer através de seus
sindicatos.
Os sujeitos do Direito Coletivo são, portanto, essencialmente os sindicatos,
embora também os empregadores possam ocupar essa posição, mesmo que
agindo de modo isolado. Tal diferenciação ocorre porque os trabalhadores
somente ganham corpo, estrutura e potência de ser coletivo por intermédio de
suas organizações associativas de caráter pro ssional, no caso, os sindicatos.
Em contraponto a isso, os empregadores, regra geral, já se de nem como
empresários, organizadores dos meios, instrumentos e métodos de produção,
circulação e distribuição de bens e serviços; logo, são seres com aptidão natural
de produzir atos coletivos em sua dinâmica regular de existência no mercado
econômico e laborativo.
Por isso é que, quando se estudam os sujeitos do Direito Coletivo do
Trabalho, concentra-se a análise nas entidades sindicais, as únicas que se
distinguem dos sujeitos do Direito Individual do Trabalho, agindo em nome e
em favor dos empregados. Já os empregadores podem agir no Direito Coletivo,
quer isoladamente, quer mediante a representação de suas entidades sindicais.
É claro que existem ordens jurídicas que não circunscrevem todos os
atos próprios à seara juscoletiva apenas à participação dos sindicatos obrei-
ros, permitindo, assim, que surjam outros sujeitos juscoletivos distintos dessas
entidades e da gura do empregador. São comissões de empresas, delegados
representativos do pessoal de certo estabelecimento ou empresa, a par de
fórmulas organizativas congêneres. É o que se passa, por exemplo, na Grã-
-Bretanha (delegados de empresas — shop stewards), na Itália (comissões
de empresas) e outras experiências de países capitalistas desenvolvidos(1).
Trata-se de entes coletivos trabalhistas, não necessariamente restritos aos sin-
dicatos (embora a prática histórica de tais países demonstre que os próprios
(1) Descrição de experimentos correlatos de representação não sindical em distintos países
está muito bem traçada por Amauri Mascaro Nascimento. Compêndio de Direito Sindical, cit.,
p. 242-245.
1620 M樋弼膝眉備眉疋 G疋尾眉匹琵疋 D微柊毘樋尾疋
sindicatos, reconhecendo a força de tais fórmulas representativas, busquem par-
ticipar de sua composição, mediante a apresentação de candidaturas próprias).
No Brasil, porém, a atuação obreira nas questões juscoletivas está fun-
damentalmente restrita às entidades sindicais. É claro que podem existir, na
prática, entidades organizativas não sindicais em lugares e segmentos não
abrangidos por sindicatos; porém, no País, esses entes estão destituídos dos
poderes jurídicos que o Direito confere aos sindicatos. A própria Constituição de
1988 cuidou, por precaução, de restringir à participação dos sindicatos obrei-
ros os atos inerentes à principal dinâmica juscoletiva, a negociação coletiva.
Efetivamente, dispõe a CF/88 ser obrigatória a participação dos sindicatos nas
negociações coletivas de trabalho (art. 8º, VI, CF/88).
Note-se, a propósito, que a recente Lei da Reforma Trabalhista institucio-
nalizou as comissões de representação dos empregados em empresas com
mais de 200 empregados (novo Título IV-A da CLT, composto pelos novos
arts. 510-A até 510-D), mediante inserção feita pela Lei n. 13.467, vigorante
desde 11.11.2017. Contudo, tal comissão obreira interna não ostenta os pode-
res de negociação coletiva trabalhista, que são peculiares aos sindicatos (art. 8º,
III e VI, CF/88; novo art. 510-E, CLT).(2)
II. DEFINIÇÃO
Sindicatos são entidades associativas permanentes, que representam
trabalhadores vinculados por laços pro ssionais e laborativos comuns,
visando tratar de problemas coletivos das respectivas bases representadas,
defendendo seus interesses trabalhistas e conexos, com o objetivo de lhes
alcançar melhores condições de labor e vida.
A de nição constrói-se tendo em vista os sindicatos obreiros, cuja pre-
sença confere a marca distintiva do Direito Coletivo, em sua dinâmica atual e
em sua própria evolução histórica ao longo do capitalismo.
Entretanto, à medida que existem também, é claro, sindicatos empre-
sariais, pode-se construir de nição mais larga, que abranja os dois polos
trabalhistas, de obreiros e de empregadores.
Nessa linha mais ampla, envolvendo empregadores, empregados e outros
obreiros que se vinculam sindicalmente (como pro ssionais liberais e traba-
lhadores avulsos), sindicatos seriam entidades associativas permanentes,
que representam, respectivamente, trabalhadores, “lato sensu”, e emprega-
dores, visando a defesa de seus correspondentes interesses coletivos.
(2) No item IX deste Capítulo XXXV se examina o novo instituto da comissão de representa-
ção de empregados inserida no Título IV-A da CLT.
1621C弼膝菱疋 尾微 D眉膝微眉肘疋 尾疋 T膝樋簸樋柊琵疋
É evidente, porém, que a de nição de qualquer gura regulada pelo
Direito passa, sem dúvida, pelas particularidades normativas de cada
experiência histórica e cada sociedade. Assim, no Brasil, a de nição de
sindicato envolve, também, a incorporação da ideia de categoria, inerente ao
sistema jurídico vigorante no País desde a década de 1930.
Nesse quadro, a partir da concepção de associação sindical prevista na
CLT, que leva em conta a noção de categoria pro ssional, diferenciada e de
trabalhadores autônomos, além da categoria dos empregadores, chamada
econômica (art. 511 e seguintes), pode-se inferir uma de nição legal desse
sujeito do Direito Coletivo Trabalhista. Assim, a lei brasileira de ne sindicato
como associação para ns de estudo, defesa e coordenação de interesses
econômicos ou pro ssionais de todos os que, como empregadores, emprega-
dos, agentes ou trabalhadores autônomos, ou pro ssionais liberais, exerçam,
respectivamente, a mesma atividade ou pro ssão ou atividades ou pro s-
sões similares ou conexas (art. 511, caput, CLT).
III. SISTEMAS SINDICAIS
A evolução do sindicalismo no mundo ocidental permite apreender a
presença de certos padrões de organização dos distintos sistemas sindicais.
Tais padrões levam em consideração, mais uma vez, os sindicatos de
trabalhadores, exatamente porque neste polo é que se encontra o cerne de
todo o desenvolvimento do Direito Coletivo do Trabalho.
É que, na verdade, os empregadores, enquanto empresários, orga-
nizam-se de inúmeras e diversi cadas maneiras, de modo a alcançar a
multiplicação de seu poder no âmbito do conjunto da sociedade e do Estado.
Eles organizam-se, em primeiro lugar, individualmente, na qualidade de
agentes estruturadores e administradores do processo produtivo em seus
estabelecimentos e empresas (por isso é que são, naturalmente, seres cole-
tivos trabalhistas). Eles agregam-se, em seguida, a distintas e concomitantes
associações empresariais (de caráter permanente ou meramente circunstan-
cial), segundo pontos de contato considerados relevantes para a defesa de
seus interesses. Eles podem se agregar, por m, em conformidade com o
modelo sindical seguido na respectiva ordem jurídica, em sindicatos empresa-
riais, voltados às relações com seus respectivos trabalhadores e os demais
da correspondente categoria econômica.
O estudo dos padrões de organização sindical obreira deve ser dividido
em dois tópicos, correspondentes a duas perspectivas diferenciadas de se
examinar o problema.
De um lado, situam-se as fórmulas de estruturação dos sindicatos de
trabalhadores, isto é, os critérios de agregação de obreiros em determinado
sindicato. Nesta perspectiva, podem ser encontrados, essencialmente, sindicatos

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